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quinta-feira, 4 de maio de 2017

Dia das Mães - Igualdade começa em casa



Como mães - e alguns pais - estão transformando suas casas em um espaço de diálogo e exemplo sobre equidade de gênero


A empresária Viviane Duarte, fundadora do Plano Feminino, foi criada por duas mulheres fortes, sua mãe e avó, que sempre perguntavam para ela “qual é o seu plano?”. Foi assim que ela aprendeu desde cedo que toda mulher deve se tornar protagonista de sua própria história. Casada há 22 anos e mãe de um rapaz de 17 anos, Viviane lembra que, desde sempre, as tarefas na sua casa eram compartilhadas. “Meu filho aprendeu desde cedo que não existe coisas de menino e menina. Todos têm direitos iguais e ninguém era responsável por lavar suas cuecas”, lembra. Hoje, vê seu filho aplicando o que aprendeu com a namorada e entre os amigos e tem convicção que a melhor forma de ensinar é pelo exemplo.

Famílias como as de Viviane estão se tornando cada vez mais comuns no Brasil, mas ainda não são maioria. Segundo um levantamento feito pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) apenas 36,4% das mulheres casadas ou em união estável afirmam que dividem igualmente com o parceiro os cuidados com a casa e com os filhos.

E a causa disso é o machismo estrutural da sociedade brasileira. Segundo uma pesquisa feita pela ONU Mulheres, 81% dos homens e 95% afirmam que o Brasil é um país machista. “Por isso é tão importante começarmos a falar de equidade de gênero em nossas casas. E mais do que falar, dar o exemplo. Como posso falar de feminismo com meu filho se sou eu que vou para a cozinha no domingo enquanto meu marido assiste televisão?”, questiona Viviane. Ela mesma largou uma carreira bem-sucedida no mercado de comunicação para transformar o empoderamento feminino em um legado, e por isso criou o Plano Feminino: uma consultoria especializada em conteúdo e estratégias para grandes marcas terem conversas verdadeiras as mulheres. Hoje Viviane se tornou uma das principais vozes sobre o empoderamento feminino na publicidade e dá todo o crédito às mulheres fortes que foram as referências em sua vida: “se não fossem os exemplos da minha mãe e vó, eu não teria entendido como nós mulheres podemos ser donas de nossos destinos”.

Alexandra Loras é outro exemplo de mulher e mãe que está transformando a discussão sobre a igualdade de gênero e raça. Ela é ex-consulesa da França em São Paulo. Deixou sua carreira de apresentadora de TV na França para acompanhar o marido em suas missões diplomáticas pelo mundo. Com mãe francesa e pai gambiano, Alexandra é a única negra em sua família. Sentiu desde cedo o preconceito racial, mas afirma que foi no Brasil onde mais sofreu discriminação dos 52 países onde esteve. “Mas apesar do preconceito, no Brasil tive inúmeras oportunidades para discutir publicamente o machismo e o racismo, e isso transformou a minha vida”. Alexandra, que é mestre pela Science Po. de Paris e pesquisou a invisibilidade do negro na TV francesa, hoje é uma requisitada palestrante e professora sobre diversidade no Brasil e no mundo.

Os compromissos profissionais no Brasil se tornaram tão desafiadores que, ao final do período no posto consular em São Paulo, Alexandra e seu marido, Damien, decidiram ficar no país em um novo arranjo familiar: ela, que era responsável pela casa e cuidados com o filho do casal passaria a ser a principal provedora da casa. Damien continuaria a trabalhar como consultor, mas de forma parcial, para ser o principal responsável pelos cuidados com o filho. “Tenho muita sorte de ter um marido pró-feminista, que me apoia. O Brasil me deu um palco maravilhoso para falar de questões raciais e de gênero e quero aproveitar esta oportunidade”. Alexandra está bastante animada com esta nova etapa, ela acredita que isso criará boas referências para seu filho: “Por estudar em uma escola da elite, já vejo alguns preconceitos em meu filho. A cultura é um programador mental poderoso, por isso estou feliz em oferecer ao Rafael uma ambiente familiar igualitário e diverso, para que ele seja um homem pró-feminista nessa geração flux”.

Se a família francesa de Alexandra está fazendo diferença no Brasil, uma família brasileira radicada em Paris tem sido o tema de reflexões sobre igualdade de gênero no YouTube. O escritor e palestrante Claudio Henrique dos Santos conta em seu canal Macho do Século 21 sobre como a experiência de ter sido dono de casa mudou sua visão do mundo feminino e o fez se aprofundar nas questões sobre paternidade e equidade de gênero. Ele já falou em empresas como Johnson&Johnson, Pfizer, Coca-Cola, entre outras. Além de manter um canal no YouTube, Claudio já lançou dois livros: Macho do Século 21 e Mulheres Modernas, Dilemas Modernos, este último em parceria da jornalista Joyce Moysés.

