Transformação
digital promete revolucionar a forma como se estudam os dados de clientes de
seguradoras, mas a mudança de mentalidade para as novas tecnologias começa no
ensino
A evolução tecnológica é uma característica dos
nossos tempos, sendo que a Inteligência Artificial (IA) tornou-se um grande
símbolo dessa transformação. É preciso entender que a IA separa-se em duas
principais linhas: as tecnologias que procuram imitar o comportamento humano -
os robôs - e as que propõem obter conhecimento baseadas na aplicação de
algoritmos estatísticos sobre grandes volumes de dados.
Vamos falar sobre esse segundo movimento.
O aumento da capacidade de processamento,
armazenamento e captação dos dados permitiu uma evolução dos algoritmos
estatísticos de aprendizado de máquina. Embora os computadores essencialmente
continuem os mesmos, baseados em lógica binária, o volume de diferentes tipos
de dados, atualizados em velocidade surpreendente, permite um retrato cada vez
mais preciso da realidade. A internet, as redes sociais e os sensores que as
pessoas passaram a carregar consigo expandiram toda essa capacidade para além
do computador pessoal, transferindo-a para a nuvem (cloud computing).
Particularmente na indústria do seguro,
algoritmos estatísticos sempre foram utilizados para o entendimento do risco e
cálculo do prêmio. A diferença é, mais uma vez, a variabilidade, volume e
velocidade com que os dados quantitativos e qualitativos são disponibilizados.
A evolução do uso dos dados
Atualmente, as seguradoras já utilizariam o
algoritmo de rede neural, por exemplo, para calcular taxas de prêmio para
seguros com grande volume de dados. Contudo, é preciso ter a tecnologia certa
para fazer essa técnica funcionar. Também não adianta ter a tecnologia sem as
pessoas corretamente treinadas para utilizá-la da melhor forma possível,
aproveitando ao máximo os recursos existentes.
As áreas atuariais - responsáveis por analisar os
riscos e as expectativas financeiras e econômicas - geralmente se mostram bem
atualizadas no que compete ao uso de tecnologias para cálculos estatísticos.
Mas o que falta é o acesso a uma maior variedade de dados organizados e
segmentados. As corporações ainda sofrem, muitas vezes, com os registros das
próprias transações. Enfrentam dificuldades no armazenamento de dados dos
clientes e na criação de uma maneira para interpretar o mundo através desses
dados. A causa disso é o atraso de investimento ou a adoção de sistemas
antiquados, além de projetos mal sucedidos de implantação de sistemas baseados
em bancos relacionais.
O ponto é que não existe uma solução tecnológica
única, que sirva para todas as empresas. Cada organização deve entender o
estágio de maturidade de seus controles e transações, bem como da forma de
acesso aos dados públicos disponíveis para que se possa gerar conhecimento com
o uso da inteligência artificial. Deve ter a visão do momento de transformação
digital em que se encontra, podendo, assim, identificar quais passos deve
seguir para que os algoritmos de aprendizado de máquina possam ser
aproveitados.
Duas faces da mesma moeda
O desafio da assimilação dessas novas tecnologias
é entender que a prática e a teoria não se separam. Às vezes, o excesso de
formalismo faz com que profissionais e estudantes pensem que determinado
aspecto do tema se trata “somente de teoria”, quando, na realidade, tudo está
interligado. A estatística, por exemplo, é teoria, mas também é prática. E essa
diferenciação só dificulta o aprendizado.
É claro que, em cursos específicos de matemática,
física e estatística, os formalismos matemáticos são fundamentais na construção
do conhecimento.
Acontece que, na academia, os cursos de pós-graduação,
principalmente, não levam em conta que muitos estudantes não tiveram um ensino
de base consolidado de cálculo. Nesse ponto, o excesso desses formalismos em
teoremas e a falta de exemplos pertinentes às atividades desempenhadas pelos
alunos não contribuem para a formação, servindo, muitas vezes, para reforçar a
divisão equivocada entre teoria e prática.
O ponto é fazer com que os estudos se aproximem
de exemplos concretos. O ideal é utilizar referências que tenham real
significado na vida profissional do aluno. Além disso, estar atualizado
sempre é condição para não ficar para trás, pois as tecnologias evoluem muito
rapidamente.
É preciso reforçar a importância de criar um
conhecimento sólido, mas que mostre aos estudantes e futuros profissionais no
mercado de trabalho que as duas coisas, teoria e prática, na verdade caminham
juntas. E mais: uma completa a outra na construção do conhecimento.
Fabio Polonio -
consultor independente e parceiro da Sistran. Atua como professor de
pós-graduação em ciência dos dados. Ocupou cargos executivos em seguradoras
nacionais e multinacionais, sempre ligados a projetos estratégicos e à
transformação digital. Obteve seu mestrado em engenharia de software pelo IPT e
é formado pela USP e pelo Mackenzie.
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