Depressão, solidão e demência ainda são tabus que
precisam ser enfrentados para garantir dignidade e qualidade de vida aos idosos
No dia 1º de
outubro é celebrado o Dia do Idoso, uma data que convida a refletir não apenas
sobre longevidade, mas também sobre qualidade de vida. Entre os diversos
desafios dessa fase, a saúde mental é um dos aspectos mais negligenciados,
muitas vezes escondido atrás de tabus, estigmas e da falsa ideia de que
tristeza e isolamento seriam “naturais da idade”.
De acordo com o
psiquiatra Glauco Correa de Araújo, do grupo ViV Saúde Mental e Emocional, essa
visão equivocada impede diagnósticos precoces e tratamentos eficazes.
“A depressão, os
transtornos de ansiedade e até mesmo os primeiros sinais de demência podem ser
confundidos com o envelhecimento normal, o que atrasa o cuidado e aumenta o
sofrimento do idoso e da família”, explica.
A dimensão do
problema
Segundo a
Organização Mundial da Saúde (OMS), a demência está entre as principais causas
de incapacidade e dependência entre idosos, frequentemente acompanhada por
sintomas como depressão e ansiedade.
Estudos recentes,
como o divulgado pelo Nature Mental Health, também apontam que quando a
depressão se combina a um comprometimento cognitivo, o risco de evolução para
demência pode ser até 3,5 vezes maior.
No Brasil, os
números reforçam a urgência do tema. De acordo com a pesquisa ELSI-Brasil
(2015-2016), quase metade dos idosos (48,7%) relatou sintomas depressivos.
Outra análise nacional publicada pela Revista Brasileira de Geriatria e
Gerontologia identificou 11,8% de prevalência autorreferida de depressão em
pessoas acima dos 60 anos.
“O que esses dados
mostram é que a saúde mental do idoso não pode ser tratada como algo
secundário. A depressão nessa fase está associada a maior mortalidade, pior evolução
de doenças cardiovasculares e queda significativa na qualidade de vida”,
reforça o médico.
Tabus e
barreiras que dificultam o cuidado
De acordo com o psiquiatra,
diversos fatores ainda impedem que idosos recebam o apoio necessário:
Vergonha e
estigma: muitos acreditam
que procurar ajuda psicológica ou psiquiátrica é sinal de fraqueza.
Naturalização
dos sintomas: familiares
tendem a interpretar apatia, falta de interesse e isolamento como parte
“normal” do envelhecer.
Sinais
diferentes dos jovens: nos idosos,
a depressão pode se manifestar principalmente por queixas físicas (dores,
fadiga, alterações de sono e apetite) e não apenas por tristeza explícita.
Isolamento
social: a perda de
vínculos afetivos, limitações de mobilidade e redução da rede de apoio
intensificam o risco de depressão e declínio cognitivo.
Falta de
preparo da rede de saúde:
equipes de atenção primária nem sempre têm capacitação para reconhecer sinais
de sofrimento mental nessa faixa etária.
“O estigma ainda é
a maior barreira. Muitos idosos se calam e sofrem sozinhos, acreditando que é
tarde demais para buscar ajuda. Mas nunca é tarde para tratar a saúde mental”,
destaca dr. Araújo.
O que
familiares e cuidadores devem observar
Para o
especialista, reconhecer os sinais precoces é essencial para oferecer ajuda no
momento certo. Entre os principais sintomas de alerta estão:
- Tristeza
ou desânimo persistentes por semanas;
- Perda
de interesse em atividades antes prazerosas;
- Isolamento
social progressivo;
- Alterações
de sono e apetite;
- Queixas
frequentes de dores sem causa médica aparente;
- Esquecimentos
e dificuldades de concentração;
- Descuido
com a higiene e autocuidado;
- Comentários
de desesperança ou inutilidade.
“É fundamental que
cuidadores e familiares estejam atentos a mudanças sutis no comportamento e não
hesitem em procurar avaliação médica. Cada semana de atraso pode representar
sofrimento desnecessário”, orienta o psiquiatra.
Caminhos para
envelhecer com saúde mental
Dr. Araújo reforça
que o cuidado com a mente deve ser multidimensional. A prática de exercícios
físicos, a participação em atividades sociais, a estimulação cognitiva e o
acompanhamento psicológico são pilares fundamentais.
Segundo o estudo U.S.
Study to Protect Brain Health Through Lifestyle Intervention to Reduce Risk,
publicado no periódico científico JAMA em julho, intervenções de estilo
de vida que combinam dieta saudável, exercício físico regular, estímulos
cognitivos, engajamento social e monitoramento de saúde cardiovascular
conseguiram melhorar significativamente a função cognitiva de idosos entre 60 e
79 anos, mesmo entre os que têm risco aumentado por fatores como histórico
familiar ou predisposição genética.
Para Glauco
Araújo, esse tipo de evidência reforça a importância de não esperar o
sofrimento mental se agravar, mas agir preventivamente.
“No Brasil, ainda
temos um caminho longo para estruturar políticas públicas específicas, mas já
sabemos que pequenas ações, como estimular o convívio social e garantir apoio
psicológico, fazem enorme diferença na vida do idoso”, ressalta.
Um chamado à
sociedade
O Dia do Idoso
deve ser um convite a romper o silêncio sobre o sofrimento emocional na
velhice. “Envelhecer não é sinônimo de tristeza ou solidão. Cada pessoa idosa
merece viver com dignidade, companhia e propósito. Falar de saúde mental é
falar de direitos e de humanidade”, finaliza o especialista.
ViV Saúde Mental e Emocional
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