Em nossa vida, uma coisa importante é o que obtemos.
Porém, mais importante é como obtemos. Esse adágio se
aplica a situações diversas em economia, e faz parte de estudos sobre o
resultado das ações humanas e a forma como tais ações são executadas.
Atualmente, o Brasil está vivendo uma situação em que tal raciocínio se aplica.
Durante anos, o país foi esmagado pela inflação e sua versão mais demolidora: a
hiperinflação. Hoje, a inflação está controlada em níveis baixos – o que é bom
–, mas cabe perguntar se não se trata de um bem derivado de um mal.
Comumente definida como um processo de aumento
generalizado e contínuo de preços, a inflação foi um dos estopins da queda do
presidente João Goulart, em 1964. No ano anterior, a inflação chegara a 78% e
desorganizou o sistema de preços, lançou a economia em recessão e empobreceu os
assalariados. Alguns economistas definem que há hiperinflação quando o índice
anual de preços passa dos 50%. Outros acham que ela ocorre quando os preços
sobem acima dos 100% ao ano.
O Brasil conseguiu controlar aquela inflação de
1963, mas em 1974 o monstro voltou e os preços subiram 34%. Em 1979, a inflação
atingiu 78%, o mesmo índice de 1963, e o Brasil começou uma fase de
hiperinflação, que acabaria resultando em cinco planos econômicos nos governos
Sarney, Collor e Itamar Franco, na tentativa de combatê-la. Foi somente em
1994, com o Plano Real, que o país conseguiu vencer a hiperinflação e iniciar
uma fase de estabilidade de preços.
Após 1994, parecia que o monstro da inflação havia
deixado o Brasil. Mas inflação não morre. Apenas adormece, sempre pronta a
atacar quando é cutucada. Desde 1996, a inflação não passa de um dígito, à
exceção de 2002, quando foi de 12,5%, e depois em 2015, quando chegou a 10,67%.
Esse histórico deixou os agentes econômicos assustados no início do segundo
governo Dilma, quando a inflação subiu em 2015, e o medo da hiperinflação
reapareceu. Hoje, o pânico passou e a inflação deve ficar abaixo da meta do Banco
Central, que é de 4,5%.
Atualmente, estamos presenciando certa euforia com
a inflação baixa. Entretanto, há um problema com as razões que levaram à
redução no índice de preços. Se estivesse baixa em um ambiente de crescimento
econômico e reduzido desemprego, daria para dizer que temos um bem assentado em
causas boas. Entretanto, a inflação está baixa em 2017 depois de três anos de
recessão pesada – o Produto Interno Bruto (PIB) do ano 7,4% menor do que era em
2013 – e desemprego de 14,2 milhões de trabalhadores, sobre um total de 103,6
milhões de pessoas em condições de trabalhar.
A inflação baixa é boa para a nação, mas, se deriva
de produção baixa e desemprego alto, ela não é estável. Há dúvidas quanto à
capacidade da economia em manter a inflação baixa quando o produto nacional
voltar a crescer e o desemprego cair. Alguns analistas acreditam que a inflação
pode voltar a subir, pois há variáveis macroeconômicas – como déficit do setor
público, controle da dívida governamental e expansão monetária – que não dão
mostras de melhoras e vão pressionar a inflação para cima.
Se um sujeito emagreceu se exercitando numa
academia, é uma coisa boa. Se outro emagreceu porque ficou doente, é uma coisa
ruim. A inflação brasileira caiu porque o país adoeceu (recessão e desemprego).
A recessão até ajuda a combater a inflação, desde que sejam feitos os ajustes
fiscais e monetários. Sem isso, é sucesso não sustentável.
José Pio Martins - economista, é
reitor da Universidade Positivo.