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quinta-feira, 4 de maio de 2017

A CRISE ECONÔMICA E A REFORMA TRABALHISTA



 A nossa legislação trabalhista teria se desmoronado? Pelos comentários dos que apelam para a reforma trabalhista, o que até hoje se praticou, não serve mais para dar suporte legal às novas relações de trabalho. Para aqueles que não desejam a mudança invocam a preocupação de desproteção da classe trabalhadora. Mas, qual seria, de fato, a ameaça aos direitos trabalhistas fundamentais? A legislação atual de fato protege a classe trabalhadora?

A realidade nos mostra dois aspectos relevantes e que merecem reflexões: de um lado da crise, o descumprimento das leis trabalhistas parece ser uma questão de sobrevivência de algumas empresas que, para competir no mercado, se socorrem de modalidades alternativas de relação de trabalho ou, mesmo, se esquivam de obrigações trabalhistas gerando relações informais e inseguras que se transformaram em terreno fértil para a burla e o consequente crescimento de ações judiciais. De outro lado, há situações de fato ainda não tratadas pela lei e que a prática leva a interpretações que desconhecem a transformação do conteúdo das novas tecnologias e os impactos que geram nas relações de trabalho, causando enorme insegurança jurídica que avoluma o número de processos na Justiça do Trabalho. O Judiciário Trabalhista passou a ser refém do desajuste econômico e sente o reflexo de uma legislação que já não atende aos seus próprios objetivos constitucionais de melhoria da condição social. As soluções judiciais de conflitos estão longe de suas causas.

Os sindicatos profissionais, tidos como representantes dos trabalhadores, têm sido considerados que, em sua maioria, cumprem,há algum tempo, papel de coadjuvante do Estado na defesa de interesses de poucos e não se apresentam identificados com os representados. São frequentes os desentendimentos entre trabalhadores e a cúpula sindical, exigindo retomada de negociações de interesse do grupo.

A crise econômica e a reforma trabalhista proposta repetem a história do direito do trabalho e sua evolução. Algumas constatações dispensam comentários e outras se repetem ao longo da história e dão causa a alguma forma de evolução da sociedade. Dispensam palavras, por exemplo, as repetições rotineiras de que o País está mergulhado numa crise econômica cuja superação ainda é um mistério e que a reforma poderia fragilizar ainda mais os sindicatos porquanto sugere a eliminação compulsória da contribuição sindical. Da mesma forma, pelo aspecto positivo, a negociação coletiva adquire status de norma válida.

No campo dos direitos sociais, em especial direito do trabalho e previdência social, a peculiaridade foi, ao longo da história, de legislar ou criar programas de defesa durante a crise, de tal forma que as dificuldades fossem ultrapassadas e que encontrasse um ponto de partida em boas condições para a construção de um futuro com bases sólidas e justas. Em épocas de bonança os aspectos sociais não encontram guarida em reformas ou melhorias.

Assim foi com a legislação trabalhista do período da revolução industrial na sua origem de caráter protecionista com fixação de garantias mínimas aos supostamente mais débeis do ponto de vista econômico e contratual. O Estado foi impulsionado a intervir, de um lado para evitar explorações desumanas e, de outro, também, para estabelecer controle de concorrência entre as empresas. O direito civil deixou de ser a base da relação contratual. Em palavras outras, o respeito à dignidade interessava ao Estado e à sociedade e a uniformização de tratamento nas relações de trabalho impunha às empresas um ponto de partida de igualdade na presunção de que todos cumpririam as mesmas obrigações legais.

Depois, com a I Guerra Mundial constatou-se flagrante e injustificável desigualdade de tratamento em questões trabalhistas e que comprometia as condições de vida dos trabalhadores. O Tratado de Versalhes, além de se referir a um pacto de observância de direitos mínimos trabalhistas, criou a Organização Internacional do Trabalho com o objetivo de fixar normas de caráter internacional a que todos os países deveriam se submeter.

