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quinta-feira, 4 de maio de 2023

Terapia hormonal para fins terapêuticos é procedimento consolidado no Brasil e no mundo.


Como médico ginecologista que atua na especialidade da endocrinologia ginecológica e reprodutiva há mais de 40 anos, dos quais 25 com prescrição de terapia hormonal por meio do uso de implantes subcutâneos para administração de substâncias formuladas em concentrações específicas para atender pacientes em tratamentos de contracepção, doenças hormônio dependentes como endometriose, miomatose e outras, terapia de reposição hormonal e infertilidade considero que a Resolução CFM Nº 2.333, de 30 de março último, é  uma iniciativa importante devido ao que tem ocorrido nos últimos tempos.

Ao ratificar a Resolução CFM nº 1999, de 2012, o novo dispositivo possibilita colocar os pingos nos “is”, de forma decisiva sobre a terapia hormonal, a começar da sua concepção. A administração externa dessas substâncias só se justifica pela carência ou excesso no organismo, o que pode ser detectado durante a consulta clínica e demonstrado pelos resultados de exames laboratoriais específicos. Em suma, não são os hormônios que fazem mal, mas a sua prescrição equivocada e/ou excessiva.

Vivemos hoje um momento em que as pessoas, independente da idade, buscam a juventude e a beleza eternas. E há quem se disponha a aventuras e perigos inimagináveis para encontrá-las. Assim, é com preocupação que acompanho um número crescente de mulheres que chegam ao consultório com sequelas físicas e mentais das terapias hormonais de viés estético, conduzidas sem os devidos cuidados pelos profissionais.

Nesse sentido, a Resolução CFM Nº 2333 também é uma iniciativa louvável já que trata da ética, algo que não pode ser dissociado da formação profissional. Circulam no meio médico, propagandas de cursos inconsistentes a peso de ouro, que prometem conhecimentos não apenas para a prescrição do tratamento hormonal, como para a formulação de substâncias para manipulação em farmácia magistral.

Reforço então o alerta. Por mais rentável que seja um procedimento, é imprescindível que os candidatos estejam atentos para os riscos que correm de perder suas promissoras carreiras, visto que os problemas do desequilíbrio hormonal causados pelo uso incorreto ou exagerado das substâncias, podem se traduzir em efeitos colaterais graves e variados.

Entre os cardiovasculares, há quadros de hipertrofia cardíaca, hipertensão arterial sistêmica, acidentes vasculares, aterosclerose, estado de hipercoagulação, aumento da trombogênese e vasoespasmo. Há também o risco de doenças hepáticas como hepatite medicamentosa, insuficiência hepática aguda e carcinoma hepatocelular, bem como de transtornos mentais e de comportamento, com diagnósticos de depressão e dependência. A lista de distúrbios endócrinos inclui infertilidade, disfunção erétil e diminuição de libido.


A mentira do “chip da beleza”

O momento também é propício para esclarecimentos. Em primeiro lugar, não existe o tal chip da beleza. Essa expressão infeliz criada pelo marketing para fins mercadológicos é uma mentira na forma e no conteúdo.

O que se tem de concreto na Medicina são implantes subcutâneos que funcionam como uma via para administrar medicamentos, e também dosagens específicas de hormônios manipulados em concentrações personalizadas pela farmácia magistral, para fins terapêuticos. Fora disso, o que se tem praticado são promessas de procedência duvidosa e alto risco para a saúde.

Lembro que o uso dos implantes subcutâneos para a terapia hormonal foi introduzido há mais de 40 anos pelo médico ginecologista e endocrinologista, cientista e professor Dr. Elsimar Coutinho, que revolucionou a Medicina mundial ao questionar a necessidade da menstruação e ao popularizar diversos tratamentos hormonais, entre os quais o uso de contraceptivos duração prolongada, além de outros feitos notáveis.

Dessa forma, não se pode simplesmente deixar de lado uma solução médica que tem efeitos comprovados para o controle de diversos problemas de saúde, entre os quais as doenças hormônio dependentes, terapia de reposição hormonal e contracepção. Como discípulo fiel desse importante Mestre, não posso deixar que isso aconteça, por melhores que sejam as intenções das sociedades médicas que endossam a Resolução.

Reafirmo, ainda, que nem todas as pacientes se adaptam às dosagens da indústria farmacêutica, o que pede uma abordagem individual, para a obtenção dos melhores resultados que, em sua origem, são bastante específicos já que tratam do indivíduo.

 

Walter Pace - ginecologista, Titular da Academia Mineira de Medicina, Professor Doutor em Ginecologia e Coordenador Geral da Pós-Graduação em Ginecologia pela Faculdade de Ciências Médicas, Mestre em Reprodução Humana pela Universidade de Paris e Doutorado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).


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