Receita Federal conduz grandes apreensões em
portos brasileiros e, em parceria com a Prefeitura de São Paulo, no comércio da
cidade; empresas combatem a pirataria através do licenciamento de marcas e
personagens
Uma série de operações
da Receita Federal, em parceria com a Prefeitura Municipal de São Paulo, vem
apreendendo, desde agosto, uma enorme quantidade de produtos pirateados na
capital paulistana, e em portos das regiões sul e sudeste do Brasil – Itaguaí,
no Rio de Janeiro; Paranaguá, no Paraná; e Santos, em São Paulo. As ações
interceptaram um total de mais de 150 contêineres, grande parte deles vindos da
China e de países do sudeste asiático.
Entre os itens
apreendidos estavam mais de 8 toneladas de produtos da personagem Ladybug, da
popular série de animação nipo-franco-coreana “Miraculous – As Aventuras de Ladybug”,
como brinquedos, maquiagens e roupas.
Casos como esse
acontecem com indesejável recorrência e servem como indicadores da dimensão da
pirataria no Brasil. Apenas em 2016, a pirataria e o contrabando causaram
prejuízos na ordem de R$ 130 bilhões para o País, segundo levantamento do Fórum
Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade (FNCP).
Além disso, uma
pesquisa realizada em 2015 pelo Ibope, por encomenda da Confederação Nacional
da Indústria (CNI), revelou que 71% dos brasileiros adquirem produtos piratas e
imitações de marcas famosas, dado que destaca a aceitação do crime de pirataria
por parte da sociedade.
Para Marici Ferreira,
presidente da Associação Brasileira de Licenciamento (ABRAL), instituição sem
fins lucrativos que defende a legalidade do mercado e desenvolve campanhas de
conscientização acerca do tema, essa sensação de normalidade é fruto da falta
de entendimento das consequências que envolvem a prática do crime, sejam
socioeconômicas, éticas ou até mesmo ambientais. “Quando a sociedade em massa
decide normalizar e apoiar o crime organizado ao consumir conscientemente um
produto pirata, ela passa a viver num eterno contrassenso moral”, comenta.
Sabrina Freitas,
gerente de novos negócios e licenciamento do Gloob, empresa detentora dos direitos
da Ladybug no Brasil, alerta para os problemas que acompanham os produtos
pirateados: “O Gloob se preocupa em desenvolver produtos de qualidade, seguros,
esteticamente atrativos e alinhados com o posicionamento de cada uma de suas
marcas. Em contraponto, os produtos piratas, com uma produção de baixa
qualidade e sem nenhum tipo de controle, levam ao mercado itens mal executados
e, muitas vezes, com erros grosseiros em relação à narrativa e à estética dos
programas”.
Ainda mais grave é o
risco para a saúde do consumidor, especialmente em relação aos itens voltados
ao público infantil. “Muitas vezes, são produtos revestidos com tintas que
contêm metais pesados e cancerígenos, como cádmio, chumbo e mercúrio, peças e
cabelos que se soltam com facilidade, plástico de má procedência, além de
ignorarem qualquer critério de qualidade e não possuírem nenhum tipo de
certificação do Inmetro. É inquestionável o perigo que a pirataria representa
para as crianças. E, para nós, a qualidade e a segurança dos produtos são a
maior preocupação”, salienta Sabrina.
Armas para o combate
De acordo com o Dr.
Márcio Costa de M. e Gonçalves, diretor adjunto da CIESP/FIESP, sócio do
Escritório Siqueira Castro Advogados, Presidente do Instituto do Capital
Intelectual (ICI) e diretor jurídico da ABRAL, a melhor forma de combate à
pirataria passa pela integração entre políticas punitivas mais rígidas e a
conscientização da sociedade.
“Deve haver um
equilíbrio entre repressão e educação. O consumidor precisa ser advertido que,
por trás desses produtos, estão organizações criminosas que também atuam com
drogas, armas e munições”, ele afirma. “Então, é preciso saber que, ao buscar
esse tipo de comércio, o cidadão está contribuindo para o aumento da violência,
a diminuição na arrecadação de impostos e a falta de empregos”.
Considerado pela
Interpol o delito do século 21, a pirataria ainda é amplamente difundida do
Brasil, entretanto, Gonçalves acredita em uma mudança nesse estado de coisas.
“As recentes ações da Receita Federal e da Prefeitura de São Paulo, em pontos
emblemáticos de venda destes ilegais produtos, estão trabalhando com
inteligência ao cruzar informações entre as apreensões nos portos e as redes de
lojas que levam esses produtos para o consumidor. Há algumas semanas, também
vimos o fechamento do Shopping 25 de Março, tradicional polo de mercadorias
pirateadas de São Paulo”, observa.
O advogado ressalta
que comprar mercadoria falsificada também pode ser considerado crime de
receptação, e poderia levar o consumidor à prisão, mas que o melhor caminho é
apostar em conscientização para reverter a cultura de aceitação da prática. “Temos
que bater forte nos importadores, fabricantes e distribuidores de produtos
piratas, em uma guerra sem tréguas”, arremata Márcio Gonçalves.
O caminho legal
Diversos exemplos
provam que a alternativa legal é o melhor caminho a se seguir. Um deles é a
Sulamericana Fantasias, líder no mercado interno de fantasias e acessórios.
Dona de uma história que já ultrapassa 21 anos, a empresa comercializa produtos
licenciados e de qualidade comprovada pelas certificações Inmetro, ISO 9001 e
ABVTEX.
O presidente Kiko
Smitas lembra que até meados dos anos 1990 a Sulamericana trabalhava com
importações, mas logo identificou um mercado com potencial para fabricar suas
próprias peças. Aproveitando sua experiência prévia na indústria de confecção,
ele apostou na força dos produtos exclusivos para investir em contratos de
licenciamento de marcas como Warner, Mattel, Cartoon Network, Nickelodeon,
Sanrio e Globo Marcas.
Com o tempo, o número
de licenças e a linha de produtos aumentaram, assim como o retorno financeiro
dos investimentos feitos pela empresa, que buscou espaço em diversos canais de
distribuição, como lojas de fantasias, de brinquedos e de artigos para festas,
lojas de roupas e e-commerces.
“O licenciamento
sempre esteve em nosso radar, pois desde o início tínhamos a ideia de agregar
valor aos nossos produtos com a notoriedade dos personagens e marcas. Esse
diferencial é muito importante para nossa atividade”, observa o empresário, que
acredita que a pirataria é um problema que deve ser combatido em todas as
esferas da sociedade, do poder público e das marcas até o consumidor.