Nenhuma
das grandes companhias petrolíferas do mundo alinha seus investimentos de
maneira a viabilizar a meta do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global
em 1,5ºC neste século
Londres/Nova York - Desde
2018, as principais companhias de petróleo e gás do mundo já aprovaram
investimentos que totalizam US$ 50 bilhões em projetos que ameaçam os
compromissos climáticos globais e o retorno financeiro de seus acionistas,
aponta um novo relatório da Carbon Tracker publicado hoje.
O estudo “Breaking the
habit: Why none of the large listed oil companies are Paris aligned" identifica
projetos individuais que são inconsistentes com o Acordo de Paris e aponta que
nenhuma grande companhia petrolífera esta investindo de maneira a facilitar a
limitação do aquecimento global em 1,5ºC até 2100 com relação aos níveis
pré-industriais. Isso em um momento no qual investidores em todo o mundo estão
sendo cada vez mais pressionados a direcionar suas aplicações para companhias
energéticas alinhadas com as metas de Paris.
O relatório da Carbon
Tracker alerta que a demanda por combustíveis fósseis precisa cair para que as
metas climáticas globais sejam viabilizadas, e apenas projetos sob custos mais
baixos conseguirão devolver um retorno econômico aos investidores sob essa nova
realidade. No entanto, o relatório destaca 18 projetos que totalizam US$ 50
bilhões que foram recentemente aprovados pelas companhias que insistem na
aplicação de vultosos montantes financeiros no uso de fontes fósseis de
energia.
“Cada grande companhia de
petróleo está apostando pesadamente contra o limite de 1,5 ºC e investindo em
projetos que contrariam as metas de Paris”, aponta Andrew Grant, analista
sênior da Carbon Tracker e um dos autores do relatório. “Os investidores devem
contestar os gastos das empresas em novos projetos fósseis. A melhor forma de
preservar o valor do acionista na transição para o baixo carbono e, ao mesmo
tempo, alinhá-lo com as metas climáticas será enfocar em projetos de baixo
custo que poderão entregar retornos maiores”.
Os investidores estão cada
vez mais preocupados sobre os riscos climáticos em seus portfolios e na vida de
seus clientes, na medida em que as evidências sobre os perigos da crise
climática se tornam mais claras. Muitos estão pressionando as empresas de
energia em torno de projetos de baixo carbono e iniciativas como a Climate
Action 100+, apoiada por investidores com ativos que valem US$ 34 trilhões.
A Carbon Tracker aplicou a
trajetória mais ambiciosa de redução de emissões definida pela IEA (com meta de
1,6ºC) e estimou que as maiores companhias de petróleo listadas, como
ExxonMobil, Chevron, Shell, BP, Total e Eni, gastaram cada uma ao menos 30% de
seu investimento em 2018 em projetos que são inconsistentes com um mundo de
menos de 1,6ºC de aquecimento. O relatório conclui que os projetos já aprovados
pelas gigantes do petróleo e gás inviabilizarão essa meta de aquecimento
definida pelo Acordo de Paris.
Para superar essa situação,
o relatório sinaliza que as companhias precisarão cortar investimento, mesmo em
tecnologia de captura e armazenamento de carbono, que não são vistos como de
viabilidade prática neste momento. A demanda por petróleo e gás pode ser
atendida com projetos que dão retorno com preços abaixo dos US$ 40 por barril,
e investimentos mais altos arriscam criar “ativos encalhados” que nunca
conseguirão dar retorno financeiro aos investidores.
Ele alerta também que as
companhias de petróleo e gás podem desperdiçar US$ 2,2 trilhões até 2030 se
elas basearem suas decisões de investimento nas políticas atuais de emissões de
carbono definidas pelos governos, que podem levar o mundo a um aquecimento de
2,7ºC, ao invés de planejar para uma transição mais completa e rápida.
Grandes companhias do setor,
como Shell, BP, Equinor e Total procuraram reassegurar aos seus investidores
que elas estão respondendo a suas preocupações climáticas. As três primeiras,
por exemplo, disseram que vão testar novos investimentos para buscar
consistência com cenários de baixo carbono. O relatório deixa claro que essa
mudança no comportamento da indústria é necessária para que ela se torne
realmente alinhada aos compromissos de Paris.
