Isolamento social
mudou o padrão de sono dos estudante; saiba como isso interfere nos estudos
Uma pesquisa publicada recentemente pelo Journal of
Child Psychology and Psychiatry aponta que 70% das crianças e adolescentes com
menos de 16 anos estão indo para a cama mais tarde desde que a pandemia do novo
coronavírus começou. As consequências da perda do padrão de sono podem ser
muito graves para a capacidade de aprendizagem nessas faixas etárias, segundo
especialistas.
Adriessa Santos, coordenadora da pós-graduação em
Neurociência do Instituto Singularidades e especialista em Neurociência e
Educação, explica que o processo de aprender uma nova habilidade ou conteúdo
precisa das horas de sono para se fortalecer. Quando uma pessoa está aprendendo
algo novo, o cérebro começa a realizar conexões para absorver e gravar os
conteúdos com que seus cinco sentidos entram em contato. Essas conexões são
chamadas de sinapses. De acordo com a especialista, depois que as sinapses são
feitas é preciso garantir que elas sejam fortalecidas de modo a fixar aquele
novo aprendizado. E o sono é um ingrediente indispensável para isso.
Para Michele Muller, pesquisadora, escritora,
especialista em neurociência clínica e neuropsicologia educacional e mestre em
Ciências da Educação, "a sociedade subestima um pouco essa questão. As
aulas começam cedo demais ou os pais não levam muito a sério o horário de ir
para a cama, por exemplo. A criança, enquanto dorme, acaba ensaiando aquilo que
aprendeu durante o dia. Então, tanto para a saúde física quanto para a saúde
mental e para a aprendizagem, o sono é uma questão que precisa ser levada muito
a sério", alerta. Adriessa concorda. "Não aprendemos dormindo, mas
sem dormir não aprendemos. O dormir é um pilar fundamental na
consolidação da aprendizagem", diz.
Isso porque, da mesma forma que as sinapses podem
ser fortalecidas, também podem ser enfraquecidas. Assim, garantir que o cérebro
tenha as horas necessárias de sono para que os conteúdos aprendidos se tornem
mais fortes é também uma forma de ajudá-lo a aprender. Outra boa estratégia,
orientam as especialistas, é insistir algumas vezes nos conteúdos abordados com
os alunos. Isso pode ser feito, por exemplo, iniciando as aulas seguintes
revisitando os conceitos e oferecendo novas formas de o aluno ter contato com
os mesmos assuntos.
As conexões - ou sinapses - são diferentes para
cada pessoa. De acordo com os princípios da neurociência, as inúmeras conexões
feitas pelo cérebro durante o processo de aprendizagem podem ser determinantes
para que alguém tenha maior ou menor facilidade para aprender.
Michele opina que tratar a educação sob a perspectiva
da neurociência pode contribuir para que os alunos aprendam mais e melhor.
"Durante muito tempo, focamos a educação no conteúdo, no que a criança tem
que aprender", afirma, ressaltando que, hoje, sabe-se que o mais
importante é focar na maneira como a criança aprende. "Muitas vezes, o
conteúdo não é dado de uma forma que faça sentido para quem está aprendendo.
Então, a neurociência nos ensina a dar sentido ao conteúdo para quem está
aprendendo".
Isso significa repensar a forma de ensinar, fazendo
com que os conteúdos sejam mais interessantes para as crianças e adolescentes.
Michele explica que uma boa estratégia para isso é despertar a curiosidade dos
alunos. "As crianças vão se engajar na aprendizagem se elas estiverem
interessadas no assunto - e os interesses variam de acordo com cada um. A
curiosidade é super necessária para a retenção da informação porque, quando a
gente está em um estado curioso, uma série de neurotransmissores entra em ação
para que a atenção fique focada e o conhecimento fique retido", sintetiza.
Como destaca Adriessa, a capacidade de fazer e
desfazer conexões - chamada de neuroplasticidade - é sempre única. "Gêmeos
idênticos, por exemplo, têm o mesmo material genético e, se expostos à mesma
aprendizagem, as conexões que eles formam serão diferentes". Assim,
segundo ela, pode-se concluir que todas as pessoas têm formas únicas de
aprender. Então, a aprendizagem personalizada não tem fórmulas prontas,
receitas que podem ser aplicadas a todos os alunos e que terão sempre os mesmos
resultados.
Essas e outras observações de Michele e Adriessa
sobre as contribuições da neurociência para o futuro da Educação estão
disponível no 10º episódio do podcast PodAprender, cujo tema é “Como
utilizar a neurociência a favor da educação“. O programa pode
ser ouvido no site http://sistemaaprendebrasil.com.br/podaprender/,
nas plataformas Spotify, Deezer, Apple Podcasts, Google Podcasts e nos
principais agregadores de podcasts disponíveis.