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quinta-feira, 22 de junho de 2017

Os olhos opacos de Gilmar Mendes



Para falar dos últimos acontecimentos envolvendo o ministro Gilmar Mendes, proponho aqui um exercício: imaginarmos o magistrado analisando a própria conduta a partir da sua formação jurídica. Vamos lembrar que, nos anos de 1980, o país vivia uma série de transformações provocadas pelo fim do regime militar, a população pedia eleições diretas nas ruas, Tancredo Neves era eleito indiretamente presidente pelo Congresso Nacional, o vice José Sarney assumia depois do falecimento de Tancredo, e a nova Constituição Federal era elaborada para finalmente concretizar os princípios republicanos e democráticos que orientavam os países europeus desde a Segunda Guerra Mundial.

Todas as transformações certamente estavam ligadas aos desejos de mudança do então jovem Gilmar Mendes, que havia se formado em 1978 na Universidade de Brasília (UnB), fazia seu doutorado na Alemanha nos anos 80 e já ocupava, desde 1984, o cargo de procurador da República. Imaginando que ele próprio fizesse um retrospecto de suas convicções jurídicas e fantasiando que fosse outro o ministro acusado por crime de responsabilidade, Gilmar Mendes certamente exigiria uma postura republicana firme contra ações que afrontassem o bom funcionamento dos poderes do Estado e da Constituição de 1988.

Então, vamos aos fatos: o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles apresentou, na última quarta-feira, dia 14, pedido de impeachment contra o ministro do Supremo Tribunal Federal por crime de responsabilidade praticado.

 O fundamento do pedido é o diálogo desse ministro do Supremo com um senador. A fala, gravada pela Polícia Federal, mostra o parlamentar pedindo para o ministro ligar e orientar um senador a votar no projeto de lei que regula o abuso de autoridade. O magistrado responde que já conversou no mesmo sentido com outros dois senadores. Fonteles afirma contundentemente: “ele [o ministro Gilmar Mendes] não só se apressa a dizer a seu interlocutor que assumira a postura [de conversar com um senador] como que já providenciava contatos com dois outros senadores da República”. Para Fonteles, “isso é um clímax: é a hora histórica de brasileiros e brasileiras passarem o país a limpo”. O ex-procurador-geral conclui dizendo que o ministro está “concreta e objetivamente” desenvolvendo “política partidária”, de forma a caracterizar crime de responsabilidade.

Se fosse Gilmar Mendes a analisar os fatos do ponto de vista estritamente técnico, concordaria com essas declarações e ainda recordaria de algumas passagens nebulosas envolvendo este mesmo ministro do Supremo, que no caso é ele próprio. A primeira: o magistrado é sócio do Instituto de Direito Público. A entidade recebeu mais de R$2 milhões do frigorífico JBS, empresa que tem um modus operandi criminoso no país e fez acordo de delação denunciando o presidente da República. O segundo momento ocorreu quando o ministro fez a (no mínimo) polêmica declaração de que “o cemitério está cheio desses heróis”, direcionada aos membros do Ministério Público que investigavam atos de corrupção em estatais. O terceiro momento veio no julgamento da cassação da chapa do presidente da República, Michel Temer, por abuso de poder econômico e político. A decisão do ministro pela não cassação contrariou todas as provas produzidas, que detalhavam os crimes de abuso cometidos durante o processo eleitoral.

O áudio apresentado pela Polícia Federal apontava provas irrefutáveis de que o magistrado praticou atividades no campo político-partidário que passam ao largo das atividades típicas da sua função. A separação dos poderes e o funcionamento independente e harmônico do Executivo, Legislativo e Judiciário são claras na Constituição Federal e são a base do Estado Democrático de Direito (artigos 1.º e 2.º da Constituição). A sobreposição de ações anula e vicia o correto funcionamento institucional pela quebra básica da organização dos poderes (Título IV da Constituição). Nesse sentido, é inconcebível, no funcionamento regular de uma república, que o magistrado tome decisões políticas como parlamentar.

O impeachment é a medida extrema a ser tomada pelo Congresso Nacional contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (inciso II do artigo 52 da Constituição Federal). É provável que o próprio jovem Gilmar Mendes defenderia que o afastamento definitivo do magistrado pelo crime de responsabilidade cometido é o único caminho possível para recompor a credibilidade do Judiciário. 

Pensaria novamente: são novos tempos que exigem sacrifícios institucionais.

Ao se encarar no espelho, o velho Gilmar Mendes certamente desconheceria o seu passado, sua produção acadêmica e o espírito público que possivelmente já o motivou. Os olhos opacos de Gilmar Mendes deixam suas ações obscuras à luz dos princípios republicanos e democráticos que guiam a Constituição Federal de 1988 no século 21.




Eduardo Faria Silva - coordenador da graduação em Direito e da Pós-Graduação em Direito Constitucional e Democracia da Universidade Positivo (UP).