Hoje Claudio conta sobre sua experiência com muito bom-humor, mas quem assiste seus vídeos nem imagina como foi doloroso, no começo, abrir mão de sua recém-aberta loja de vinhos para acompanhar sua mulher, Daniele, para Singapura. Claudio foi executivo durante anos no setor automobilístico, e estava realizando o sonho de empreender, quando recebeu a notícia da promoção da esposa.

A princípio ele imaginou que poderia trabalhar no país. “Descobri apenas chegando lá que não poderia trabalhar e, por isso, passei a ficar responsável por cuidar da minha filha. Esta experiência foi muito enriquecedora e fez com que eu lidasse com os preconceitos da sociedade machista na qual fui criado”, afirma. Depois, quando a família se mudou para os Estados Unidos, passou também a ficar totalmente responsável pelos cuidados com a casa. Atualmente morando na França com a família e com a filha já crescida, Claudio se divide em viagens ao Brasil para fazer palestras e coloca em prática planos para iniciar um projeto social para educação e empoderamento de meninas. Para ele, essa é a forma que encontrou para colaborar na construção de um futuro mais igualitário para Luiza, em que as mulheres deixem de ganhar salários inferiores e participem dos mesmos cargos de liderança que os homens.




Por mais democracia e transparência na Lei Rouanet



Diante de reiteradas denúncias e investigações por suspeitas de fraudes, o Ministério da Cultura (Minc), editou a Instrução Normativa 1/2017, instituindo uma série de mudanças na Lei Rouanet (Lei 8.313/91).  De acordo com o ministro da Cultura, Roberto Freire, o objetivo da atualização da norma é o de democratiza-la, possibilitando, assim, o acesso de todos os projetos, já que, até então, alguns acabavam sendo preteridos diante daqueles com maior influência, seja política ou midiática.

Outro ponto muito importante trazido pela IN 1/2017, do Minc, foi o ajuste de dados técnicos preestabelecidos, assim os critérios para aprovação dos projetos são previamente conhecidos e proporciona mais isonomia aos processos. Isso porque, se avaliarmos alguns projetos aprovados entre 2011 e 2013 que receberam recursos da Lei Rouanet – como, o blog “O Mundo Precisa de Poesia”, da Maria Bethânia, que recebeu um aporte de R$ 1.356.858,00; e o “Painel Artístico”, do Clube A de São Paulo, com o valor aprovado de R$ 5.700.000,00 -, é facilmente perceptível algumas distorções.

Quando o Minc declara que as alterações visam democratizar a Lei Rouanet, passa, também pelo fato de os incentivos ficarem muito concentrados no eixo Sul-Sudeste, sendo que os dados mostram que os valores chegavam até a 80% dos recursos nestas regiões. Essa alteração faz com que as regiões Norte e Nordeste tenham um teto maior.

Além disso, o próprio ministro da Cultura destacou que o Ministério da Cultura tem aproximadamente 18 mil processos de prestação de contas que não foram analisados. Com isso, a IN 1/2017 passou a estabelecer que as prestações de contas sejam feitas em tempo real, o que ajuda a prevenir fraudes e estancar o passivo criado ao longo desse tempo sem a devida prestação. A expectativa é a de que daqui para frente seja dada a importância que a Lei Rouanet possui, sem que haja risco de continuidade ou que seja vista como suspeita por provocar muitas distorções, tendo em vista que a norma está em vigência desde 1991, quando instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac) estabelecendo normas para o governo federal disponibilizar recursos para o fomento da cultura no Brasil.




Marcelo Rocha é advogado, fundador do Rocha, Calderon e Advogados Associados


 

Preconceito: a era do combate à intolerância



 Antigamente pouco se questionava sobre as consequências de determinadas ações intituladas de “brincadeiras” que tinham como característica alguma demonstração de preconceito, ofensa ou degradação envolvendo alguém ou algum grupo. Termos como o Bullying não estavam na pauta diária e os limites para o que era considerado humor estavam fracamente conceituados. Simplesmente não se pensava nas consequências de tratar certos assuntos e grupos sociais como inferiores através de uma “piada”. Não se enxergava a opressão que roubava a dignidade. A postura moral era ignorada, alimentando, até inconscientemente, comportamentos nocivos.

Felizmente, vivemos em tempos onde o olhar em cima dessas situações se tornou crítico, mais esclarecido e mais atento aos erros passados. Muitos ainda dizem “o mundo está ficando sem graça” ou “tudo é polêmica”, mas a questão é que em diversos níveis é preciso que haja reflexão real, e a maioria das pessoas já começa a se dar conta disso trazendo à pauta pontos que antes eram considerados “inofensivos”, mas que perpetuavam estereótipos, preconceitos e até mesmo crimes.

Com os tempos mudando, fazer uma piada com o antissemitismo, ou atrelada ao Nazismo em algum nível, pode parecer algo impensável, já que em relação a esse assunto há quase uma unanimidade quanto a absurdo que isso seria. No entanto, no começo de 2017, Feliz Kjellberg, o Pewdiepie, que é o Youtuber mais popular do mundo, com 50 milhões de inscritos em seu canal, mostrou em um de seus vídeos, dois indianos segurando um cartaz onde estava escrito “Morte à todos os judeus” e tratou a situação como uma piada. Como consequência, ele perdeu seu patrocínio com a Disney e com o Youtube, além é claro de milhares de inscritos.