Durante a II Guerra Mundial foi engendrado o Relatório Beveridge comprometendo o Estado a assegurar aos seus nacionais a proteção em seguridade social como saúde e benefícios desde o nascimento até a morte. Além disso, o período imediato do pós-guerra marcou o avanço de trabalhadores por meio de sindicatos representativos, com presença no local de trabalho e de forma programática, a participação dos trabalhadores nas empresas.

No Brasil não tivemos estes impulsos, mas recebemos suas influências, como por exemplo, na Constituição de 1946, a referência à participação dos trabalhadores nos lucros das empresas e o descanso semanal remunerado. 

Portanto, parece que a evolução de direitos sociais ou pelo menos sua regulação se vincula à constatação de grave problema social. A nossa crise, neste primeiro quadrimestre de 2017, atinge em torno de 13 milhões de desempregados que não teriam atualmente acesso a qualquer tipo de vínculo de emprego, permanecendo excluído formalmente do mercado de trabalho.

Não há direitos fundamentais quando um dos maiores que é a garantia de emprego não está assegurada pelo Estado e a sociedade é incapaz de buscar uma forma de colocação no emprego. No PL não se está excluindo direitos e na nossa avaliação traz oportunidades de inclusão no mercado de trabalho por outras formas de contratação.

A proposta de reforma em andamento não poderia pretender agradar a unanimidade dos interesses de todos.  O Projeto de Lei substitutivo traz novos aspectos da relação de trabalho, alguns com garantias duvidosas e com possíveis críticas fundamentadas. Entretanto, não se pode negar o desejo de todos, alimentado há tempos, de que um dia a legislação trabalhista passasse por uma reforma e que tornasse o emprego mais acessível. Esta que aí está pode não ser a ideal, mas tende a se firmar e todos deverão aprender com o novo que a crise nos traz.






Paulo Sergio João - advogado especialista em Direito Trabalhista e professor da PUC-SP, FGV-Law e FACAMP - http://www.psjadvogados.com.br.





A reforma política (não) tão esperada



No Brasil existe uma pauta de interesse nacional que não avança, uma fila estática, que, quando muito, dá passos laterais curtos, que propositalmente mantem cada perfilado em seu exato local, de onde este não demonstra o mínimo interesse em descer. E é nesta pauta inavançável que está inserida a reforma política, tema de máxima relevância que somente emerge do calabouço de tempos em tempos, ou melhor, de crises em crises, como no cenário atual de grave descrédito da classe política, dos partidos políticos e até mesmo das instituições.

Como resposta para o assolado momento de desconfiança, o parlamento, ladeado pelo Executivo, através de comissão especial na Câmara, sob relatoria do deputado Vicente Cândido (PT-SP), bota em mesa uma reforma política que em muito dista dos anseios populares vociferados nas ruas nos últimos anos. Uma reforma incompleta, que tem como principais pontos os analisados em sequência.

Item interessante e oportuno é a unificação, para quatro meses, do prazo de desincompatibilização para todos os cargos públicos, medida que trará simplificação do instituto e maior objetivação do processo eleitoral. Já por outro lado, não tão positiva, em verdade uma opção contraproducente, é a inovadora possibilidade de um candidato disputar mais de um cargo político em um mesmo pleito, uma anomalia que exigiria do candidato mais de um projeto de governo/mandato.

Outra opção positiva é a extinção da segunda suplência de senadores, juntamente com a previsão de que em caso de vacância definitiva da vaga de senador o único suplente não ficaria até o fim do mandato, mas tão somente até a eleição imediata. Pela proposta, este suplente tomaria posse e permaneceria no cargo apenas até a eleição imediatamente próxima, independente da previsão de mais uma vaga para a disputa.

Também salutar é a proposta de vedação de divulgação de pesquisas eleitorais uma semana antes das eleições, extinguindo as disputas midiáticas pela apresentação de pesquisas na semana das eleições, todas com resultados variados e publicados com nítida objetivação de manipular a vontade do eleitor.

A proposta prevê também a unificação dos tempos de filiação e de domicílio eleitoral dos candidatos para nove meses antes das eleições, o que não vejo com bons olhos, vez que o encurtamento do prazo de domicílio proporciona candidaturas flutuantes nas proximidades do pleito, dando azo a eleição de pessoas sem identidade com a localidade que o escolhera.

