Proteger
os ativos tangíveis de uma empresa é muito mais fácil do que proteger seus
ativos intangíveis, como sua credibilidade e reputação. Aquilo que depende da
conduta humana é muito mais complexo. Por isso, a necessidade de desenvolver a
ética dentro das corporações está cada dia mais latente.
A ética
pressupõe que todos terão boas condutas, sobretudo quando não estiverem sendo
vigiados e monitorados. Já a lei pune e previne ações através de uma obrigação
legal - o dever. Ambas fazem parte das ferramentas de compliance.
Dados os
escândalos de corrupção envolvendo as maiores empresas do país, as reflexões em
torno dessa temática estão aumentando. Nesse sentido, a Ética e o Direito são
duas faces de uma mesma forma de blindagem das empresas.
Na década
de 70, o economista Milton Friedman disse que “o negócio dos negócios são os
negócios”, demonstrando uma visão focada no lucro acima de qualquer coisa, sem
preocupação com a maneira pela qual estes negócios são gerados. Felizmente, a
sociedade evoluiu muito desde então, passando a valorizar a transparência e as
boas práticas.
A
operação Lava-Jato ilustra que os processos em curso já alteraram o cálculo de
qualquer agente econômico que tenha em mente a violação da confiança pública em
busca de ganho privado. Está evidente que os lucros a qualquer custo não valem
mais a pena.
Bons
exemplos não faltam. Cabe lembrar o FCPA - Foreing Corrupt Practices Act (EUA,
1977) que decorreu de escândalos de corrupção como o Watergate, o qual levou a
queda do então presidente Richard Nixon, assim como o Bribery Act (Reino Unido,
2010), que forçou a modernização da legislação anticorrupção. O Brasil assumiu
compromissos com a ONU, OEA e OCDE, e em agosto de 2013, promulgou a Lei nº.
12.846/2013, mais conhecida como “Lei Brasileira Anticorrupção”.
Essa Lei
integrou o ordenamento jurídico ao lado de outras importantes legislações
brasileiras de combate à corrupção, como a Lei de Improbidade Administrativa
(Lei nº 8.429/1992), a Lei de Defesa da Concorrência (Lei nº 12.529/2011), a
Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010), entre outras de natureza
penal.
À medida
que trouxe responsabilidade objetiva para as empresas (independentemente de
culpa) por atos de corrupção, a Lei Anticorrupção trouxe a necessidade delas
estruturarem seus programas de conformidade. Esse novo marco normativo
brasileiro criou uma verdadeira revolução na governança corporativa. A
sociedade não tolera mais práticas que não sejam consideradas íntegras na busca
pelo lucro.
Quando a
corrupção é sistêmica, como no caso do Brasil, grande parcela de gastos
públicos e recursos humanos tendem a ser alocados para maximizar oportunidades
de captura de rendas em lugar da criação de riqueza. Ao invés de inovação e
busca de maior produtividade, agentes privados buscam vencer concorrentes via
busca de privilégios especiais. Com menos oportunidades para propina, as
empresas terão de focar na eficiência e na entrega real de valor para o
consumidor.
O
compliance é o que dá suporte a essa sustentabilidade corporativa à medida que
busca mitigar riscos, proteger os interesses dos públicos envolvidos e, ao lado
da ética, preservar o maior ativo de uma empresa, que é a conduta de seus
colaboradores. Isso permite sustentabilidade em longo prazo.
Se para a
lei a integridade e transparência se torna um dever, para a ética ela é um
convite à responsabilidade. Ao considerarmos a sustentabilidade engajada pela
lei e pela ética, surge um novo modelo de sociedade, que passa a exigir dos
empresários uma conduta que vise o respeito aos valores sociais.
A
necessidade legal de se implementar programas de compliance demostra que a
ética galgou o patamar de importância para que se deixe os pensamentos do
século XX de lado, e o lucro deixe de ser o propósito único de uma empresa. O
comportamento do mercado agora demanda que valores e boas condutas sejam
respeitados e praticados - e que possam agir em conjunto com a busca pelo
lucro. O consumidor, nesse cenário, se mantem como meio, com um papel fundamental
de fiscal.
A lei se
constrói em cima daquilo que é necessário. Quando ela é compreendida pela
lógica, ela é aplicada como ética, e ambas blindam os valores e ativos da
empresa, mantendo tudo funcionando como realmente deveria, em um cenário onde o
recompensado é o que é certo, e não o que é imediatista e egoísta.
Samuel
Sabino - fundador da consultoria Éticas Consultoria,
filósofo, mestre em bioética e professor.
Rodrigo de Pinho Bertoccelli - advogado e fundador/presidente do IBDEE (Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial).
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