Mas como se chegou ao absurdo de até mesmo isso ser considerado “piada” pelo Youtuber? Simples. A falta de ética na cultura vem tratando como inofensivas diversas posturas onde a dignidade é deixada de lado. É apenas uma questão de encadeamento do pensamento. Acostumados a abandonar a dignidade de um grupo para manter uma “piada”, aos poucos se chega a fazer o mais absurdo e transformar o ódio aos judeus em algo aceitável novamente. Não estou dizendo que por causa disso vai acontecer um novo Holocausto. Apenas que o reforço em uma cultura de preconceito, evoluí, se aprofunda, e por fim faz vítimas. E é isso que já não é mais permitido hoje em dia. Não vivemos mais em uma época onde oprimir um grupo é algo que pode ser considerado “engraçado”. No pseudo humor do Youtuber, aquilo era algo divertido. No mundo real, foi preconceito e apologia a uma das maiores atrocidades já realizadas pela humanidade.

O debate correu solto pelas redes sociais e mídias, já que vivemos tempos de discussões sobre limites entre crítica, humor e perpetração de preconceito ou práticas nocivas. Hoje, já não é aceitável fazer “piadas” com negros, homossexuais, mulheres, por exemplo. A sociedade chegou a um ponto de consciência moral que entende como isso é prejudicial, como é ofensivo e venenoso, não só aos grupos alvo, mas a todos como seres humanos. Não se pode permitir que atitudes como essa fiquem impunes, porque o pensamento da sociedade está mudando, se alinhando à moral positiva.

O espaço para esse tipo de atitude já não existe e, cada vez mais, o debate saudável encontra limites construtivos para perpetuar a dignidade humana e o respeito. Como consequência, até as empresas estão mais cautelosas com relação a quem associam seu nome, fazendo com que não importasse para a Disney os milhões de inscritos do Pewdiepie e sim a imagem que ela estaria passando a seus consumidores se apoiasse essa postura. A ética ganha novo lugar nas relações empresariais porque ela já vem ganhando lugar de destaque nas relações sociais, culturais e, por fim, humanas.

Na história da humanidade sempre houve o opressor e o oprimido. O universo animal sempre se apoiou na lei do mais forte, porém, para os seres humanos isso não é válido, pois não somos apenas dotados de dignidade, mas reclamantes da mesma e seres de raciocínio. A lei busca nos proteger, mas é na moral que somos defendidos dos erros passados e presentes que estão enraizados como cultura. O esclarecimento se conquista aos poucos e é podando atitudes como essa que se evita novos “Holocaustos”. A maioria das pessoas não sabe, mas a Eugenia, que inspirou as atitudes de Hitler, tem seu pai em Francis Galton, um inglês, e sua prática como um ato de “limpeza genética”, com direito a castração química, começou nos Estados Unidos pré Segunda Guerra.

O que se tornou um massacre partiu de ideias praticadas por grupos que mais tarde foram aclamados como heróis. Isso levanta a questão sobre onde começam ações hediondas e o cuidado que se deve ter na hora de manter e conquistar respeito e dignidade para o ser humano. Atitudes de violência à dignidade devem ser combatidas com esclarecimento, com ética, com mudança moral. A postura da Disney é louvável no sentido de transformar em empresarial as consequências da irresponsabilidade moral. Grandes ações de crueldade são evitadas com posturas tolerantes diárias.

Curiosamente, foi no pós Segunda Guerra, com o Código de Nurembergue, que o mundo começou a mudar. A passagem da era do consumo para a da informação, nos anos 1990, também foi um forte fator. Com isso passou-se a refletir em cima do poder que a impunidade dava aos intolerantes e isso nos levou a uma evolução histórica que está culminando nessa primeira metade do século XXI.

Quando a mudança é legal, apenas, isso não se reflete no comportamento real da sociedade, mas quando o esclarecimento é moral e, por sua vez, gera ações éticas, se repensa o que aconteceu. As ideias de eugenia foram quase extintas. O acesso a informação gerou conhecimento e debate. Tudo como reflexo da compreensão de onde aquela postura levou a humanidade. Graças ao acesso à informação, trazido pela internet, o oprimido ganhou voz, se tornou protagonista e inclusive pode dizer ao opressor que atitudes pequenas como uma “piada” reforçavam culturas de perda de dignidade.

Hoje, se entende a necessidade de considerar o ser humano como fim último do esclarecimento como ferramenta de crescimento. O século XXI é detentor de uma sociedade intolerante à intolerância e esse é um dos primeiros passos para criar gerações mais conscientes, mais cheias de ética nas posturas. Está na informação da ética, a raiz motora de todo movimento igualitário e discussão que leva nossa sociedade a uma era de dignidade.






Samuel Sabino - fundador da Éticas Consultoria, Filósofo, Mestre em Bioética, e professor universitário.




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