Cadastro de Adoção terá mais informações de crianças



O Cadastro Nacional de Adoção (CNA) deverá  incluir  informações sobre crianças - cujo acesso será restrito aos pretendentes-, como relatório psicológico e social, fotos e vídeos, com objetivo  de incentivar a ampliação do perfil desejado para adoção.

 As mudanças estão sendo estudadas a partir de sugestões e reclamações de juízes e técnicos das varas de infância em workshops realizados em todas as regiões do país pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O último workshop ocorreu nesta segunda-feira (19) em Belém/PA, “Um debate sobre a proteção integral da infância e da juventude”, para colher sugestões para melhoria do CNA, do Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas (CNCA) e o Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei (CNACL). 

A mediação do debate ficou a cargo da juíza Ana Valéria Santiago, do tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO), integrante do grupo de trabalho instituído pela Corregedoria para modernização dos cadastros da infância.

De acordo com a juíza auxiliar da Corregedoria, Sandra Silvestre Torres, a preocupação da Corregedoria é fazer com que o cadastro permita um processo mais célere e mais transparente, já que havia reclamações quanto a dificuldades de pessoas com relação a entender o que ocorre no processo de adoção; “Não só os juízes e servidores, mas também as pessoas que fazem parte do cadastro se sentem distanciadas e sem informações de acesso”, diz. 

Segundo Sandra Torres, a ideia dos workshops  democratiza o debate. “A construção de um cadastro melhor só é possível com a participação direta das pessoas que atuam na ponta do processo, como juízes, promotores, servidores da Justiça, psicólogos e assistentes sociais que conhecem as principais dificuldades”, disse ela. 

Novas informações e atualização de dados

A proposta de incluir fotos e vídeos de crianças que estão aptas à adoção, especialmente daquelas que não possuem pretendentes disponíveis no cadastro, busca dar a oportunidade para que pretendentes possam conhece-las e pensar na possibilidade de ampliar o perfil desejado. De acordo com o juiz Sérgio Luiz Ribeiro de Souza, da 4ª Vara de Infância, da Juventude e do Idoso da cidade do Rio de Janeiro-  que participa do grupo de trabalho instituído pela Corregedoria para modernização dos cadastros- o objetivo é ampliar as informações sobre o perfil das crianças – cujas sentenças já transitaram em julgado, ou seja, a destituição da guarda dos pais biológicos é definitiva - para que os pretendentes tenham acesso. “Nós já tivemos no Rio muitos casos de adoções que começaram com esses encontros à distância, pessoas que assistiram vídeos e se interessaram por crianças que não estavam dentro do perfil desejado inicialmente”, diz o magistrado. 

Outra necessidade constatada pelos juízes presentes nos debates promovidos pela Corregedoria é a atualização dos dados das crianças e dos pretendentes. De acordo com Paulo Amaral, assessor da Corregedoria, atualmente crianças que já foram adotadas acabam permanecendo no cadastro, bem como aquelas que já completaram 18 anos ou mesmo que faleceram. 

“Uma das grandes reclamações é a desatualização dos dados para contato dos pretendentes, vamos permitir na nova versão que os pretendentes informem mais de um endereço e quantos contatos forem possíveis”, disse Amaral. 
O relatório psicológico e social da criança também deverá estar presente no cadastro, porém está em discussão ainda se os pretendentes terão acesso a estes documentos. O novo cadastro deverá incluir ainda o CPF da criança, se frequenta a escola, se já esteve acolhida anteriormente, bem como dados de antecedentes criminais dos pretendentes. Na descrição das doenças, deverá ser incluída a microcefalia e o detalhamento de deficiências físicas e mentais. 

Unificação dos cadastros

Dentre as sugestões de mudança que foram aprovadas até agora em três workshops realizados – além de Belém, este ano ocorreram eventos no Rio de Janeiro/RJ e em Maceió/AL, está a unificação dos cadastros de adoção e de crianças em situação de acolhimento, que hoje são separados. 

De acordo com o assessor da Corregedoria Paulo Márcio do Amaral, a intenção é utilizar o mesmo banco de dados para os dois cadastros, facilitando a interoperabilidade. “Quando a criança acolhida se tornar apta à adoção, basta assinalar essa informação ao lado de seu nome e já teríamos disponível toda a informação sobre essa criança”, disse ele. 

Busca por aproximação

A nova versão do cadastro de adoção deverá permitir que o sistema faça uma varredura automática diária por pretendentes e crianças, e reportem essa busca ao magistrado e aos pretendentes por e-mail ou malote digital. 

De acordo com Paulo, uma novidade que deve auxiliar nos processos de adoção é a pesquisa por aproximação, ou seja, o sistema vai ser responsável por simular perfis por aproximação e sugerir ao pretendente. Se a pessoa, por exemplo, busca uma criança de até seis anos e há uma de sete anos disponível, o sistema vai informar, bem como se busca até dois irmãos e existem três para adoção que estão próximos da idade desejada. 

