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“A estrutura atual do Imposto de Renda sobre títulos públicos e privados no Brasil foge a qualquer lógica ou a padrão observado em outros países”
Uma anomalia na nossa tributação dos juros -
É curioso observar que, no Brasil, as pessoas pagam Imposto de Renda sobre os
juros recebidos do Tesouro Direto e de outros títulos públicos, mas estão
isentas do tributo quando esses juros são pagos pela maioria dos títulos
emitidos por empresas privadas (CRA, CRI, LCA, LCI, debêntures incentivadas,
outros).
Internacionalmente, esse padrão é raro.
Normalmente, tanto títulos públicos como títulos privados ficam sujeitos ao IR,
seja na fonte seja na declaração anual. Muitos países tributam juros somente
dos títulos privados, deixando os papéis públicos isentos do imposto.
A lógica da isenção dos títulos públicos -
O fundamento da isenção dos juros da dívida pública está no fato de que, sem o
imposto, o Tesouro consegue vender seus títulos oferecendo taxas de juros menores
que as pagas pelos títulos privados, desde que estes estejam sujeitos à
tributação.
Menor taxa de juros significa menor custo para o orçamento fiscal. Naturalmente, há um diferencial de risco, que já justificaria taxas de juros mais baixas para
títulos públicos, mas esse é um tema à parte.
Imposto de Renda e o "bolsos" do Tesouro -
Quando há incidência de IR sobre títulos públicos, como no Brasil, o Tesouro tem
como despesa financeira o valor dos juros brutos, naturalmente aumentados no
mercado pelo montante do IR, mas recebe de volta, como receita tributária, o IR
cobrado sobre os mesmos juros. Em termos práticos, o IR sobre títulos públicos
entra por um bolso do Tesouro, como receita, e sai por outro, como gasto com
juros.
Portanto, do ponto de vista fiscal, tributar ou não
tributar juros de títulos públicos seria indiferente: o imposto aumentaria a
taxa de juros bruta exigida pelos investidores e elevaria a carga tributária,
mas como a arrecadação e a despesa pública com juros aumentariam pelo mesmo valor,
não havendo impacto sobre o resultado fiscal (superávit ou déficit fiscal).
Particularidades do caso brasileiro -
No âmbito federal brasileiro, essa neutralidade não se confirma. Isso porque,
de cada R$ 100 arrecadados com IR pelo Tesouro Nacional, R$ 50 são
obrigatoriamente transferidos para os governos estaduais e municipais.
Assim, se o governo federal, com anuência do
parlamento, deseja obter receita adicional de IR no valor de R$ 1 para fazer
face a suas despesas, precisa aumentar o IR em R$ 2, já que metade do valor
arrecadado será entregue a outros governos.
Diante disso, para o tesouro federal seria
vantajoso isentar de IR os juros pagos pelo Tesouro Direto - desde que a taxa
bruta de juros diminua proporcionalmente.
Conclusão - Como vemos, a estrutura
atual do Imposto de Renda sobre títulos públicos e privados no Brasil foge a
qualquer lógica ou a padrão observado em outros países. Distorce as taxas de
juros de mercado, viola princípios de isonomia e justiça fiscal, cria
incentivos perversos no federalismo fiscal e introduz complexidade
desnecessária. Faz-se necessário rever o tratamento dos juros sob o IR.
Isaias Coelho - Pesquisador sênior do NEF da FGV Direito SP e membro do Caeft da ACSP
Fonte: https://www.dcomercio.com.br/publicacao/s/ir-ou-nao-ir-a-tributacao-dos-juros-no-brasil
**As opiniões expressas em artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores e não coincidem, necessariamente, com as do Diário do Comércio

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