Bastante polêmica, e que tem levantado acalorada rejeição, é a proposta de extinção dos cargos de vice-presidente, vice-governador e vice-prefeito, sob o argumento-maior de redução dos custos da Administração Pública. Entretanto, vejo como melhor solução a não remuneração do cargo de vice para as três esferas do Executivo, por trazer a desejada economia financeira e evitar a realização de novas eleições em caso de vacância, esta sim geradora de elevados custos para realização de novo pleito, além de reduzir a alternância e sua inerente instabilidade.

Prevê, ainda, a reforma em debate, que as eleições para os cargos do Executivo e do Legislativo devem ser realizadas em pleitos diferentes; com mudanças nas datas de posses para o dia 9 de janeiro, no caso de prefeitos e governadores; dia 10 de janeiro, presidente da República e dia 1º de fevereiro para todos os Parlamentares.

Outro item de insofismável importância é o que põe fim às coligações para todas as eleições proporcionais, encerrando a vida de um instituto que proporciona distorções e incoerências partidárias inexplicáveis, fortalecendo-se a identidade de cada Partido, que agora só poderá atuar isoladamente – caso aprovado este componente da proposição sob deliberação do Parlamento.

Não menos contestável é a adoção de cláusula de desempenho eleitoral, também conhecida por “cláusula de barreira”, como critério para que partidos tenham acesso ao fundo partidário e ao tempo gratuito de televisão, trecho da proposição rechaçada com veemência pelas pequenas agremiações, que tem sobrevivência econômica atrelada ao fundo partidário e protagonismo político máximo somente nos momentos de barganhas para formação de grupos eleitoreiros.

Traz, ainda, a reforma proposta a modalidade de financiamento eleitoral misto, bancado com parte por um fundo eleitoral e parte por doações de pessoas físicas. A grande rejeição do acenado fundo é a previsão de que ele seja mantido por receita proveniente da carga tributária, já tão elevada e sem o justo retorno à sociedade através de serviços de qualidade. Certamente o administrado não anseia ver seus recursos aplicados em eleições, o que é absolutamente compreensível.

Finalmente, sem dúvida o mais acalorado ponto da reforma, na ótica do cidadão, é a proposta de adoção do sistema de eleição de parlamentares por meio de lista fechada, com listas elaboradas por meio de prévias, convenções ou primárias; isto para as eleições de 2018 e 2022. Por este item, somente nas eleições de 2026 seria introduzido o sistema eleitoral misto, com parte das vagas destinadas aos escolhidos por lista pré-ordenada e a outra parte por sistema distrital.

Na ótica da sociedade, o sistema de lista fechada se destina unicamente à manutenção dos atuais mandatários, na quase totalidade desgastados pela derrocada econômica do país e/ou escândalos de corrupção que corroeram as colunas do Planalto e Parlamento, e que hoje veem-se na iminência de não alcançarem êxito na próxima eleição de 2018, já muito próxima e com todos estes ainda maculados pelo bombardeamento de notícias atentatórias às suas imagens.

A política partidária, que já mostrava sinais profundos de convalescência, ruiu de vez com a conjuntura atual. Partidos sem identidades, outros com fracionamentos internos injuntáveis, partidos antagônicos envolvidos em um mesmo escândalo. Enfim, toda sorte de desventuras vividas pelas agremiações conduziu ao status presente, em que uma reforma estruturante é imprescindível para a recuperação da democracia brasileira e não uma mera liberalidade do Parlamento.

Certo é que o prazo limite para aprovação da reforma, com tempo hábil para a sua adoção já nas próximas eleições, se aproxima a passos largos enquanto o consenso está distante, as divergências são inumeráveis e o rito ainda caminha para o Plenário, onde tudo há de ser debatido e deliberado. Dificilmente teremos uma reforma integralmente pronta para 2018, tanto pela falta de tempo suficiente, quanto pela falta de proposições que realmente tragam reformas estruturantes para nosso ordenamento político.

