‘Impacto da Covid-19 e desmonte de políticas públicas aprofundarão histórica desigualdade racial e de gênero no país’, ressalta especialista da ActionAid
Apesar de a Síntese de Indicadores Sociais (SIS) publicada na
quinta-feira (12/11) pelo IBGE apontar pequena variação no cenário da pobreza e
da extrema pobreza no Brasil entre 2018 e 2019, a ActionAid chama atenção para
o fato de que o nível de pobreza extrema no país segue recorde, afetando 13,7
milhões de brasileiros e brasileiras, majoritariamente mulheres pretas ou
pardas. Segundo o IBGE, enquanto essas mulheres compunham 28,7% da população,
elas eram 39,8% das pessoas em condição de extrema pobreza e 38,1% daquelas em
condição de pobreza. O diagnóstico recém-divulgado ajuda a identificar
condições de vida como renda, acesso a saneamento básico, educação, moradia
adequada, entre outros, reforçando a perspectiva de um grave aprofundamento da
vulnerabilidade social no país durante e pós Covid-19.
"São números que seguem alarmantes, que em hipótese
alguma podem ser naturalizados pela sociedade, e que se tornam ainda mais
relevantes para refletirmos sobre o contexto da pandemia. O desmonte de
políticas públicas, os impactos da Covid-19 especialmente no mercado informal e
a forma trágica como governos vêm lidando com tudo isso aprofundarão ainda mais
a histórica desigualdade racial e de gênero no país", ressalta o economista Francisco Menezes, assessor de
Políticas da ActionAid no Brasil.
Em 2018 e 2019, havia 6,5% da população, ou 13,7 milhões de
pessoas, vivendo na extrema pobreza, com menos de R﹩ 151 por mês para se
manter. Dentre esse contingente, mais da metade eram nordestinos e cerca de 40%
eram mulheres pretas ou pardas. Já em relação à pobreza, a taxa caiu de 25,3%
para 24,7% de pessoas vivendo com menos de R﹩ 436 por mês: mais de 51,7 milhões de pessoas e, dentre
essas, mais de 19 milhões de mulheres pretas ou pardas. Apesar da ligeira queda
na pobreza de forma geral, o percentual está longe do alcançado em 2014, o
melhor ano da série, que registrou 22,8%. Os cálculos foram feitos com base em
parâmetros usados pelo Banco Mundial. O índice de Gini (0,543) caiu em relação
a 2018 (0,545), mas o país é o nono mais desigual do mundo.
Como organização internacional que trabalha há 20 anos no
país por justiça social, igualdade de gênero e pelo fim da pobreza, a ActionAid
segue reforçando seu apelo para que todos os setores da sociedade reflitam
sobre o significado e a consequência desses números na vida de milhões de
pessoas, especialmente de mulheres e crianças, que estão no centro do nosso
trabalho. Ainda de acordo com o IBGE, o arranjo domiciliar formado por mulheres
pretas ou pardas responsáveis, sem cônjuge e com presença de filhos menores de
14 anos concentrou a maior incidência de pobreza: 24% dos moradores desses
arranjos viviam em condição de extrema pobreza e 62,4% viviam em situação de
pobreza. Já entre as crianças com até 14 anos de idade, 11,3% enfrentavam a
extrema pobreza e, 41,7%, a pobreza.
Assim como nos anos anteriores, o diagnóstico publicado pelo
IBGE comprova que apenas a gradual recuperação da economia não é suficiente
para atender as pessoas em condição de pobreza e extrema pobreza, gravemente e
desigualmente mais afetadas pela Covid-19. Para reverter esse cenário e
combater os desastrosos impactos da pandemia, é preciso fortalecer políticas
públicas que se mostraram eficazes, revogar a Emenda Constitucional 95,
refletir seriamente sobre a implementação de uma renda básica permanente e de
um sistema tributário progressivo com mais impostos sobre renda e patrimônio,
além de gerar empregos com dignidade, que garantam condições de cidadania para
todos e todas.
"Nos últimos anos, o Brasil voltou a traçar o caminho
para o Mapa da Fome e vem se distanciando do cumprimento dos 17 Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável da ONU, que são interligados e incluem temas que
vão desde a erradicação da pobreza à justiça climática. É preciso que
diferentes setores da sociedade somem esforços para corrigir essa rota e,
assim, termos alguma chance de cumprir os ODS. É preciso agir para reverter o
cenário e retomar o caminho de superação de tantas mazelas sociais", alerta Menezes.
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