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segunda-feira, 23 de outubro de 2023

NATUREZA JURÍDICA DA EMPRESA INDIVIDUAL

Introdução

 

           No cenário jurídico brasileiro, a definição da responsabilidade do empresário individual perante dívidas é um tema frequentemente debatido. Enquanto as sociedades empresárias, devidamente registradas na junta comercial, possuem personalidade jurídica distinta, conferindo vantagens relacionadas à limitação de responsabilidade dos sócios, o empresário individual se destaca por sua singularidade. Neste artigo, discutiremos a responsabilidade do empresário individual perante dívidas, considerando as implicações práticas na recuperação de crédito.


 

A Personalidade Jurídica das Empresas

 

Há de se notar que muito se fala sobre a definição jurídica do empresário individual, como é cediço, uma sociedade empresária, constituída e devidamente registrada na junta comercial, adquire personalidade jurídica, uma das vantagens em constituir e registar uma empresa é a responsabilidade da empresa x sócios, onde a empresa se torna a titular de direitos e deveres perante terceiros.

Neste ponto, trazendo essa informação para o campo pratico da recuperação de crédito, em caso de dívida constituída e não paga pela empresa, verifica-se não ser possível, em um primeiro momento, o redirecionamento da cobrança para os sócios, somente o seu prosseguimento em face da empresa. Ademais, importante ressaltar que as regras acima se aplicam para a Empresa Eireli, bem como para a Sociedade Unipessoal de Responsabilidade Limitada.

 

Assim, feitas as considerações acima sobre as modalidades mais comuns de empresas com responsabilidade limitada, passaremos a discorrer sobre o empresário individual e suas responsabilidades em relação a dívidas constituídas.

 

 

O Empresário Individual e sua Responsabilidade

 

De acordo com o sistema jurídico pátrio a empresa individual é uma ficção criada apenas para fins tributários, quando o empresário individual faz sua inscrição e adquire um CNPJ, isso se reflete apenas em questões tributarias, ou seja, não há nenhum reflexo no limite de responsabilidade pelo pagamento de dívidas, que continua sendo da pessoa física, independente da obrigação ter sido assumida no CNPJ ou no CPF.


Desta forma, a empresa individual tem a natureza de pessoal natural, logo o patrimônio da pessoa física se confunde com o patrimônio da “empresa”, sendo o empresário responsável pela totalidade da dívida adquirida no CNPJ, inclusive é parte legítima para integrar a relação processual no polo passivo, mesmo que não tenha sido avalista ou fiador da operação, tendo em vista que não há personalidade jurídica autônoma, diferente seria se fosse uma Eireli, uma Sociedade Empresária ou uma Unipessoal de Responsabilidade Limitada, nestes casos, existe a personalidade jurídica distinta dos sócios, e consequentemente o limite da responsabilidade das obrigações assumidas no CNPJ da empresa.

 

 

Jurisprudência e Doutrina

 

A jurisprudência e a Doutrina corroboram com esse entendimento, como destacado pelo ilustre professor Rubens Requião:                                                

 

“O empresário individual, é a própria pessoa física ou natural, respondendo os seus bens pelas obrigações que assumiu, quer sejam civis, quer comerciais. A transformação de firma individual em pessoa jurídica é uma ficção do direito tributário, somente para o efeito do imposto de renda". (Curso de Direito Comercial - v. 1 - Saraiva p. 76).

 

Esse entendimento é reforçado por Fabio Ulhoa Coelho, conforme podemos constatar logo abaixo:

 

 “O empresário individual, ao providenciar os registros obrigatórios por lei, não está constituindo um novo sujeito de direito, com autonomia jurídica, mas simplesmente regularizando a exploração de uma atividade econômica. Há uma grande confusão conceitual nesse campo, principalmente porque, sob a perspectiva do direito tributário, muitas vezes encontram-se sob o mesmo regime de obrigações instrumentais o empresário individual e algumas sociedades. É necessário, contudo, ressaltar que a firma individual não é sujeito de direito, mas categoria de nome empresarial. O sujeito isto é, o credor, devedor, contratante, demandante, demandado, falido, concordatário etc. será sempre a pessoa física do empresário individual, identificado pela firma que levou a registro. ”

 

[...]

 

“O empresário pode ser pessoa física ou jurídica. No primeiro caso, denomina-se empresário individual; no segundo, sociedade empresária”. (Manual de Direito Comercial. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 19).

 

Seguindo esse mesmo entendimento temos ampla jurisprudência tratando do assunto, inclusive do STJ, conforme podemos constatar nos julgados abaixo transcritos:

 

"...a empresa individual é mera ficção jurídica, criada para habilitar a pessoa natural a praticar atos de comércio, com vantagens do ponto de vista fiscal. Assim, o patrimônio de uma empresa individual se confunde com o de seu sócio, de modo que não há ilegitimidade ativa na cobrança, pela pessoa física, de dívida contraída por terceiro perante a pessoa jurídica" (REsp. n°487.995/AP, Rel. Ministra Nancy Andrighi).

 

 “Tratando-se de firma individual há identificação entre empresa e pessoa física, posto não constituir pessoa jurídica, não existindo distinção para efeito de responsabilidade entre a empresa e seu único sócio” (STJ, RESp nº 227.393/PR, 1ª Turma, Rel.Min. Garcia Vieira, destacamos).

 

 “Legitimidade 'ad causam' Ação monitória Cheque emitido para pessoa jurídica, mas cobrada pela pessoa física Firma individual Firma individual que se confunde com a pessoa física Ficção jurídica para possibilitar à pessoa física os atos do comércio Crédito que pode ser buscado tanto pela pessoa física quanto pela jurídica ante a sua unicidade” (TJSP, Agravo Inst. 7.153.106-3, 14ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Melo Colombi, destacamos).

 

Na área de recuperação de crédito é comum encontrarmos contratos bancários firmados por empresário individual como se fosse firmado por uma empresa com responsabilidade limitada, inclusive com assinatura do (empresário) pessoa física como avalista da operação. Fato este que se torna desnecessário quando se trata de empresário individual sem responsabilidade limitada.


 

     Considerações Finais

 

Em resumo, a responsabilidade patrimonial do empresário individual pelas dívidas adquiridas no CNPJ da empresa é inequívoca, uma vez que a empresa individual é uma ficção legal criada exclusivamente para fins tributários. Portanto, a separação entre pessoa física e jurídica não ocorre, tornando o empresário pessoalmente responsável pelas obrigações assumidas em nome da empresa individual, sendo imprescindível compreender essa distinção fundamental ao lidar com questões de responsabilidade empresarial no âmbito da Recuperação de Crédito.

 

Adriano Fernandes Neto – advogado especialista em Recuperação de Crédito, formado em Direito pela Universidade Nove de Julho, pós-graduado em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas, e Processo Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Gerente Jurídico responsável pela Área de Recuperação de Crédito do Vigna Advogados e Associados.


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