Outra Sugestão é que o cadastro permita a inclusão de crianças que estão com suspensão do poder familiar por meio de uma decisão liminar, com sentença pela destituição da guarda, ou com o trânsito em julgado – o momento da inclusão da criança no cadastro ficaria a critério do juiz. O usuário poderá optar por conhecer somente crianças cujo processo já transitou em julgado, por exemplo. 

Assista  declaração do Corregedor Nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, sobre o Cadastro Nacional de Adoção.




Luiza Fariello
Agência CNJ de Notícias



Juízes federais debatem o Brasil pela Paz no sistema carcerário



Magistrados representantes dos grupos de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMFs) no âmbito dos Tribunais Regionais Federais (TRFs) foram informados sobre o programa Brasil pela Paz, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Idealizado pela presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, o programa é composto de ações sistematizadas voltadas para melhoria do sistema penitenciário brasileiro. 

O encontro, ocorrido nesta quarta-feira (21/6), na sede do CNJ,  também permitiu que os juízes relatassem aos membros do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Medidas Socioeducativas do CNJ (DMF) as preocupações e dificuldades que vêm enfrentando na área da execução penal. 

Os representantes dos GMFs citaram, dentre outros pontos, a falta de controle adequado do Poder Judiciário sobre os sentenciados, principalmente aqueles que não estão sob custódia direta do Estado (presos cumprindo penas alternativas); falta de convênios e parcerias que permitam prestações de serviço comunitário; informações processuais desatualizadas e dificuldade no controle das facções criminosas, que dominam as prisões brasileiras. Também foram elencadas dificuldades tradicionais, como falta de medicamentos e assistência médica precária para os presos. 

A diretora do DMF, juíza auxiliar da presidência do CNJ, Maria de Fátima Alves da Silva, afirmou que irá listar e catalogar os problemas apresentados pelos magistrados e os encaminhará à própria ministra Cármen Lúcia, “que está cuidando dessa questão de maneira muito atenta e zelosa”. Maria de Fátima disse que a crise no sistema penitenciário é um fato. “Seja na falta de estrutura física e de pessoal, seja em relação à entrada das facções nos presídios, temos muitos problemas e deficiências que forçam nossos juízes a buscarem saídas. Mas, precisamos ter informações precisas para as ações sejam consistentes e as saídas, justas. Essa é a nossa intenção”, afirmou, durante apresentação do projeto Brasil pela Paz. 

Dentre as ações do programa, está o aprimoramento da base de dados relativos aos presos e ao cumprimento de suas penas. Concebido a partir da reformulação do Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP), atualmente em processo de aprimoramento para permitir a integração de dados de todos os tribunais via webservice,  o  Cadastro Nacional de Presos permitirá que o Poder Judiciário tenha conhecimento e controle sobre todos os sentenciados no país.    
“A reformulação do Banco permitirá conferir consistência aos dados. Quem acessar o banco saberá de que cidade é aquele preso, onde ele está cumprindo pena, e toda a situação processual do caso. Se receber um alvará de soltura, por exemplo, essa informação constará do sistema e terá de ser repassada para o tribunal de origem, para que a vítima ou familiares da vítima e do preso, tomem conhecimento de seu paradeiro”, disse o secretário-geral da presidência do CNJ, juiz auxiliar Júlio Ferreira de Andrade. 




Outra ação pertencente ao Programa Brasil pela Paz diz respeito ao cuidado com as vítimas jovens e crianças. O juiz auxiliar da presidência, à frente do trabalho do DMF em relação à infância e juventude, Alexandre Takashima, citou a criação da Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (APACs) dedicadas a jovens infratores de ambos os sexos como exemplo de um trabalho com índice de reincidência baixíssimo e lembrou que o CNJ vem contribuindo para que os Tribunais se adequem à lei 13.431/2017, que torna lei salas especiais para coleta de depoimento de crianças, vítimas de violência. 

Ainda na área de proteção e atenção à vítima, estão sendo pensadas ações que possibilitem a vítimas e seus familiares acesso à equipe multidisciplinar dos tribunais. O programa Brasil pela Paz ainda está sendo delineado, mas algumas das ações já devem estar prontas até agosto desse ano. É o caso do BNMP e do Cadastro Nacional de Presos. As APACs juvenis deverão estar em funcionamento em abril de 2018. As duas cidades que receberão o projeto-piloto são: Itaúna/MG e Fortaleza/CE. 

Compareceram ao encontro os magistrados José Eduardo Nobre da Matta e Débora Valle de Brito, do TRF da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo), Alessandro Diaféria, do TRF da 3ª Região (SP, MS), Cláudia Cristofani, do TRF da 4ª Região (RS, SC, PR) e Ney de Barros Bello Filho, do TRF da 1ª Região, que tem sob sua jurisdição o Distrito Federal e os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins.

Do CNJ, além do secretário-geral, Júlio de Andrade, a diretora do DMF, Maria de Fátima, e o juiz Alexandre Takashima, participaram o juiz Marcelo Mesquita Silva, da área da Tecnologia da Informação, e o chefe de gabinete do DMF, Renato de Vitto.   




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