Pesquisa do BCG com mais de 6.500
funcionários em 14 países – entre eles, o Brasil – quantifica a carga acumulada
pelas mulheres, abordando seus impactos na inclusão em cargos de liderança e o
papel das organizações nesse cenário
A barreira para que mulheres
assumam posições de liderança nas empresas vai muito além do escritório.
Pesquisa inédita do Boston Consulting Group (BCG) mostra que a dupla
jornada – trabalho e tarefas domésticas – afeta quase duas vezes mais o gênero
feminino. No Brasil, o impacto dos compromissos familiares para as
mulheres que trabalham é ainda maior: elas são 2,4 vezes mais propensas a
realizar as tarefas da casa que os homens na mesma condição.
O dado é do estudo Lightening
the Mental Load that Holds Women Back, que entrevistou mais de
6.500 funcionários em 14 países. Todos os participantes precisavam estar
empregados, comprometidos e em um relacionamento heterossexual, uma vez que o
objetivo era olhar especificamente para a dinâmica entre homens e mulheres em
famílias que trabalham.
"A pesquisa elucida um
dos grandes obstáculos para as mulheres no mercado de trabalho: a sobrecarga
mental que vem da dupla jornada no trabalho e em casa. Esta dupla jornada tem
um impacto ainda difícil de mensurar, porque ela não pode ser medida apenas
pelo tempo gasto com gerenciamento e execução de tarefas domésticas essenciais
e cuidados com a família, mas deve-se considerar também o estresse acumulado
pela soma de responsabilidades. Há mulheres que abandonam posições de liderança
não pelo que acontece no trabalho, mas pelo efeito combinado com essa carga
dupla incessante e desproporcional – e na maioria das vezes, não reconhecida",
explica Juliana Abreu, sócia do BCG.
Em tarefas de grande
estresse, a desigualdade é maior
Quando analisadas apenas as
atividades domésticas primordiais e inadiáveis – justamente aquelas causam
maior estresse cotidiano –, a discrepância se acentua. No Brasil, as mulheres
que possuem família e trabalham são 3,7 vezes mais propensas a lavar as roupas
(contra 2,5 vezes na média global), 2,9 vezes a cozinhar (2,1 vezes nos demais
países), 3,4 vezes a limpar a casa (2 vezes na média global) e 2,9 vezes a lavar
a louça (1,8 vez no restante do mundo). Os homens só ganham em atividades de
menor frequência, mais facilmente terceirizadas e postergáveis, como pagar
contas, cuidar do jardim e fazer pequenas manutenções.
A dinâmica se mantém mesmo
em situações em que uma mulher tem jornada integral, mas seu cônjuge trabalha
meio período ou não trabalha. Nesses casos, a mulher tem apenas 4% menos
probabilidade de ser a principal responsável pelas tarefas cotidianas do que
quando o casal trabalha em período integral.
Avanço entre os millennials
Entre os millennials – nascidos
após o início da década de 1980 e até ao final da década de 1990 –, os casais
são mais equilibrados na divisão das tarefas. As cargas físicas e mentais
diárias dessas atividades recaem muito mais sobre quem pertence à geração
anterior. Mulheres com 45 anos ou mais são 2,6 vezes mais propensas do que os
homens da mesma faixa etária a ficar com os encargos domésticos. Já aquelas com
idades entre 18 e 34 anos, no entanto, são 1,5 vez mais propensas a fazê-lo do
que homens da mesma geração.
“Além de limitar o foco na
carreira, essa carga mental da dupla jornada sobre as mulheres traz
consequências reais para a maioria das empresas. Se elas pretendem levar a
sério a inclusão de mais talentos femininos na liderança, precisam lidar com o
ônus da responsabilidade doméstica e familiar, e sua contribuição para essa
carga mental que as mulheres carregam”, acrescenta Juliana.
Para mudar essa realidade, o
estudo indica algumas medidas a serem tomadas pelas empresas. O relatório ainda
destaca que essas ações deverão envolver todos os funcionários,
independentemente do gênero.
Oferecer arranjos de
trabalho flexíveis. As empresas devem permitir que os
funcionários trabalhem sob condições flexíveis, desde que o trabalho seja
feito, recompensando os resultados em vez do tempo de contato no escritório.
Isso inclui o estabelecimento de programas formais, como home office ou
mudanças de horário de trabalho, bem como práticas informais, incluindo a
capacidade de acompanhar as situações ocasionais que inevitavelmente surgem,
como sair mais cedo para uma consulta médica ou apresentação escolar de um
filho.
Enaltecer modelos e casais
com dupla carreira. Líderes – homens, em particular – precisam
servir de modelo, aproveitando ativamente os programas flexíveis de trabalho e
compartilhando histórias sobre como eles equilibram a carga mental em casa.
Aumentar o apoio para todos
os pais que trabalham. Uma maneira de oferecer mais apoio aos
funcionários é criar uma rede para pais e mães. As empresas também podem
oferecer suporte com creches no local, serviços de referência para babás, apoio
a idosos, planejadores financeiros e provedores de bem-estar.
Mudar o pensamento dos
consumidores. A publicidade ainda perpetua papéis de
gênero ultrapassados, mas algumas empresas estão trabalhando para mudar isso;
algumas iniciativas globais já visam remover completamente os estereótipos dos
comerciais.
Metodologia
Para quantificar a carga que
as mulheres trabalhadoras carregam em casa, o BCG realizou recentemente
pesquisa com mais de 6.500 funcionários em 14 países (Alemanha, Austrália,
Brasil, China, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Índia,
Itália, Japão, Noruega e Reino Unido), buscando informações sobre quem é
responsável pelas tarefas domésticas comuns, incluindo realizar compras de
supermercado, cozinhar, limpar, pagar contas e jardinagem. Como o BCG
queria olhar especificamente para a dinâmica entre homens e mulheres em
famílias que trabalham (embora estruturas familiares não tradicionais sejam
cada vez mais comuns e a amostra representasse apenas uma parcela da população
trabalhadora), os participantes precisavam estar comprometidos e em um
relacionamento heterossexual.
Boston Consulting Group