Aproveitar o
processo eleitoral para falar sobre democracia com as crianças é uma forma de
construir uma sociedade mais politizada e consciente de seus direitos e deveres
Prefeito, vereadores, urna eletrônica, título de
eleitor. A cada dois anos, a agitação do ciclo eleitoral movimenta o noticiário
e as ruas de cidades por todo o país. Mas, enquanto quem já tem idade para
votar precisa avaliar as opções e escolher seus candidatos, é preciso garantir
que as crianças também não se sintam excluídas do processo, que é o exercício
mais ativo da democracia.
Mas, se os menores de 16 anos não têm direito ao
voto, como é possível fazer com que eles entendam a importância desse
processo? A editora de Geografia da Editora Aprende Brasil, Manoella de
Souza Soares, explica que, segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o
tema das eleições só entra formalmente entre os conteúdos trabalhados a partir
do 4º ano, mas, desde o 1º, o estudante deve ser estimulado a refletir sobre a
comunidade e as regras de convívio. “Esse é um tema que está no cotidiano das
crianças, então não se pode ignorar, é preciso deixar que elas se expressem a
respeito. Já no início do Ensino Fundamental, é importante mostrar a elas o
papel da sociedade como agente ativo das transformações”, relata.
Nas últimas eleições presidenciais, em 2018, o
Sistema de Ensino Aprende Brasil foi além da teoria e organizou, em Governador
Celso Ramos (SC), um pleito fictício. Foi assim que Cauê Marinho, um
cavalo-marinho, acabou sendo candidato a presidente, com o caranguejo Otávio
Crustáceo compondo a chapa como seu vice. Em busca do voto popular, eles
concorreram com o golfinho Gabi Dolphin e seu vice Augusto Vivar, a água-viva,
e a tartaruga Tom Tortuga e sua vice Tati Tainha. Essa foi a forma encontrada
para oferecer às crianças do Ensino Fundamental uma primeira experiência sobre
a democracia e o exercício do voto. “A eleição é uma comoção social, passa na
televisão, às vezes os familiares das crianças estão envolvidos no processo,
então comentar de forma lúdica é uma boa maneira de fazer com que os pequenos
entendam a importância que as eleições têm para a nossa sociedade”, avalia
Manoella.
Ética e vida em sociedade se aprendem na escola
Ainda que os adultos sejam quem precisa lidar de
modo mais direto - ao menos conscientemente - com as consequências do voto, é
fundamental ensinar já na infância como funciona o mecanismo de representação
por esse meio. O doutor em Educação Histórica e professor no Curso Positivo,
Daniel Medeiros, explica que política vem de “polis”, que significa cidade ou
espaço público. "Nesse ambiente, pessoas singulares precisam conviver sem
perder seus direitos e liberdades. E essa convivência não é uma tarefa fácil,
por isso precisa ser praticada desde cedo e a escola é o lugar mais adequado
para esse aprendizado”, argumenta.
Manoella destaca que, ao abordar esse assunto com
os mais novos, deve-se permitir que eles estabeleçam sozinhos conexões entre o
que está sendo debatido na teoria e a prática vivenciada em sua vida cotidiana.
“Deve-se partir do espaço vivido pelo aluno, estimulando para que ele perceba
seu ambiente. Perguntar coisas como ‘quais questões você acha que poderiam
melhorar no seu bairro?’. Assim, ele vai começar a identificar os problemas,
buscar soluções, entender o passo a passo e perceber que ele pode ser um agente
ativo”, afirma.
Segundo a educadora, um pouco mais tarde, mas ainda
no Ensino Fundamental, é a vez de falar sobre como funciona a representação da
vontade popular por meio do voto e, com isso, repassar importantes lições sobre
ética e vida em sociedade. “É hora de explicar para as crianças que aquelas
pessoas foram eleitas e estão lá nos representando. Por isso, é importante não
vender o voto, não trocar, entender as questões éticas envolvidas. Além disso,
podemos explorar as habilidades socioemocionais, explicando que as propostas
têm que ser para o bem coletivo, e não individual, por exemplo. Esses são
valores éticos que estão na Constituição e sobre os quais não podemos esperar
até os 18 anos para começar a falar”, conclui.
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