A revolução
tecnológica transformou drasticamente a vida de todos. Alterou não apenas as
formas de produção, como o modo de comunicação e convívio social, entre outros.
Mesmo após o dramático episódio da Pandemia, o Brasil ainda não possui
políticas públicas para incluir a população idosa que vive à margem da era
digital.
Muitos são os
documentos que mencionam a importância da inclusão da pessoa idosa, como o
Estatuto do Idoso, que prevê no Art. 21. que “o Poder Público criará
oportunidades de acesso do idoso à educação, adequando currículos, metodologias
e material didático aos programas educacionais a ele destinados” ou “Envelhecimento
Ativo: um marco político em resposta à revolução da longevidade” (2015),
que indica “a promoção da inclusão digital por meio do acesso à Internet e
do treinamento como uma forma de facilitar a participação de pessoas que foram
excluídas da vida cívica”. No entanto, a inclusão digital da pessoa idosa
ainda está limitada a pequenas ações pontuais como oficinas específicas em
centros culturais ou espaços abertos para o público em geral, como os
Telecentros.
De fato, essas
estratégias estão longe de garantir o direito ao acesso às tecnologias de
informação e comunicação, uma vez que não se dedicam especificamente ao
processo de ensino-aprendizagem voltado à pessoa idosa e, nem tão pouco, à
alfabetização e letramento digital. Atuam na resolução de problemas ou em
situações específicas para o interessado, sem a preocupação em explicar como
solucioná-lo, mas fazendo por ele.
O acesso à
informação é uma das bases da democracia. Estar excluído digitalmente, em pleno
no século XXI, é estar excluído da sociedade. Nesse contexto, torna-se
imprescindível uma mudança e o governo sabe disso. É fundamental que políticas
sejam criadas e se adaptem às necessidades das pessoas idosas, em constante
mudança, com projetos que incluam a sociedade em geral.
Algumas
iniciativas que desempenham um papel importante na promoção da inclusão digital
da pessoa idosa, oferecendo capacitação, na tentativa de diminuir a lacuna
digital, são as criadas a partir de parcerias entre instituições sem fins
lucrativos, governo e empresas. Para superar muitos desafios nesta área é
necessário um esforço conjunto. O Fundo Municipal do Idoso – FMDI -possibilita
o financiamento de projetos para assegurar os direitos da pessoa idosa, com
recursos de empresas que podem ser deduzidos do Imposto de Renda.
O FMID tem
ajudado nas iniciativas de inclusão digital dos 60+, que necessitam de
investimentos em equipamentos e em profissionais qualificados e aptos ao
trabalho com alunos mais velhos, que entendam que o processo de
ensino-aprendizagem nessa faixa etária é diferente. Além disso, é necessário um
ambiente adequado, iluminado, acessível, facilitador e amigável, de preferência,
com oportunidades de convívio intergeracional.
A Casa Ondina
Lobo -- instituição sem fins lucrativos, que ao longo de seus 73 anos atende
idosos em situação de vulnerabilidade social -- se empenhou para atingir esses
propósitos em seu projeto Comunicação em Movimento (aprovado pelo FMID e em
fase de captação de recursos). Entende que atuar dentro do território do aluno,
permite maior adesão e engajamento para o letramento, além de oferecer cursos
de capacitação para os profissionais interessados em trabalhar com o tema. Com
formato absolutamente inovador, o Comunicação em Movimento inclui um ônibus
itinerante, devidamente equipado tecnologicamente, que será a sede de aulas de
inclusão digital para pessoas 60+ em bairros de vulnerabilidade social da cidade
de São Paulo. Também faz parte da iniciativa a formação de gestores de
Instituições de Longa Permanência para Idosos – ILPIs, para que promovam esse
mesmo aprendizado aos idosos residentes de suas instituições.
