O
presente artigo busca colocar em evidência a Lei nº 13.722/2018,
conhecida como Lei Lucas, publicada em 04/10/2018 e em vigor desde
03/04/2019, ainda pouco conhecida pelos seus destinatários e a comunidade em
geral. A lei surgiu em decorrência de uma fatalidade que acabou por
vitimar Lucas Begalli Zamora em 2017, uma criança de 10 anos de idade
que morreu após se engasgar durante o lanche em um passeio escolar na cidade de
Campinas – SP. A reflexão sobre este fato levou ao entendimento de que a morte
poderia ser evitada se algum dos monitores que acompanhava a turma de crianças
tivesse o conhecimento ou apenas noções básicas de primeiros socorros enquanto
se esperava o socorro médico.
Diante
deste cenário, o Projeto de Lei nº 17/2018 tramitou em caráter de
urgência durante o ano de 2018 e após sua aprovação pelo Congresso e Senado
Federal, foi sancionado pelo Presidente da República à época, Michel Temer,
sendo transformado na Lei nº 13.722/2018. A Lei Lucas,
obriga os estabelecimentos de ensino público e privado de educação básica e de
recreação infantil a capacitar seu quadro de professores e funcionários com
noções básicas de primeiros socorros.
Conforme
dados extraídos do site da ONG Criança Segura, os acidentes em sentido amplo,
são hoje a principal causa de morte de crianças de 1 a 14 anos no Brasil. Todos
os anos cerca de 3,7 mil crianças dessa faixa etária morrem e 113 mil são
hospitalizadas devido a essas causas, sendo que o sufocamento representa 22,1%
destas mortes. Portanto, a Lei Lucas que ainda é timidamente
conhecida, merece destaque no meio educacional. Estando em vigência
desde 03/04/2019, os estabelecimentos de ensino devem estar adequados às
suas exigências. Em caso de desrespeito, a Lei prevê um rol taxativo
de penalidades autorizando a autoridade administrativa desde a aplicação de
simples notificação pelo seu descumprimento, aplicação de multa que será
dobrada em caso de reincidência até a cassação do alvará de funcionamento ou da
autorização concedida em caso de nova reincidência.
Para
atender a determinação legal de capacitar professores e funcionários com noções
básicas de primeiros socorros, as escolas deverão ofertar anualmente a
capacitação e reciclagem destes profissionais. A quantidade de profissionais
capacitados deve obedecer a proporcionalidade entre o tamanho do corpo docente
e o fluxo de atendimento de crianças no estabelecimento. Deverá a escola dispor
de kits de primeiros socorros e fixar em local visível os certificados de
capacitação contendo os nomes dos profissionais capacitados, além de realizar
sua integração com a rede de emergência local, a fim de, em caso de
necessidade, estabelecer um fluxo de encaminhamento para a unidade de saúde
mais próxima.
Contudo,
apesar de estabelecer e exigir o cumprimento destes requisitos,
a Lei não esclarece de maneira satisfatória qual é a
proporcionalidade de professores e funcionários que devem ser capacitados; o
que deve conter o kit de primeiros socorros ou ainda qual o padrão de
certificação que deve ser obedecido. Quanto a este último requisito, dispõe que
”os cursos de primeiros socorros serão ministrados por entidades municipais ou
estaduais especializadas em práticas de auxílio imediato e emergencial à
população, no caso de estabelecimentos públicos, e por profissionais
habilitados, no caso dos estabelecimentos privados”, bem como que “o conteúdo
dos cursos de primeiros socorros básicos ministrados deverá ser condizente com
a natureza e a faixa etária do público atendido no estabelecimento de ensino ou
de recreação”. Atribuiu ao Poder Executivo a tarefa de definir em regulamento
os critérios para a implementação dos cursos de capacitação, o que não ocorreu até
a presente data. Quanto aos kits de primeiros socorros apenas alude que os
estabelecimentos de ensino deverão deles dispor, conforme orientação das
entidades especializadas em atendimento emergencial à população.
Sem
dúvida, a ausência de definição e regulamentação da lei coloca as
escolas e instituições de ensino em situação de insegurança no tocante à
implementação da Leijá vigente. No entanto, os estabelecimentos podem
buscar alternativas para o cumprimento das determinações impostas evitando
possíveis punições previstas emLei. Como? Diversos municípios em vários estados
do país, citando-se, apenas como exemplo, Campinas-SP, Curitiba e Londrina no
Estado do Paraná, possuem LeisOrgânicas Municipais que delimitam os
requisitos deixados em aberto pelo Poder Legislativo, estabelecendo o número
mínimo de profissionais que deverão ser capacitados e delimitando parâmetros
para o certificado que deve ser concedido ao final do curso, entre outros.
Assim, fazendo uso do que já está disponível, importante que o estabelecimento
de ensino faça uma pesquisa a fim de verificar se o município em que está
situado possui a respectiva Lei Orgânica, orientando-se por seus
parâmetros.
Ao
buscar o treinamento especializado em primeiros socorros, as escolas podem encontrar
soluções provisórias vendidas por cursos de brigadistas e hospitais que
oferecem esse tipo de serviço. Alguns já oferecem curso específico para atender
a demanda da Lei nº 13.722/2018, inclusive com certificação após a
conclusão e venda do kit primeiros socorros obrigatório, que comumente contém
antisséptico, band-aid, gaze, algodão, cotonetes e esparadrapo.
Para
obedecer a proporcionalidade citada pela Lei, é prudente observar a
natureza da própria Lei, que tenta fornecer proteção aos estudantes através
da capacitação dos profissionais que estão próximos a eles. Portanto, as
instituições podem observar este aspecto ao implementar a nova política de
treinamento dos professores.
De
maneira objetiva, deve ser considerado que com a entrada em vigência
da Lei Federal discutida, para os municípios que ainda não
possuem Lei orgânica sobre o assunto, as escolas devem a ela se
adequar, mesmo que de maneira provisória até que sobrevenha regulamentação
específica do Poder Executivo. Em relação aos municípios que já a possuem,
basta que os estabelecimentos de ensino a estas se adequem.
Em
que pese a lei em comento seja destinada a instituições de ensino, a
verdade é que a sociedade em geral deve estar preparada para enfrentar
situações desta natureza, podendo salvar vidas com utilização das noções
básicas de primeiros socorros.
Francismery Mocci - advogada
do escritório Marins Bertoldi com especialização em Direito
Processual do Trabalho.
Pedro
Cabral Lamarca - advogado do setor trabalhista do escritório Marins
Bertoldi.