Por fim, é chegada a hora de sepultar o insustentável presidencialismo de coalizão e abrir caminhos para o semi-presidencialismo ou parlamentarismo, com uma prévia fase de diminuição do injustificável acervo de partidos políticos atuais, construindo um ambiente de agremiações sólidas e com identidade, e assim realizar uma reforma de fato estruturante, viabilizando o avanço da nossa jovem República. Do contrário, continuaremos a dar passos laterais e andarmos em círculos, sob o mesmo trilho e com os mesmos mandatários, que somente são sucedidos hereditariamente.





Marcones Santos - advogado de Direito Eleitoral e sócio do escritório Lopes, Leite & Santos Advogados Associados 




A sociedade da intolerância




Manifestações de intolerância têm sido registradas em diversas regiões do mundo. Guerras, atentados, crimes por ódio racial ou divergências religiosas, xenofobia, homofobia e tantos outros eventos marcam, há tempos, a convivência humana com intolerância e preconceito. Com a modernização e o advento da internet, casos de intolerância também são registrados nas redes sociais, como Facebook, Twitter e Instagram. Ofensas às mulheres, políticos, negros, deficientes e LGBTs são os que possuem maior registro na web.

Ainda que a globalização seja positiva no mundo contemporâneo, ela pode contribuir na disseminação da intolerância, uma vez que muitas ideias são difundidas indiscriminadamente para todos que possuem acesso à rede. Há uma imensa facilidade em se espalhar ideias e ideologias deturpadas, criando, assim, formas de discriminação e intransigência que resultam, na maioria, em coação, opressão e violência. 

A intolerância, seja ela de qualquer espécie, fere o artigo 7º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e se caracteriza pela falta de informação e vontade em se conhecer e respeitar as diferenças em crenças, opções sexuais e opiniões.

Um exemplo claro de conflitos relacionados à intolerância ocorreu na década de 1990 quando os sérvios da Bósnia-Herzegovina iniciaram um conflito étnico e religioso, ao declararem o território independente da ex-Iugoslávia. Nos Estados Unidos, a vitória do atual presidente Donald Trump gerou uma onda de intolerância pelo país, com o crescimento do ódio contra imigrantes, negros, homossexuais, mulçumanos e mulheres .Por meio de uma campanha lançada em 2015, as Nações Unidas vêm atuando pela aplicação dos princípios de inclusão, tolerância e do entendimento mútuo contra a discriminação, principalmente nas questões que envolvem a islamofobia, e contra o ódio.

Países em guerra ou com ideologias radicais não são os únicos que registram casos de intolerância pelo mundo. No Brasil, por haver a característica de ser um país multicultural, também crescem os registros de violência relacionados ao preconceito e à discriminação. Desde a época do Brasil Colônia, a diferença racial e a diversidade religiosa, em especial o Candomblé e a Umbanda, trazida pelos africanos escravizados, são motivos de intolerância no país. Os sentimentos de ódio e intolerância também estão presentes quando há distinção entre ricos e pobres, preconceito contra moradores de determinadas regiões, homossexuais e travestis, portadores de doenças transmissíveis ou a incitação da mídia contra o governo. 

As várias ocorrências de agressões públicas e invasões com quebra-quebra refletem a percepção de um Estado ineficiente, associado à tradição do desrespeito aos Direitos Humanos.  Diversas leis brasileiras estabelecem a igualdade e regem os crimes de preconceito, discriminação e intolerância praticados contra as pessoas. Entretanto, faz-se necessária e urgente a aplicação desses regimentos para que os registros relacionados à intolerância sejam combatidos no país.  
Constata-se, portanto, que a intolerância é um fenômeno antigo e mundial que vem causando implicações e sofrimento a toda sociedade contemporânea. É necessário e urgente que tenhamos mais conhecimento das causas e efeitos dessas manifestações para que possamos atuar pela disseminação da tolerância e pela transformação do pensamento atual.  





Renato Savy - advogado sócio do escritório Ferraz Sampaio e Dutra



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