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quinta-feira, 24 de maio de 2018

Preços dos combustíveis: a história se repete


Justamente após o que aparentava ser o fim da longa recessão que a economia brasileira atravessou nos últimos três anos, com significativa queda da inflação e da taxa de juros associadas à retomada do crescimento econômico, um antigo “inimigo” resolveu atacar novamente: o preço dos combustíveis.

Especialmente entre 2011 e 2014, ocorreu uma severa intervenção governamental no mercado de combustíveis, que manteve os preços internos desalinhados dos preços internacionais e acarretou uma série de problemas de ordem econômica. Um desses problemas foi a sustentação de perdas sucessivas pela Petrobrás e consequentemente, pelos seus acionistas, entre os quais se destaca o próprio governo. Outros problemas adicionais se refletiram nos prejuízos para toda a cadeia de produção do etanol e, em termos macroeconômicos, no processo de realinhamento dos preços dos combustíveis, que exigiu uma elevação significativa que impactou a inflação e fez com que a Taxa Selic subisse de 7,25% para 14,25% ao ano repentinamente, o que, entre outros fatores, contribuiu para a longa recessão que o país atravessou.

Na conjuntura da crise fiscal no qual o barril do petróleo praticamente dobrou em um período inferior a um ano, os preços domésticos, em uma lógica de mercado, subiram. Os protestos dos caminhoneiros, que de fato enfrentam dificuldades para repassar os aumentos dos custos para os preços dos fretes em um cenário de recuperação econômica ainda instável, motivaram reuniões no governo federal na tentativa de encontrar uma solução para um problema que é “exógeno”, ou seja, que está relacionado ao comportamento dos preços do petróleo no mercado internacional.

Entre os resultados da reunião, uma das opções foi a redução a zero da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), que foi uma “contribuição” criada em 1997, que teve sua finalidade desviada ao longo dos anos, mas que tem efetivamente pouco impacto nos preços no cenário atual. No contexto de crise fiscal, essa redução foi condicionada à reoneração da folha de pagamentos. Outro resultado da reunião foi o anúncio, por parte da Petrobrás, de que a política de preços não se alteraria. Este último anúncio durou apenas 24 horas, já que foi anunciada uma redução nos preços do diesel de 10%.

Muito se pode comentar sobre a atual política de preços da Petrobrás, com críticas e possibilidades de melhorias, como, por exemplo, a avaliação da real necessidade de alterações diárias nos preços dos combustíveis.  Uma opção alternativa seria levar em consideração a média dos preços em um determinado período ou a ampliação do período de reajuste, que poderia ser semanal, quinzenal ou até mesmo mensal. Todavia, a frequência dos reajustes não altera a essência do problema, que é a elevação nos preços dos combustíveis.

Nesse contexto, não é possível permitir que, sob a lógica do mercado internacional, a empresa altere sua estratégia de alinhamento de preços domésticos ao mercado internacional, como o que aparentemente ocorreu com a mudança no discurso oficial e a redução nos preços do diesel. A economia brasileira já experimentou, no passado, o artificialismo nos preços dos combustíveis e o resultado foi danoso ao país. Os custos do represamento dos preços dos combustíveis superaram os benefícios e, infelizmente, a história está se repetindo. Uma redução de outros impostos sobre os preços dos combustíveis, tanto sob a esfera federal quanto estadual, constituiria uma discussão alternativa muito mais interessante. Se os governos não estivessem sob uma severa crise fiscal, a redução de impostos poderia ser anunciada de forma imediata. Diante do cenário adverso, recomenda-se a inclusão dessa questão na pauta dos problemas a serem solucionados no médio prazo e uma avaliação cuidadosa no sentido de se evitar a repetição de erros do passado que culminaram na pior recessão da história econômica brasileira que vivenciamos nas últimas décadas.






Pedro Raffy Vartanian - coordenador do Mestrado Profissional em Economia e Mercados da Universidade Presbiteriana Mackenzie e pesquisador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica.


Greve dos caminhoneiros: impactos poderiam ser menores com política de gestão de riscos


A greve dos caminhoneiros, que hoje chegou ao quarto dia, está paralisando o Brasil. A falta de abastecimento levou vários setores ao caos. Segundo os líderes do movimento, a principal exigência é a queda no preço do diesel, que tem inviabilizado o transporte de mercadorias no país.

O preço dos combustíveis varia de acordo com a cotação do dólar e do petróleo no mercado internacional. Sendo assim, caminhoneiros pedem que o governo estabeleça uma regra para os reajustes do produto, reduzindo a volatilidade nos preços. A paralisação defende a aprovação do projeto de lei 528, de 2015, que cria a política de preços mínimos para o frete, bem como a criação de um marco regulatório para os caminhoneiros.

O fato é que, com esses profissionais de braços cruzados, agora diversos setores da economia estão sofrendo. Embora a causa dos problemas seja externa às empresas que se utilizam do transporte, portanto não-controlável, um melhor planejamento dessas empresas certamente faria com que o impacto fosse menor num momento como esse.

