Isolamento muda perspectiva do pai sobre a criação dos filhos
Psicóloga conta
que os chefes de família foram surpreendidos com jornada tripla e lançaram novo
olhar sobre as atividades domésticas . Perfil varia entre os que aproveitaram o
momento e aqueles que desencadearam ansiedade
O Dia dos Pais de 2020 será lembrado sempre como
aquele do ano da pandemia, quando o distanciamento social impôs às famílias uma
convivência intensa. Pais e mães adotaram o modelo de trabalho de home office e
as crianças passaram a ter aulas por meio do ensino à distância (EAD). A
Pesquisa Gestão de Pessoas na Crise Covid-19, elaborada pela Fundação
Instituto de Administração (FIA) com dados de abril, mostrou que 46% das
empresas mantiveram seus funcionários em casa. Embora a mudança de rotina tenha
sido árdua para todos os membros, o papel do homem foi o mais afetado. É no que
acredita a psicóloga que atende no Órion Complex, Soraya Oliveira. Ela conta as
experiências ouvidas em seu consultório sobre o isolamento.
A especialista lembra que, historicamente o homem
assume o papel do provedor da família, aquele que sai de casa cedo e retorna no
fim do dia, enquanto as mulheres sempre assumiram o papel de cuidadoras da
família. Para Soraya essa cultura ainda está muito enraizada no Brasil, e,
mesmo com as sutis mudanças na era moderna, o homem quando se viu em casa
precisando fazer também atividades domésticas e cuidar dos filhos, ele acabou
despertando seu olhar para essas atividades, até então delegadas apenas a elas.
“O pai que já tinha um histórico afetuoso, soube aproveitar esse momento para
reforçar os vínculos e dar aos filhos aquilo que eles eram impedidos de
oferecer por passar o tempo longe, como brincar, ver televisão, jogar um
videogame, ler”, pontua.
Os dados mais recentes do Instituto de
Pesquisa Aplicada (IPEA), que analisa números do IBGE, mostram que os 59%
das casas brasileiras tem o homem como responsável por sustentar
financeiramente o lar. Isso mostra um comportamento ainda muito tradicional no
País, onde as mulheres são responsáveis por educar os filhos e os homens ficam
livres da jornada tripla . “Os pais estão mais habituados com as relações
externas, com divertimento fora de casa, mas é com o convívio que descobrimos o
outro, suas preferências e gostos. Quando foram para casa, perceberam que
estavam distantes dos filhos e passaram a dar valor a coisas que antes eram
banalizadas, como por exemplo, o tipo de indivíduo que estão educando para o
mundo”, diz Soraya. Os desafios, explica a psicóloga, independem da idade dos
filhos. “É importante pensar que foram muitos comportamentos diferentes, já que
a quarentena se estendeu mais do que imaginávamos, até mesmo as crianças e
adolescente tiveram que se adaptar com a figura masculina em casa”.
Embora muitos pais se redescobriram com o
distanciamento social, Soraya explica que houve uma divisão clara
entre aqueles que aproveitaram a situação para se conectar com os filhos, e os
que tiveram grandes problemas de ansiedade. “Um segundo grupo de pais
demonstrou alteração forte de humor chegando até mesmo a atos de agressividade
com violência física e moral, impaciência, irritabilidade e frustração”.
Para a psicóloga esses homens encararam com mais dificuldade o fato de estarem
se sentindo fechados e não souberam lidar com a nova realidade de vida. “O
resultado disso foi o grande número de divórcios que está tendo no mundo”,
exemplifica.
Segundo Soraya, a adaptação foi mais complexa
para esse grupo pois são pessoas que ainda vivem apegadas a uma cultura onde
homens não executam tarefas domésticas nem educam os filhos pessoalmente do
dia-a-dia. “Os pais tiveram que se posicionar melhor diante da escolha feita ao
casar. Foram forçados a aprender a conviver e valorizar o papel da mulher e se
tornar pai, esposo, companheiro e amigo”.
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