Assim como
existem males que vêm para o bem, há mentiras que servem para estabelecer
verdades. Todo marxista (refiro-me, aqui ao ativista da causa e não àquele que
lê Marilena Chauí, bebe sua vodca e põe a revolução para dormir com um ursinho
de pelúcia) - todo marxista repito, tem absoluta convicção de sua superioridade
intelectual e moral.
Para entender as razões da
nuvem de gafanhotos que caiu sobre o trabalho humano e sobre a economia no
combate à covid-19, pense no modo como vêm sendo tratados entre nós os crimes
contra o patrimônio. É extremamente didático fazê-lo. Mesmo uma ligeira busca
no Google evidenciará que, em diferentes pontos do país, a pandemia fez
decrescer muito o número de furtos e roubos. Vale dizer, os criminosos
"contra o patrimônio" respeitam mais o vírus do que a lei, que é
branda e aplicada a eles com brandura por uma justiça que atenua tais delitos.
No entanto,
na vida fora dos livros mal pensados, o cidadão que sai à rua é caça, pronto
para ser caçado por uma multidão de ladrões mantidos soltos malgrado serem
frequentadores assíduos das carceragens. Há braços da justiça recolhidos,
romantizando esse tipo de ação que seria cometida por alguém buscando com as
próprias mãos dar materialidade à justiça. Não importa se a sociedade se
percebe como caça, acossada por caçadores à espreita, nem que os cidadãos, a
cada ato desses, temam pela própria vida e pela vida dos seus. É um roubinho,
um furtinho, uma saidinha de banco, que se perdoam com um pai-nosso e duas
ave-marias. O diminutivo ajuda a minimizar atribuindo valor apenas ao bem
alheio, tomado ou furtado. "São só bens materiais!", alegam, num
generoso desprendimento em relação ao que é dos outros...
Só que não!
Essa atitude finge desconhecer que por trás de cada bem há um ser humano
agredido, ameaçado, em pânico, ferido em sua dignidade. Que uma anciã foi
furtada de sua aposentadoria. Que os negócios do proprietário estavam no
notebook que lhe tomaram. Que a senhora de quem levaram a bolsa gastará horas e
horas de diligências para recompor a própria identidade. Que com o carro
levaram uma poupança de muitos anos. Pecaminosa indulgência!
Assim
pensam, escrevem, ensinam, convictos de manterem para com a humanidade uma
relação de amor e de que o ser humano só pode ser realmente amado num estado
comunista.
Não ria que eles ficam
aborrecidos. A suposta beatitude impulsionada pela superioridade moral desse
amor não sofre qualquer abalo ante o fato de toda experiência nesse sentido ser
um flagelo de muitas dimensões. Uma eterna nuvem de gafanhotos se instala sobre
a economia. Uma corte de privilegiados malfeitores se instala no poder. Uma
sequência de genocídios se faz necessária para que a sociedade se submeta a seu
miserável papel na história. É assim, sempre, nas muitas dimensões dessas
experiências. A liberdade individual é sempre capturada na portaria do sistema.
"Sua loja está sendo fechada, senhor!".
Chegamos,
então, à momentosa questão das empresas (e dos empregos); da atividade
econômica e do trabalho humano. A interpretação marxista comete em relação ao
enfrentamento ao novo coronavírus o mesmo equívoco, distinguindo a dimensão
material da atividade econômica dos seres humanos concretos sem os quais ela
sequer existe. Aqui, o Estado age como o ladrão.
É a mesma ideologia que Marx
bebeu de canudinho em Proudhon, para quem a propriedade privada é o roubo. Ora,
se a propriedade é apenas um bem material e é, além disso, um roubo, são
supérfluos os interesses nela envolvidos.
Então, fecha
tudo e vamos cuidar da mídia.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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