O Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP) foi palco, na manhã do último dia 3 de outubro, de uma atípica manifestação de trabalhadores terceirizados, que protestaram contra a proibição de celulares nas áreas de carga e descarga dos terminais. A paralisação provocou atrasos nas chegadas e saídas dos voos, criando mais um transtorno para a população que sofreu a paralisação de trens e metrôs na cidade de São Paulo.
Em resumo, os trabalhadores questionam a proibição do uso de
aparelhos celulares em certas áreas internas do aeroporto, lançada pela Receita
Federal, a partir do caso da troca dolosa de bagagens de duas brasileiras que
acabaram sendo presas na Alemanha. Os manifestantes alegam que perderam a
conexão com seus familiares e que a proibição reflete uma “ditadura” imperando
no aeroporto.
A partir desta atípica manifestação, uma reflexão deve ser feita, a respeito de uma possível ascensão de um “direito à conexão”, em contraponto ao “direito à desconexão”.
Com o advento de meios telemáticos cada vez mais acessíveis
e práticos, a exemplo dos smartphones, em que tudo e todos constam na palma da
mão, como uma extensão do corpo humano, a sociedade se torna hiperconectada,
instantânea, confundindo os espaços do trabalho, da casa e do lazer, sendo
“tudo ao mesmo tempo agora”, como diriam os roqueiros da banda Titãs.
Há pouco mais de duas décadas, um trabalhador deixava o espaço da sua casa, deslocava-se pela cidade para o espaço do trabalho e, nas horas vagas e de ócio, frequentava o espaço do lazer.
Em tempos atuais de avultamento do teletrabalho, defende-se, por um lado, um “direito à desconexão”, para que o empregado possa se desconectar do serviço, material e imaterialmente, para poder usufruir da folga e do repouso, não levando o trabalho para o espaço (e o tempo) da casa nem do lazer.
O que se viu na manifestação do Aeroporto de Guarulhos, por outro lado, é levar os espaços da casa e do lazer para o espaço do trabalho, por meio da conexão do smartphone, movimento que faz parecer emergir um novo direito da classe trabalhadora, o de estar conectada, simultaneamente, com o não trabalho.
A ponderação entre os vários valores a serem defendidos com a legítima medida de proibição do uso de celulares no ambiente de trabalho, como segurança e integridade, deve ser mediada com o desejo da classe de estar conectada e de não estar excluída da vida social. Valem o alerta e a reflexão.
Eduardo Pragmácio Filho - advogado, doutor em Direito do
Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP),
pesquisador do Getrab-USP, sócio do escritório Furtado Pragmácio Advogados,
membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho.
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