Opinião
Tenho
defendido que o ano de 2020 seja utilizado para a (re)visão de concepções,
conteúdos, objetivos, estratégias, recursos, avaliações e referências para o
estabelecimento e a manutenção de um senso de presença emocional, cognitiva e
instrucional, para as nossas aulas híbridas, a partir do ano de 2021.
Defendi
também a distância física, de alunos e professores, dos espaços comprovada e
potencialmente inseguros. Tenho defendido, assim, o cuidado com a nossa saúde
em geral e com a vida escolar de cada um dos estudantes particular e indistintamente.
É o que continuo a fazer, mais responsável e justificadamente ainda. Minha
responsabilidade é com a equidade na educação. A justificativa para tratar de
reabertura da escola aqui é defender que ela não é segura, tampouco justa.
“Escolas particulares
defendem antecipar retomada de aulas presenciais". Notícias como esta
tornaram-se frequentes e crescentes no Brasil, incluindo as que dão conta da
reabertura já efetuada.
O tom dos
entrevistados - os gestores das escolas privadas - é de que os seus espaços
estão devidamente delimitados, as suas superfícies encontram-se permanentemente
higienizadas, os seus recursos materiais e humanos são à prova de contágios.
Trata-se de
uma retórica de superioridade relativamente à escola que nunca teve espaço,
limpeza, equipamento, nem profissionais. Trata-se de vender e comprar um
produto, não importa o custo para o Outro, para os outros estudantes, para os
outros professores, para a nossa saúde.
Sabe-se, com
base em resultados de pesquisas confiáveis, que, mesmo que as crianças e os
adolescentes conseguissem se manter distantes uns dos outros na escola, as
máscaras - mesmo as de grife - não impediriam a infecção; o vírus ainda estará
no ar.
Há outros
achados científicos que precisam também ser considerados, a saber, a tentativa
de adestrar crianças, quando elas já há meses, sabem que as consequências
do seu mau comportamento podem ser mortais para elas, seus amigos ou sua
família redunda na piora de transtornos de ansiedade.
Sabe-se,
também, que limpar superfícies não é suficiente. A Covid-19 é capaz de pairar
no ar. Há pelos menos dois meses, aprendemos, com a OMS, sobre os aerossóis:
“pequenas gotículas são suficientemente pequenas para permanecer no ar por
horas e podem viajar no ar transportando seu conteúdo viral até dezenas de
metros de onde se originaram".
Esse achado
pode ser traduzido pela afirmação de que a limpeza de carteiras, do chão, das
maçanetas e de outras superfícies da escola não trará segurança absoluta como
propagandeia o gestor afoito em reabrir.
Sabe-se que
reabrir escolas é cavar, é aprofundar ainda mais o fosso social. Isso porque
não são todas a reabrir, tampouco abrirão para todos. Quem nos dá, como
professores e alunos de todo o país, a certeza de que haverá equipamentos de
proteção - mesmo que não total - para cada um de nós.
Não os temos
para os profissionais da saúde, na chamada linha de frente! Como não fazer,
neste momento, uma relação com o fato de milhões de brasileiros não terem,
historicamente, recursos para o caderno e o lápis?! Há que relacionar,
necessariamente, a reabertura com a condição financeira de cada aluno.
Caso as
instituições mais frequentadas pela população economicamente carente reabram,
mesmo dando a opção para que os alunos estudem remotamente, pais e mães poderão
ter que deixá-los na escola.
Essas são
tipicamente famílias que nunca puderam deixar de tomar os transportes públicos
superlotados, e que, como se já não fosse injusto o suficiente, têm que se
enfileirar acotoveladamente para receber o parco recurso financeiro.
Da escola
para casa ou vice-versa, os alunos poderão transmitir o vírus. Sim, crianças e
adolescentes infectam-se e transmitem a COVID-19, podendo morrer em sua
consequência também.
Sabe-se que
todos os espaços que foram reabertos têm sido ocupados por pessoas que se
contaminam mutuamente; a disseminação do vírus está acelerada por esse
comportamento em todo o mundo.
A volta às
aulas presenciais causará mais interação entre os membros de toda a sociedade:
as crianças agirão como crianças; os professores terão que usar os tais
transportes, por exemplo; e tudo isso se multiplicará perigosamente, como nos
mostram os estudos científicos.
É fato que o vírus pode espalhar-se
escola adentro e afora, provavelmente fazendo de vítimas primeiras seus alunos
e professores. O que dirão os gestores, os da escola que se diz melhor?
Respondo modestamente, para que me ouçam: não há, para a reabertura, segurança
emocional, tão fundamental que é para o aprendizado de conteúdos e para o
desenvolvimento intelectual. Acrescento: enquanto fechados, foquem na equidade
na educação.
José Marcelo Freitas de Luna - doutor
em Linguística e professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade do Vale do Itajaí (Univali) - mluna@univali.br