Introdução
No
cenário jurídico brasileiro, a definição da responsabilidade do empresário
individual perante dívidas é um tema frequentemente debatido. Enquanto as
sociedades empresárias, devidamente registradas na junta comercial, possuem
personalidade jurídica distinta, conferindo vantagens relacionadas à limitação
de responsabilidade dos sócios, o empresário individual se destaca por sua
singularidade. Neste artigo, discutiremos a responsabilidade do empresário
individual perante dívidas, considerando as implicações práticas na recuperação
de crédito.
A Personalidade Jurídica das Empresas
Há de se notar
que muito se fala sobre a definição jurídica do empresário individual, como é
cediço, uma sociedade empresária, constituída e devidamente registrada na junta
comercial, adquire personalidade jurídica, uma das vantagens em constituir e
registar uma empresa é a responsabilidade da empresa x sócios, onde a empresa
se torna a titular de direitos e deveres perante terceiros.
Neste ponto,
trazendo essa informação para o campo pratico da recuperação de crédito, em
caso de dívida constituída e não paga pela empresa, verifica-se não ser
possível, em um primeiro momento, o redirecionamento da cobrança para os
sócios, somente o seu prosseguimento em face da empresa. Ademais, importante
ressaltar que as regras acima se aplicam para a Empresa Eireli, bem como para a
Sociedade Unipessoal de Responsabilidade Limitada.
Assim, feitas as
considerações acima sobre as modalidades mais comuns de empresas com
responsabilidade limitada, passaremos a discorrer sobre o empresário individual
e suas responsabilidades em relação a dívidas constituídas.
O Empresário Individual e sua Responsabilidade
De acordo com o
sistema jurídico pátrio a empresa individual é uma ficção criada apenas para
fins tributários, quando o empresário individual faz sua inscrição e adquire um
CNPJ, isso se reflete apenas em questões tributarias, ou seja, não há nenhum
reflexo no limite de responsabilidade pelo pagamento de dívidas, que continua
sendo da pessoa física, independente da obrigação ter sido assumida no CNPJ ou
no CPF.
Desta forma, a
empresa individual tem a natureza de pessoal natural, logo o patrimônio da
pessoa física se confunde com o patrimônio da “empresa”, sendo o empresário
responsável pela totalidade da dívida adquirida no CNPJ, inclusive é parte
legítima para integrar a relação processual no polo passivo, mesmo que não
tenha sido avalista ou fiador da operação, tendo em vista que não há
personalidade jurídica autônoma, diferente seria se fosse uma Eireli, uma
Sociedade Empresária ou uma Unipessoal de Responsabilidade Limitada, nestes
casos, existe a personalidade jurídica distinta dos sócios, e consequentemente
o limite da responsabilidade das obrigações assumidas no CNPJ da empresa.
Jurisprudência e Doutrina
A jurisprudência
e a Doutrina corroboram com esse entendimento, como destacado pelo ilustre
professor Rubens
Requião:
“O empresário
individual, é a própria pessoa física ou natural, respondendo os seus
bens pelas obrigações que assumiu, quer sejam civis, quer comerciais. A
transformação de firma individual em pessoa jurídica é uma ficção do direito
tributário, somente para o efeito do imposto de renda". (Curso de Direito
Comercial - v. 1 - Saraiva p. 76).
Esse
entendimento é reforçado por Fabio Ulhoa Coelho, conforme podemos constatar
logo abaixo:
“O
empresário individual, ao providenciar os registros obrigatórios por lei, não
está constituindo um novo sujeito de direito, com autonomia jurídica, mas
simplesmente regularizando a exploração de uma atividade econômica. Há uma
grande confusão conceitual nesse campo, principalmente porque, sob a
perspectiva do direito tributário, muitas vezes encontram-se sob o mesmo regime
de obrigações instrumentais o empresário individual e algumas sociedades. É
necessário, contudo, ressaltar que a firma individual não é sujeito de direito,
mas categoria de nome empresarial. O sujeito isto é, o credor, devedor,
contratante, demandante, demandado, falido, concordatário etc. será sempre a
pessoa física do empresário individual, identificado pela firma que levou a
registro. ”
[...]
“O empresário
pode ser pessoa física ou jurídica. No primeiro caso, denomina-se empresário
individual; no segundo, sociedade empresária”. (Manual de Direito Comercial. 14
ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 19).
Seguindo esse
mesmo entendimento temos ampla jurisprudência tratando do assunto, inclusive do
STJ, conforme podemos constatar nos julgados abaixo transcritos:
"...a
empresa individual é mera ficção jurídica, criada para habilitar a pessoa
natural a praticar atos de comércio, com vantagens do ponto de vista fiscal.
Assim, o patrimônio de uma empresa individual se confunde com o de seu sócio,
de modo que não há ilegitimidade ativa na cobrança, pela pessoa física, de
dívida contraída por terceiro perante a pessoa jurídica" (REsp.
n°487.995/AP, Rel. Ministra Nancy Andrighi).
“Tratando-se
de firma individual há identificação entre empresa e pessoa física, posto não
constituir pessoa jurídica, não existindo distinção para efeito de
responsabilidade entre a empresa e seu único sócio” (STJ, RESp nº 227.393/PR,
1ª Turma, Rel.Min. Garcia Vieira, destacamos).
“Legitimidade
'ad causam' Ação monitória Cheque emitido para pessoa jurídica, mas cobrada
pela pessoa física Firma individual Firma individual que se confunde com a
pessoa física Ficção jurídica para possibilitar à pessoa física os atos do
comércio Crédito que pode ser buscado tanto pela pessoa física quanto pela
jurídica ante a sua unicidade” (TJSP, Agravo Inst. 7.153.106-3, 14ª Câmara de
Direito Privado, Rel. Des. Melo Colombi, destacamos).
Na área de
recuperação de crédito é comum encontrarmos contratos bancários firmados por
empresário individual como se fosse firmado por uma empresa com
responsabilidade limitada, inclusive com assinatura do (empresário) pessoa
física como avalista da operação. Fato este que se torna desnecessário quando
se trata de empresário individual sem responsabilidade limitada.
Considerações
Finais
Em resumo, a
responsabilidade patrimonial do empresário individual pelas dívidas adquiridas
no CNPJ da empresa é inequívoca, uma vez que a empresa individual é uma ficção
legal criada exclusivamente para fins tributários. Portanto, a separação entre
pessoa física e jurídica não ocorre, tornando o empresário pessoalmente
responsável pelas obrigações assumidas em nome da empresa individual, sendo
imprescindível compreender essa distinção fundamental ao lidar com questões de
responsabilidade empresarial no âmbito da Recuperação de Crédito.
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