O crescimento do número
de mulheres presas no Brasil é assustador. O aumento foi de 570% na última
década e meia (de 2000 a 2014).
De acordo com o último
relatório do Infopen Mulheres (Levantamento Nacional de Informações
Penitenciárias), publicado pelo Ministério da Justiça, de 610 mil presos no
país, 38 mil são mulheres, a maior parte presa por crimes não violentos,
especialmente o tráfico de entorpecentes, na proporção de 68%. Enquanto os
homens, em sua maioria, estão detidos por roubo.
No crime de tráfico, as
mulheres exercem papéis menos relevantes. São as pequenas vendedoras, as que
realizam transporte de pouca quantidade de drogas. Nesse contexto, são as mais
vulneráveis.
E o envolvimento delas
na criminalidade relaciona-se com a sobrevivência, com a necessidade de manter
o mínimo de subsistência para si e a família. Às vezes, como atividade única e
às vezes para complementar a renda. A maioria das mulheres presas é chefe
de família, pobre, com filhos pequenos, muitas são vítimas de violência doméstica.
E a cada três mulheres presas, duas são negras.
A exclusão a que são
submetidas inclui a imposição de distância das suas famílias. Existem poucos
estabelecimentos prisionais femininos, a maioria das presas está em
estabelecimento misto. Normalmente, as prisões estão distantes das cidades de
origem, e este é mais um fator para o abandono.
A prisão dessas
mulheres causa danos pessoais, familiares e sociais.
É preciso fazer uma
reflexão séria: Que benefícios trazem essas prisões? Quem se responsabiliza pelos
filhos das presas? Que mulheres estamos prendendo? A que pode
interessar essa política de massificação da prisão, que traz mais danos que
benefícios?
Há muito dinheiro
envolvido no tráfico de entorpecentes, mas onde estão os grandes traficantes? Em
que banco colocam o dinheiro? São milhões e milhões que circulam e ninguém vê e
ninguém apreende, porque propositadamente só prendem o elo fraco.
Hoje não há uma
política séria de combate ao verdadeiro tráfico. As ações que existem são para
enganar a população e prender massivamente os periféricos. Quando uma mulher é
presa, outra chega para substituí-la no papel subalterno, rapidamente.
A política de combate
às drogas está equivocada e começa a mudar internacionalmente.
Nos Estados Unidos, por
exemplo, o presidente Barack Obama começou em 2015 a antecipar a soltura de
milhares de presos. O país percebeu que os custos do sistema prisional são
muito altos e o aprisionamento em massa não significa a diminuição do tráfico
de drogas.
Sempre que possível, é
necessário evitar o sistema prisional como resposta para um crime. Existem
outras respostas mais eficientes. No Brasil, a sociedade, de uma forma geral,
ainda não se deu conta do gasto enorme do encarceramento e dos danos sociais
que perpetua.
O STF (Supremo Tribunal
Federal) tem várias decisões de aplicação de penas alternativas para estes
crimes, mas o fato é que cerca de 45% das mulheres está cumprindo pena em
regime fechado.
O Grupo de Estudos e
Trabalho “Mulheres Encarceradas”, que atua desde 2001, e mais 200 entidades,
defendem um indulto/comutação especial para o Dia Internacional da Mulher.
Na perspectiva
histórica de política criminal, o indulto, que está previsto na Constituição
brasileira pode ser concedido a qualquer momento, sempre que o presidente ou a
presidenta da República entenda ser o melhor. Em geral, é concedido em momentos
festivos, como o Natal, para pessoas que cumpram requisitos fixados pela
presidência, que podem ser o tempo de cumprimento da pena; a primariedade e outros.
Obrigatoriamente, cada caso concreto tem que ser submetido ao Poder Judiciário.
Esse pedido está
diretamente ligado à realidade das mulheres presas, que são a categoria mais
vulnerável e ainda não têm políticas públicas específicas.
Ainda há resistência
para a concessão de indulto para crimes relacionados ao tráfico de drogas, em
que pese não haver limitação constitucional.
Até o Grupo de Estudos
e Trabalho “Mulheres Encarceradas existir, sequer tinhamos dados sobre as
mulheres presas. Como é possível estabelecer políticas públicas sem saber os
números? As mulheres não tinham direito às visitas íntimas. A reversão
deste quadro foi uma de nossas primeiras conquistas. Também conseguimos
visibilizar o problema do encarceramento de mulheres.
É preciso muito mais. O
indulto/comutação especial para o Dia da Mulher é uma medida urgente e um passo
importante para que essa questão avance e para que se rompa com o plano de
injustiça à que estão submetidas as mulheres encarceradas.
Kenarik Boujikian - juíza do Tribunal de
Justiça de São Paulo, conselheira do Fundo Brasil de Direitos Humanos e faz
parte do Grupo de Estudos e Trabalho “Mulheres Encarceradas”
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