Em camundongos, a microglia, que compõe um dos grupos mais abundantes de células do cérebro, se mostrou capaz de limitar a perda de neurônios e da capacidade motora.
Pesquisadores do
Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP)
identificaram um possível protetor contra os sintomas da doença de Parkinson.
Em camundongos, foi observado que a microglia, um conjunto de células
imunológicas do sistema nervoso integrantes da glia (as células mais abundantes
do cérebro, junto com os neurônios), pode limitar a perda de neurônios e da
capacidade motora.
Todos os testes
foram conduzidos em animais que receberam 6-hidroxidopamina, uma toxina
indutora de sintomas semelhantes aos da doença de Parkinson, aplicada
diretamente no cérebro. No entanto, um grupo teve a microglia praticamente
eliminada por uma substância, chamada PLX5622, e outro grupo não. O grupo que
manteve essas células registrou perdas menos significativas de neurônios e de
movimento quando comparado ao grupo em que elas foram eliminadas.
“Esses
resultados sugerem um possível alvo para o tratamento da doença no futuro,
quando descobrirmos mecanismos para ativar a microglia de maneira
benéfica", afirma a pesquisadora Carolina Parga, primeira autora da
pesquisa, conduzida como sua tese de doutorado.
Relatada na
revista Journal of Neuroimmunology, do grupo Science
Direct, a descoberta contradiz o que os próprios pesquisadores do
Instituto e outros estudiosos da área haviam visto anteriormente sobre essas
células. Até então acreditava-se o contrário, pois quando elas eram bloqueadas
por fármacos, os sintomas do Parkinson eram mitigados.
“A hipótese mais
provável para explicar essa diferença nos resultados é a atuação dos dois
fenótipos [características produzidas pelo gene e pelo ambiente físico, químico
e biológico] da microglia, algo já identificado anteriormente na literatura
científica. Uma característica, a positiva, que protege contra a perda
neuronal, talvez se manifeste no início da doença, e a outra característica, a
negativa, que impulsiona essa perda neuronal, vai predominando à medida que a
doença vai evoluindo – o mesmo pode ocorrer em outras doenças
neurodegenerativas como o Alzheimer e algumas formas de epilepsia”, detalha
Luiz Roberto Giorgetti de Britto, coordenador do estudo pelo
Laboratório de Neurobiologia Celular e professor do Departamento de Fisiologia
e Biofísica do ICB-USP.
“Isso reforça a
importância de desenvolvermos formas de diagnósticos mais assertivas para as
doenças neurodegenerativas, para assim chegarmos a soluções terapêuticas. Pois
trata-se de doenças que podem estar ativas, e sendo protegidas pela microglia e
outros mecanismos durante décadas antes do diagnóstico, que em geral se dá só
após a manifestação de sintomas", complementa.
Parte da
pesquisa foi conduzida na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, onde
Carolina Parga realizou um intercâmbio durante seu doutorado, por meio do
programa Bolsa Estágio de Pesquisa no Exterior (BEPE), da FAPESP. Além da
FAPESP, os pesquisadores do ICB-USP contaram com apoio do CNPq e da CAPES para
a realização da pesquisa.
Mudanças
genéticas - No estudo também foram identificados
dois genes que podem estar relacionados à doença de Parkinson. Esses genes
apresentavam menor expressão apenas nos grupos em que as microglias foram
eliminadas. “São dois genes relacionados à transmissão por dopamina [substância
que influencia nossas emoções, aprendizado e locomoção, além de outras funções]
entre alguns grupos de neurônios do sistema nervoso, o que sugere que a
microglia pode ser responsável pela modulação da expressão de genes que atuam
nesses processos. Isso ajuda a explicar como a sua ausência resulta na perda de
neurônios, o que causa a diminuição de dopamina, o fator responsável pelas
alterações motoras”, aponta Parga.
Esse
conhecimento é promissor principalmente para a pequena parcela de casos de
Parkinson e Alzheimer que tem causas genéticas, um total de 5 a 7% dos
diagnósticos. “Conhecendo melhor o comportamento desses genes talvez possamos,
no futuro, antecipar o diagnóstico da doença, além de propor terapias que
consistem na manipulação deles”, afirma Britto.
O Laboratório de
Neurobiologia Celular agora se aprofunda nos resultados obtidos e nas hipóteses
levantadas, e estuda as possíveis implicações da microglia em modelos animais
da doença de Alzheimer.
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