O estudo está disponível na
íntegra (em inglês) no link https://www.carbontracker.org/reports/breaking-the-habit/
Os investidores devem
desafiar investimentos em projetos inconsistentes com um mundo de baixo carbono
Desde o começo de 2018,
todas as grandes companhias de gás e petróleo do mundo aprovaram projetos
inconsistentes com as metas do Acordo de Paris. A Carbon Tracker destaca que os
US$ 50 bilhões investidos em 18 grandes projetos são inconsistentes mesmo com
cenários menos ambiciosos, com limitação do aquecimento entre 1,7 e 1,8ºC. Nessa
relação, destacam-se:
- US$ 13 bilhões investidos pela
Shell em projetos de gás natural liquefeito no Canadá
- US$ 4,3 bilhões pela BP,
Chevron, ExxonMobil e Equinos em projetos de extração de petróleo no fundo
do mar no Azerbaijão
- US$ 1,3 bilhão pela BP,
ExxonMobil, Total e Equinos em projetos de exploração no fundo do mar em
Angola
“Esses projetos representam
uma ameaça iminente aos investidores e companhias que buscam alinhar suas
decisões com as metas climáticas”, alerta o relatório.
De todas as gigantes do
setor, a ExxonMobil é a empresa com o maior risco de ficar com ativos
encalhados em um mundo de baixo carbono, com mais de 90% de seus investimentos
potenciais entre 2019 e 2030 direcionados a projetos fora da trajetória de
1,6ºC de aquecimento. Ela é seguida pela Shell (70%), Total (67%), Chevron
(60%), BP (57%) e Eni (55%).
A Carbon Tracker estima que
as companhias de petróleo e gás gastariam cerca de US$ 6,5 trilhões até 2030 em
projetos que colocariam o mundo numa trajetória de aquecimento de 2,7ºC. Por
outro lado, investimentos em projetos que viabilizariam um aquecimento de 1,6ºC
totalizariam US$ 4,3 trilhões. Ou seja, projetos com custos maiores arriscam
criar ativos encalhados que nunca darão o retorno esperado aos acionistas
dessas empresas.
- Oil sands (areia betuminosa):
nenhum projeto novo é consistente com as metas de Paris e os altos custos
de produção implicam que eles não são realmente necessários em um mundo de
2,7ºC de aquecimento. O relatório adverte: “A Associação de Produtores de
Petróleo do Canadá prevê um aumento de 41% na produção de petróleo nas oil
sands entre 2019 e 2030; acreditamos que essas expectativas precisam ser
revisadas significativamente”.
- Ártico: a maior parte dos
projetos é cara e de alto risco, ainda que alguns sejam de baixo
custo
- Xisto: investimentos em xisto
betuminoso são muito sensíveis à demanda. Atender à demanda em um mundo de
2,7ºC de aquecimento iria requerer US$ 1,1 trilhão, mais de 90% a menos
que os US$ 112 bilhões necessários em um mundo de 1,6ºC. Empresas como
Pioneer e Concho estão entre as diversas companhias norte-americanas no
setor nas quais o portfolio inteiro está sob risco de ficar encalhado.
Metodologi
A Carbon Tracker utilize os
cenários da Agência Internacional de Energia (AIE) para modelar os suprimentos
de petróleo e gás sob a trajetória de aquecimento de 1,6ºC (B2DS) e sob
1,7-1,8ºC (SDS), e comparou com a trajetória de 2,7ºC (NPS) consistente com os
compromissos atuais de redução de emissão por parte dos países. Para modelar o
suprimento sob uma trajetória de 1,5ºC, o relatório utilizou os cenários
desenvolvidos pelo Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudança do
Clima (IPCC).
Com a oferta disponível
superando a demanda, assume-se que os projetos com menor custo de produção
serão mais competitivos, enquanto projetos de custo mais elevado, que
dependerão de preços mais altos para ter retorno, correm o risco de tornar-se
“ativos encalhados”, ou ativos ociosos. O relatório analisou 71 das maiores
empresas de petróleo e gás, calculando sua exposição usando dados de
fornecimento do projeto da Rystad Energy. Este estudo atualiza a análise feita
nos relatórios da Carbon Tracker “2 Degrees of Separation” (2017) e “Mind the
gap: the 1.6 trillion energy transition risk” (2018).
Carbon Tracker
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