A capacidade de concentração dos seres humanos está
diminuindo a cada geração. Uma pesquisa da Microsoft Corp conduzida no Canadá,
em 2015, com 2 mil pessoas indicou que a tecnologia nos deixou com uma atenção
mais curta que a de um peixinho dourado. Para monitorar a atividade cerebral, o
estudo, que foi publicado pela revista Time,
também fez eletroencefalogramas em 112 voluntários e detectou que a
concentração sofreu impactos significativos pelo uso de dispositivos portáteis
e das mídias digitais. Em 2000, a atenção era de 12 segundos, em média; em 2013
caiu para oito segundos – um segundo atrás da média dos tais peixinhos
dourados. Além de detectar o problema, os cientistas passaram a estudar como
treinar os distraídos para auxiliá-los a se focar em tarefas; a expandir a atenção.
Esse treinamento é essencial para entendermos quais os desafios que enfrentamos
e as oportunidades para educar e preparar os jovens das gerações Millenniale
Z
para o futuro.
A geração Millennial surgiu em um momento de
melhoria da economia mundial, da forte expansão urbana e do avanço da
tecnologia. Nascidos em meados da década de 1980 até 1990, esses jovens viveram
com mais intensidade a transição de um mundo com acesso limitado à informação
para o conhecimento a poucos cliques de distância. A geração Z, em
contrapartida, é a primeira que cresceu em um mundo dominado pela internet; são
fluentes em tecnologia.
Classificados como True Gen, a geração da verdade,
nasceram entre 1995 e 2010; e reconhecem no não binarismo – que não resume a
existência em dois gêneros normativos da sociedade, como a cultura eurocêntrica
– a chave de uma boa vida. Pais, avós e educadores têm debatido formas de lidar
com as particularidades dessas duas gerações e, nesse processo, muitos carregam
a mão nos pontos dissonantes. Entretanto, como qualquer outra, essa geração tem
muito a nos ensinar e a contribuir com o mundo. Cabe a nós, enxergar como
construir um diálogo eloquente que supere os desafios e que acolha os
benefícios trazidos pela tecnologia, sobretudo com um viés de intencionalidade
pedagógica.
Como pesquisador de Educação, defendo que a
tecnologia empregada na Educação deve estar próxima da linguagem do estudante,
gerando identificação e motivação – ao mesmo tempo que combate a distração e
falta de foco. A escola e a família precisam ensinar os jovens a lidar com as
oportunidades, os riscos e os desafios de estarem conectados. Quando penso no
desafio da motivação do aluno, enxergo a tecnologia como uma aliada. No Brasil,
de acordo com a PNAD, 50% dos jovens brasileiros não conseguem concluir o
Ensino Médio até os 19 anos. A necessidade de trabalhar, que pode vir à mente
como principal fator da evasão escolar, não é o primeiro motivo: 40% dos jovens
que abandonaram os estudos apontam o desinteresse – de acordo com a pesquisa da
Fundação Getulio Vargas. E a tecnologia pode ajudar a tornar o ensino mais
interessante para os jovens. Entretanto, vejo que a inserção da tecnologia na
educação não se limita a deixar o conteúdo mais atrativo para o jovem; ela
permite também que os professores conheçam as necessidades de cada aluno em
tempo real, de forma personalizada; e possam ajudar os alunos antes que fiquem
desmotivados e que desistam por não estarem aprendendo.
Os avanços tecnológicos são exponenciais. Hoje, o
desafio é direcionar esses avanços para levarmos a educação a um novo patamar e
para combater esse desafio de concentração. Não se trata de automatização, mas
da possibilidade inovadora de personalizar, canalizar o tempo dos educadores e
gestores para o que realmente importa e utilizar os recursos e metodologias
capazes de apoiar uma educação coerente com as necessidades dos nossos alunos,
auxiliando-os a lidarem com o impacto da tecnologia na atenção. Na sala de
aula, os ganhos do uso da tecnologia são indiscutíveis: ajuda a individualizar
o aprendizado, auxilia professores no planejamento de aulas e habilita os
alunos com as capacidades digitais. As tecnologias digitais também trazem
benefícios quando voltadas aos professores. Um computador nas mãos dos
professores, por exemplo, elevou a notas no PISA em 2,7 pontos.
