Especialistas do CEJAM explicam os desafios do diagnóstico tardio, sinais de alerta e as opções de tratamento multidisciplinar para adultos com Transtorno do Espectro Autista
O dia 2 de abril é
marcado pelo Dia Mundial da Conscientização do Autismo. A data, instituída pela
Organização das Nações Unidas, tem como objetivo compartilhar informações sobre
o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e promover a inclusão e o respeito. Além
disso, é um importante lembrete da necessidade de desmistificar o autismo,
especialmente na fase adulta, quando o diagnóstico tardio ainda é uma realidade
para muitos.
Embora o TEA seja
um transtorno do neurodesenvolvimento que se manifesta desde a infância, muitos
adultos passam a vida sem saber que possuem a condição. Isso pode ocorrer
devido a diversos fatores, como o preconceito, o estigma social e a falta de
informação. Outro ponto é que muitos indivíduos desenvolvem "comportamentos
compensatórios" para mascarar seus sintomas e se adequar às expectativas
sociais.
"Ao longo do
desenvolvimento do indivíduo com TEA, a pessoa pode camuflar alguns sintomas,
nem sempre de maneira consciente, mas como forma de enfrentar as dificuldades
do dia a dia", explica Helen Batista de Figueiredo, Neuropsicóloga no
Centro Especializado em Reabilitação II (CER) Girassol, gerenciado pelo CEJAM
em parceria com a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo.
Diagnóstico
tardio
Apesar dos desafios,
é possível diagnosticar o TEA na fase adulta. No entanto, esse processo exige
uma avaliação minuciosa e o uso de instrumentos padronizados que possibilitem
distinguir entre o Transtorno do Espectro Autista e outras condições com
sintomas semelhantes, como ansiedade, fobia social e transtorno obsessivo
compulsivo.
"O
profissional deve estar atento à importância de realizar um diagnóstico
diferencial, que é um processo que exige uma avaliação minuciosa e o uso de
instrumentos padronizados que possibilitem distinguir entre condições com
sintomas semelhantes, evitando, assim, diagnósticos errôneos e,
consequentemente, tratamentos inadequados", afirma Helen.
Os critérios
diagnósticos para o TEA são os mesmos para crianças e adultos, mas as manifestações
dos sintomas podem variar ao longo do desenvolvimento. No entanto, em adultos,
esses sinais podem não se manifestar plenamente até que as demandas sociais
ultrapassem as capacidades do indivíduo.
“Embora os
critérios de diagnóstico sejam os mesmos, as manifestações dos sintomas variam
entre crianças e adultos, já que esses sintomas podem mudar ao longo do
desenvolvimento. Nos adultos, frequentemente, os sinais são camuflados, e os
critérios podem ser preenchidos com base em informações retrospectivas.
Contudo, é necessário que a apresentação atual cause prejuízo significativo ao
indivíduo”, pontua a especialista.
Critérios de
avaliação
O diagnóstico é
realizado por um psiquiatra ou neurologista, mas Helen alerta: “É importante
entender que, por se tratar de um diagnóstico clínico fundamentado na
observação do comportamento, entrevistas e aplicação de instrumentos
padronizados, é fundamental o envolvimento de uma equipe multiprofissional.”
Existem diversos
sinais e comportamentos que podem indicar a presença do TEA em adultos. A
manifestação dos sintomas é diversa e individual, embora compartilhe alguns
sinais clínicos comuns que indicam um desenvolvimento atípico.
Segundo a
especialista, os principais sinais são: déficits persistentes na comunicação e
interação social, manifestando-se em dificuldades para estabelecer conversas e
relacionamentos; problemas em interagir com outros indivíduos e disfunção na
cognição social, que se traduz na dificuldade em compreender e responder às
intenções, ações e emoções alheias; assim como se autorregular diante de
situações ou regras sociais. Em adultos com linguagem fluente, há a
possibilidade de existir, ainda, uma "linguagem corporal" rígida ou
exagerada.
Adicionalmente,
pessoas com TEA podem apresentar estereotipias motoras simples, rigidez nas
rotinas, sofrimento diante de pequenas mudanças, padrões rígidos de pensamento
e interesses incomuns e repetitivos por aspectos sensoriais, como respostas
excessivas a sons e texturas, ou aparente indiferença à dor, calor ou frio.
