No primeiro trimestre deste ano, pouco mais de 128 mil reclamações de clientes foram feitas ao Procon-SP. ‘Cumprir o que promete’ deve ser o mantra do comércio, diz especialista
Que o e-commerce chegou para
facilitar a vida do consumidor ninguém mais duvida. Afinal, tem gente que
compra até carro sem sair de casa, no modelo clica e retira na loja.
Só que a compra pela internet
também tem dado muita dor de cabeça para quem dá o azar de receber um produto
quebrado ou diferente do adquirido por computador ou celular.
Quem nunca soube de alguém que
adquiriu um sapato ou uma roupa com defeito, não conseguiu trocar, e acabou
deixando por isso mesmo devido ao estresse no processo de troca?
Fátima Merlin, consultora de
varejo e sócia fundadora da Connect Shopper, se encantou com um scarpin
off-white, ofertado por R$ 139,99 pelo Studio Z no Instagram.
Quando abriu o pacote encontrou
uma sandália verde com tirinhas. O processo de troca foi tão confuso e longo
que ela decidiu dar o calçado de presente.
Celso Amâncio, também consultor
de varejo, teve problema semelhante com a compra de um microfone em site da
Casas Bahia.
Até que ele conseguiu trocar o
produto três vezes, usando um pouco de sua influência. Só que em todas elas o
microfone não funcionou. A opção foi largá-lo mesmo no fundo da gaveta.
Somente no Estado de São Paulo,
o Procon-SP registrou em março deste ano 43.545 reclamações de consumidores
referentes ao pós-venda no e-commerce.
Este número é 16% maior do que
o de fevereiro, de 37.415, e 7,6% menor do que o de janeiro (47.175). As
maiores queixas são: entrega de produto errado ou quebrado e atraso na entrega.
No primeiro trimestre deste
ano, o número chega a pouco mais de 128 mil reclamações.
“Com a pandemia, a mudança de
perfil do comércio foi abrupta”, afirma Marcos Pujol, diretor da Escola de
Proteção de Defesa do Consumidor do Procon-SP.
As lojas, diz ele, migraram
para o modelo digital tão rapidamente que não tiveram tempo de montar
infraestrutura capaz de dar conta da alta demanda dos consumidores.
A participação do e-commerce no
faturamento do varejo no país subiu de cerca de 5% no período pré-pandemia para
13%, de acordo com Tiago Baeta, fundador da E-commerce Brasil, empresa mantida
por 100 empresas que atuam no comércio eletrônico.
EM
TRANSIÇÃO
Para Pujol, o comércio
brasileiro está justamente em uma fase de transição, e era esperado um aumento
no número de reclamações de pós-venda no e-commerce.
“A tendência é de acomodação
nos números porque as empresas, provavelmente, estão correndo para dar vazão
aos pedidos, aumentando os investimentos em TI.”
“Há muito o que melhorar, mas
os problemas estão diminuindo. É fato que moradores de cidades pequenas, sem
acesso a produtos, conseguem recebê-los em dois dias”, diz Baeta.
Tudo o que surge para facilitar
a vida do consumidor, de acordo com Pujol, é incorporado pela economia. A
possibilidade de comprar sem sair de casa, portanto, é um movimento sem volta.
Para ele, a tendência é de este
tipo de experiência se massificar e de as lojas se estruturarem. “Se não
fizerem isso, perderão clientes.”
Na última quarta-feira, Celso
Amâncio deu uma consultoria de duas horas para um varejista do setor de
utilidades de São Caetano do Sul que deseja se preparar para vender pela
internet.
“Disse: entrar no e-commerce é
como se jogar em uma correnteza. Se não tiver habilidade, missão muito bem
estruturada e estratégica, honestidade e compromisso, não sobrevive.”
Quando o lojista não entrega o
que promete, um produto no prazo informado, por exemplo, diz Amâncio, ele perde
credibilidade, característica essencial para um negócio.
De acordo com ele, pesquisas
que circulam entre os comerciantes revelam que cerca de 55% dos consumidores
que compram pela internet não ficam satisfeitos e 40% preferem loja física.
São números de chão de lojas de
roupas, calçados eletrodomésticos, magazines, diz ele. No caso de alimentos,
mais de 90% dos clientes ainda preferem compras presenciais.
‘CUMPRA O
QUE PROMETE’
O principal trabalho do
consultor com os lojistas que querem entrar no e-commerce, diz, é a valorização
do cliente. ‘Cumpra o que você promete’ tem de ser o mantra do varejista.
“O maior problema do e-commerce
é que tudo é terceirizado, o que resulta em perda de controle. Quem produz é
uma empresa, quem vende é outra e quem entrega é outra.”
Os grandes varejistas e
markeplaces estão tentando resolver o problema de entrega com a instalação de
depósitos em todo o país.
Muitas plataformas, de acordo
com Amâncio, são apenas intermediárias, emprestam a marca para vender de tudo,
de geladeira a xampu, só que de outras marcas.
“As plataformas não tiveram
tempo de testar as marcas. Imagina quantas milhares de pessoas têm produtos
encostados em casa porque desistiram de procurar seus direitos por cansaço?”.
No segundo semestre do ano
passado, o Procon SP registrou 337 mil reclamações de pós-venda no e-commerce,
das quais 215 mil referentes à Facily, plataforma criada em 2018.
No final de 2021, a empresa
firmou um termo de compromisso com o Procon-SP para solucionar em cinco dias os
problemas dos consumidores prejudicados.
A Facily se comprometeu a
reduzir em 80% o número de reclamações e a criar um fundo de R$ 250 milhões
para reparar danos e melhorar o SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor).
DICAS DO
PROCON SP
A recomendação do Procon SP
para os lojistas que desejam vender pela internet é se preparar para ter uma
estrutura de compra tão hesitosa quanto a de lojas físicas.
Veja os pontos aos quais os
comerciantes precisam prestar atenção, de acordo com o Procon SP:
- Site não pode travar
- Preços precisam estar
atualizados
- Descrição real e detalhada do
produto é essencial
- Produto tem de estar
disponível em estoque
- Prazo de entrega tem de ser
cumprido
- Navegabilidade tem de ser
correta e segura para pagamento
- Ficar atento à LGPD (Lei
Geral de Proteção de Dados Pessoais)
Pujol lembra que o fornecedor
do produto é responsável pela entrega, mesmo que subcontrate outra empresa para
fazer este serviço.
“Vamos supor que o lojista
contrata uma frota de motos para a entrega de mercadorias. As duas empresas, a
dele e a de motos, são responsáveis pelas entregas.”
A qualidade no atendimento, diz
ele, tem de ser a mesma no físico e no digital. “Se a experiência de uma compra
é ruim, certamente o consumidor não volta”.
Para evitar a perda do
consumidor, fora do Brasil, lojas acabam enviando um produto novo para o
cliente em vez de esperar que ele mande o que está com problema para a loja.
É uma forma de deixar o cliente
satisfeito. “O lojista precisa saber quanto custa colocar um cliente dentro da
loja e quanto custa perdê-lo”, diz Amâncio.
De acordo com ele, é muito mais
barato tirar um pudim da prateleira que está com a aparência ruim do que vender
o doce e nunca mais ver a cara do cliente na loja.
https://dcomercio.com.br/publicacao/s/corrigir-falhas-no-pos-venda-do-e-commerce-e-desafio-para-o-varejo
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