É claro que as gerações Millenniale Z
sofreram diretamente os efeitos colaterais da tecnologia na atenção. Embora
esse impacto seja motivo de preocupação – sobretudo em um cenário de um futuro
incerto, no qual os jovens terão que resolver problemas que ainda não existem,
usando tecnologias que não foram inventadas – também representa oportunidade
para repensarmos o modelo educacional. Nesse contexto, educadores e pais têm
que ajudar os jovens a desenvolver o hábito de estudar e aprender a vida toda,
o chamado life long learning. Por ter que se atualizar com mais
frequência – porque atualmente o conhecimento é criado muito mais rápido do que
há décadas –, isso torna essenciais o desenvolvimento de habilidades como se
concentrar, priorizar e aprofundar; capacidades que são importantes não apenas
para o mundo do trabalho, mas para o aprendizado como um todo.
Se os nossos jovens não desenvolverem a habilidade
da concentração isso será muito prejudicial para o futuro deles. Qualquer que
seja a profissão e a atividade que escolherem, sempre precisarão de
concentração para ter sucesso; para se dedicarem. Isso porque se concentrar tem
a ver com definir prioridades; fazer escolhas; organizar o tempo – um conjunto
de habilidades que são importantes para qualquer carreira. E acredito que pais
e educadores têm papel principal nesse desenvolvimento. Esses pesquisadores
canadenses dizem que os nossos cérebros podem estar se adaptando à novas
tecnologias; que a atenção mais curta é uma resposta dessa adaptação, ou seja,
um efeito colateral normal.
Uma reflexão que tenho feito – como pai de quatro
crianças e profissional, liderando uma equipe multigeracional na Geekie, que
também conta com muitos jovens – é que a ênfase em ser multitarefas (multitasking)
está diretamente associada à dificuldade de manter o foco. Essa lógica de fazer
muitas coisas ao mesmo tempo, reforçada pelo uso de dispositivos móveis,
dificulta o desenvolvimento da habilidade da atenção, sobretudo em crianças
muito ativas em mídias sociais; o cérebro precisa se reorganizar a cada mudança
de atividade – o que ocorre sem que o ser humano se dê conta do processo. Em
casa, tento desmistificar esse hábito erroneamente valorizado; defendo que para
fazer bem uma coisa, envolve escolhas. Para ter profundidade em algo e ser
eficaz de fato, aprender a renunciar é essencial.
Tenho experimentado algumas táticas para ajudar
meus filhos na concentração. A primeira é ajudá-los a focar e estabelecer
limites nas atividades do momento: se estão fazendo lição de casa, a atividade
deve ter começo, meio e fim; começar e terminar antes de se envolver em outra
iniciativa. A segunda passa pelo exemplo. Nós, pais, temos que viver o que
pregamos. Parece simples, né?! Mas, quando estamos conversando com alguém e
paramos a conversa para consultar o celular, estamos agindo de forma incoerente
com o discurso feito. Temos, também, que começar e terminar uma tarefa. São
esses detalhes do dia a dia que precisamos prestar a atenção. Os filhos fazem o
que fazemos – não o que falamos. A terceira dica é pedir para que os filhos
expliquem o que fizeram ao concluir uma tarefa; dividir, compartilhar e
explicar, desafia as crianças e jovens a pensarem com mais profundidade no que
fizeram. Vale ressaltar que essa elaboração não precisa ser imediata, até
porque refletir sobre o que foi feito é importante. Por último, encorajá-los a
pensar sobre a importância de exercitar a concentração.
Ah... sobre os pesquisadores canadenses, eles me
deram uma boa notícia. A geração que adotou as tecnologias mais cedo na vida ou
de forma mais constante – True Gen, por exemplo – aprende com o
tempo a permitir que grandes quantidades de informação sejam processadas antes
de mudar o foco de atenção para outra atividade. Nesse caso, o nível alto de
concentração aumenta em picos.Nessa seara, são melhores que gerações anteriores
no processo de identificar temas com os quais querem ou não envolvimento. Na
prática, precisam de menos tempo para processar e alocar informações na
memória.
Claudio Sassaki - mestre
em Educação pela Stanford University e cofundador da Geekie, empresa referência
em educação com apoio de inovação no Brasil e no mundo.
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