Além disso, muitos
adultos com TEA apresentam comorbidades psiquiátricas, como ansiedade,
depressão e Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Tais
patologias podem influenciar o diagnóstico e o tratamento, tornando o manejo
clínico mais complexo.
Tratamento e
qualidade de vida
O tratamento do
transtorno em adultos visa aprimorar as habilidades sociais, promover a
regulação emocional e assegurar a habilitação e a reabilitação, contribuindo
para a melhora na qualidade de vida. Nesse contexto, as atuações da fisiatria e
da neuropsicologia se mostram essenciais.
O acompanhamento
com psiquiatra e/ou neurologista, é fundamental para desvendar o funcionamento
cognitivo e comportamental dos indivíduos com o transtorno. “A avaliação
neuropsicológica e multiprofissional não tem a intenção de rotular ou limitar o
indivíduo, mas sim de apoiar o diagnóstico médico, identificar as facilidades e
dificuldades cognitivas e comportamentais, e direcionar as intervenções necessárias,
com o objetivo primordial de melhorar a qualidade de vida", ressalta a
neuropsicóloga.
Através da
avaliação, é possível identificar as áreas de força e fraqueza de cada um,
planejar o tratamento de forma individualizada e implementar intervenções eficazes
para melhorar a atenção, a memória, a linguagem e outras funções cognitivas,
além de auxiliar no desenvolvimento de estratégias para lidar com
comportamentos desafiadores.
É nesse cenário
que, muitas vezes, torna-se imprescindível a atuação de uma equipe
interdisciplinar, liderada por um médico especialista em reabilitação, para a
elaboração do diagnóstico e, posteriormente, do projeto terapêutico singular
(PTS). "É aqui que surge a figura do médico fisiatra. Trata-se de um
médico especialista no processo de reabilitação nas diversas fases da vida e
qualificado para coordenação do cuidado interdisciplinar", enfatiza o Dr.
Filipe Eustáquio, fisiatra no CER II Girassol.
“O objetivo do
fisiatra é favorecer a restauração da função das pessoas, atuando na prevenção,
diagnóstico e tratamento não-cirúrgico de distúrbios associados a doenças e
problemas que comprometem o movimento, a força e a funcionalidade do
corpo", completa o especialista.
O trabalho, em
conjunto com a equipe interdisciplinar na construção do PTS, visa fornecer
suporte emocional, auxiliar no desenvolvimento de aspectos comportamentais e
sensoriais, e promover a reabilitação e habitação do paciente.
Linha de
Tratamento CER II Girassol
O CER – Centro
Especializado em Reabilitação é um serviço de atenção especializada que compõe
a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência no âmbito do Sistema Único de Saúde
(SUS). Atuando de maneira articulada aos demais pontos da rede, o CER Girassol,
sob gestão do CEJAM, oferece um diferencial crucial no tratamento de pessoas
com TEA ao integrar uma equipe multidisciplinar composta por neuropsicólogo,
psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, assistentes sociais,
fisioterapeutas, enfermeiros, médicos neurologistas e fisiatras.
A equipe trabalha
de forma coordenada, proporcionando uma abordagem mais holística e
individualizada, permitindo que as diferentes dimensões do TEA sejam tratadas
simultaneamente, com estratégias complementares que se ajustam às necessidades
específicas do indivíduo.
"Somos um
serviço de referência no cuidado e proteção aos usuários, familiares e
acompanhantes que necessitam de reabilitação física e intelectual",
completa Erica Lavoura, gerente da unidade.
Para obter
atendimento no CER, o paciente deve ser encaminhado pela Unidade Básica de
Saúde mais próxima de sua residência, onde será consultada a disponibilidade e,
após a liberação da vaga, a UBS entrará em contato com as orientações para a
primeira avaliação no local.
Para a gerente, cada desafio enfrentado contribui para o crescimento e aprimoramento dos serviços, com uma sensação de recompensa ao ver os resultados positivos. "No fim, o sentimento é de compromisso renovado e uma satisfação profunda por fazer parte de um trabalho tão relevante e transformador", finaliza Erica.
CEJAM - Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”
@cejamoficial
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