Trata-se, como se deduz de pesquisas, da indignação
do eleitor em relação às coisas da política – atores, métodos e processos. O
eleitor protesta contra o lamaçal que envolve a esfera política, que parece
indiferente a um clamor social exigindo mudanças de comportamentos e atitudes.
A principal arma que dispõe o eleitor para mudar a política é o voto. Ora, se o
cidadão se recusa a usar esse direito está, de certa forma, contribuindo para a
manutenção do status quo, perpetuando mazelas que infestam o cotidiano da
vida política.
Estamos, portanto, diante de um dilema: caso o NV
assuma proporções grandiosas no pleito deste ano, a hipótese de mudança na
fisionomia política cai por terra, arrastada por ondas da mesmice, onde se
enxergam as abomináveis práticas do fisiologismo (“é dando que se recebe”), o
coronelismo (os currais eleitorais, a política de cabresto), o nepotismo (as
engordas grupais), a estadania (o incremento da dependência social do Estado),
o neo-sindicalismo peleguista (teias sindicais agarradas às mamas do Estado), a
miríade de partidos e seus escopos pasteurizados etc.
A renovação política, bandeira erguida pela
sociedade organizada, corre o risco de fracassar, caso o eleitorado se
distancie do processo eleitoral ou, mesmo comparecendo às urnas, anule o
sufrágio ou vote em branco. É oportuno lembrar que o eleitor é peça fundamental
no jogo de xadrez da política. Se não tentar dar um xeque no protagonista que
busca se eleger, este acabará sendo empurrado para o altar da representação
política por exércitos treinados nas trincheiras dos velhos costumes. Assim, a
renovação nas molduras governativa e parlamentar não ocorrerá.
Aliás, calcula-se que a renovação da representação
no Parlamento seja de apenas 40% este ano, menor do que em pleitos do passado.
A campanha mais curta – de 45 dias nas ruas e de 35 dias na mídia eleitoral –
beneficiará os mais conhecidos e aqueles de maiores recursos financeiros. (No
pleito anterior, a campanha tinha 90 dias de rua e 45 dias de programa
eleitoral no rádio e TV).
O fato é que não se pode contar com mudança
política por unilateral vontade do corpo parlamentar. Deputado ou senador, se
não recebem pressão da base eleitoral, resistem a qualquer ideia de avançar,
alterar, mudar regras que, hoje, os beneficiam. Ou, para usar a expressão mais
popular, não darão um tiro no pé. Por conseguinte, a reformulação da política
carece de participação ativa do eleitor, razão pela qual este deve cobrar de
seus candidatos compromissos com avanços com o fito de eliminar os cancros que
corroem o corpo político.
Em suma, a política não se renova porque não há,
por parte dos representantes, desejo de mudá-la. E não há desejo porque o
eleitor ainda não jogou seu representante no carrossel das transformações. O
pleito de outubro deste ano tende a encerrar a era do grande compadrio na
política. O que não quer necessariamente dizer que isso ocorrerá. Por isso
mesmo, urge despertar a consciência cívica do cidadão. Motivá-lo a colocar
sobre os trilhos o trem das mudanças. Toda a atenção deve se dar à bomba que
ameaça explodir a locomotiva: o Não Voto. Abstenções, votos nulos e brancos, em
demasia, são os ingredientes que podem implodir nosso ainda incipiente sistema
democrático.
Gaudêncio Torquato -
jornalista, é professor titular da USP, consultor político e de comunicação Twitter@gaudtorquato
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