Independentemente do porte ou segmento, toda empresa precisa ter um plano para gerenciamento de risco. A análise de riscos pressupõe um processo de compreender a natureza do risco e determinar o nível de sua magnitude e abrangência.

O assunto é tão importante que existe até uma norma ISO, a 31.001, de gestão de risco. Essa norma nasceu em 2009, da necessidade das empresas de lidar com as incertezas que podem afetar seus objetivos estratégicos. Entre eles podemos citar os financeiros, operacionais, projetos, novos produtos, marketing, impactos ambientais, entre outros.

Essa norma visa padronizar as melhores práticas e abordagens que a empresa pode adotar para analisar e mitigar seus riscos. Cabe destacar que ela apenas sugere e não define o que a empresa deve fazer. Por esse motivo, essa não é uma norma certificável.

Junto com a norma ISO 31.001, surgiu o conceito de Auditoria Baseada em Riscos (ABR), onde o foco é identificar eventos que possam vir a impactar os objetivos estratégicos da empresa. A ABR tem o foco preventivo e no futuro. Ela não olha para o que foi feito e sim para o que “pode” ser feito. A ABR não trata de auditar os riscos, mas sim as respostas adotadas pela administração, criando assim um plano de ação para emergências.

Tendo atenção ao gerenciamento de riscos, certamente os impactos advindos da greve dos caminhoneiros certamente seria menor em diversos setores. Desenvolver uma cultura de prevenção, focada na gestão baseada em melhoria contínua, é o melhor caminho para construirmos empresas mais saudáveis e menos vulneráveis. 





Alexandre Pierro - engenheiro mecânico, bacharel em física aplicada pela USP e fundador da PALAS, consultoria em gestão da qualidade.

 

O que esperar do regulamento europeu sobre proteção e segurança de dados?


Nesta sexta-feira (25/5) entra em vigor o General Data Protection Regulation (GDPR) ou Regulamento Europeu sobre Proteção de Dados (Regulamento 2016/679). Trata-se de um avanço significativo na autodeterminação informacional, ou seja, na proteção e segurança de dados, agora afinada essencial e legislativamente com dois princípios fundamentais. 

O primeiro desses é o princípio da finalidade ("Zweckverbindung"). Qualquer dado somente pode ser requerido e mantido em uma base conforme a finalidade a que ele se presta. Se a finalidade não existir, o dado não pode ser requerido; se ela deixar de existir, o dado deve ser esquecido, ou melhor, destruído. 

O segundo é o princípio do consentimento. Salvo as hipóteses expressamente previstas no Regulamento, quem cede dados próprios precisa consentir. Há necessidade de estar de acordo com a entrega dos dados, bem como com a finalidade a que eles se vincularão. 

Esses dois princípios têm se apresentado nos debates mais recentes como pilares indispensáveis na matéria e traços indispensáveis de uma sociedade que se considere civilizada. Trata-se do "padrão ouro" de proteção e segurança de dados.
O primeiro grande impacto já é sentido visivelmente. O Regulamento tem aplicação transversal, ou seja, ele não distingue setores econômicos. Qualquer processamento de dados estará sujeito às suas regras. Muitas empresas, órgãos públicos e sociedades europeias fizeram campanha nos últimos dias aos seus clientes e usuários a respeito das novas regras de privacidade ("privacy policy").

Com base nos princípios da finalidade e do consentimento, os cidadãos terão mais controle sobre seus dados e de como esses são processados. Eles terão direito de acesso, de retificação, de cancelamento, de portabilidade, dentre outros. Os responsáveis pelos tratamentos dos dados terão que criar padrões altos de segurança, de registro dos dados e de notificação sobre eventuais violações. A coleta de dados em ambientes virtuais precisa, enfim, de consentimento dos usuários. 

O segundo grande impacto esperado vai além do controle do cidadão dos seus dados, partes integrantes de sua personalidade: uma maior responsabilização das empresas e demais órgãos, que, além de perderem efetivamente faturamento com o descumprimento do Regulamento, serão responsabilizados de maneira diferente, por exemplo, na publicidade, se diagnosticada a quebra proposital das regras do Regulamento. A empresa que realiza publicidade por meio de determinado veículo poderá, até mesmo, ser responsabilizada por erro deste.
Quanto ao Brasil, este não passará distante do Regulamento. Empresas brasileiras, que apresentam filiais na União Europeia ou que ofertem serviços na União Europeia, deverão se moldar às regras do Regulamento a fim de coletar e armazenar dados de cidadãos europeus. Porém, mais importante ainda será a conscientização que precisamos imediatamente de legislação adequada para esta disciplina, além de pesquisas científicas sérias, conduzidas na área jurídica, sobre o tema.






Rodrigo Vaz Sampaio - especialista em Direito Civil e Proteção de Dados do CEU Law School

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