Permitir novas modalidades educacionais para o letramento digital
dentro de um modelo itinerante de ensino-aprendizagem em territórios
vulneráveis, como o apresentado pela Casa Ondina Lobo e chancelado pelo FMID e
pelo Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa Idosa (CMI), potencializa a
democratização do conhecimento e promove protagonismo da pessoa idosa. Favorece
o combate aos estereótipos e preconceitos relacionados à idade, incentiva a
participação ativa dos idosos na era digital.
Para reforçar a importância de programas como esse, a pesquisa Observatório Febraban-IPESPE
aponta que os aspectos que mais contribuíram com a inclusão digital dos mais
velhos (24% dos idosos) foram os cursos e treinamentos voltados para esse
público. É preciso expô-los a essa nova
linguagem. A idade não é empecilho para o aprendizado. As pessoas mais
velhas, ou aquelas que não tiveram a oportunidade de aprender essa nova forma
de viver, perdem a autonomia em relação a grande quantidade de opções que temos
hoje (em qualquer situação), deixam de participar e de sentirem-se pertencentes
a essa era, podendo provocar inúmeros conflitos internos e externos, inclusive
problemas de saúde.
São
inúmeros os estudos dos resultados, impactos e os efeitos de Programas de
Inclusão Digital na Performance Cognitiva de pessoas idosas, inclusive
desenvolvidos pela USP – Universidade de São Paulo, que observam o uso da
tecnologia e seus benefícios à vida psíquica, física e social das pessoas
idosas, a partir das interações sociais, praticidade em tarefas e atividades
cotidianas. A literatura científica, nacional e
internacional, têm publicado iniciativas com os resultados
positivos na prevenção de possíveis doenças, como a depressão.
Esse tipo de
iniciativa de fato, não beneficia apenas o aprendente, mas todo o seu entorno e
contexto familiar. O letramento digital e a educação midiática promovem maior
autonomia e independência, o que libera a família de muitos afazeres.
Outro aspecto
importante também precisa ser observado. Conforme a Pesquisa Nacional Por
Amostra em Domicílio - PNAD Contínua, quase 60% de pessoas idosas acessam a
internet, um aumento de 12,7% de 2019 para 2021. No entanto, ter acesso ou
possuir um equipamento/dispositivo não significa ser letrado ou usar a
tecnologia de modo crítico. O PNAD mensura se houve acesso pelo participante da
pesquisa e o que foi acessado, mas não indica como foi esse acesso ou se foi
realizado de forma segura e consciente.
A evolução tem
ocorrido em partes - tecnicamente existe mais oferta de acesso, porém vivemos
em uma bolha tecnológica. As pessoas que mais têm acesso digital são ainda as
mais estudadas e com melhor situação socioeconômica. Fora da bolha, mesmo aqui
na cidade de São Paulo, nos territórios mais distantes do centro, encontramos
pessoas idosas que não têm celular ou que não sabem utilizá-lo.
Por todos esses
motivos, é importante que empresas fiquem atentas aos melhores projetos do
FMID. E, até Dezembro deste ano (só até dezembro), quando acontece o período de
direcionamento do Imposto de Renda para utilização em Fundos Públicos, elas
poderão selecionar um desses projetos.
Investir em
programas para pessoas idosas é uma necessidade crescente, e as empresas desempenham
um papel significativo para ajudar a atender a essa demanda social, que
promoverá um grande impacto na comunidade. Dessa forma, as empresas
demonstram um compromisso com a Responsabilidade Social, o que fortalece a sua
imagem, mostra sua preocupação com questões sociais e com o bem-estar da
comunidade, além de alavancar a sua marca junto aos consumidores, funcionários
e investidores.
Meire Cachioni – Profa.
Associada da Universidade de São Paulo -- USP; Vice coordenadora do Programa de
Pós-Graduação em Gerontologia da USP; Coordenadora do Programa USP 60+ EACH
USP; Doutora em Gerontologia na Faculdade de Educação - Unicamp; Pós-doutora em
Gerontologia, Universidade do Porto, Portugal.