No Brasil são mais de 3 milhões
de casos, 75% são mulheres
Conviver com pessoas diagnosticadas com
transtornos mentais é um desafio diário que requer paciência, compreensão e
conhecimento.
Oscilações de humor, brigas frequentes e episódios de
impulsividade são comuns em ambientes familiares que lidam com distúrbios psicológicos
e psicossociais. A situação pode ser ainda mais grave nos casos de Transtorno
de Personalidade Borderline (TPB).
"O indivíduo borderline é muito intenso,
rápido e extremista. A instabilidade emocional é um padrão desse transtorno.
Seja nas relações interpessoais ou na autoimagem". Quem afirma é a
psiquiatra, do Hospital Santa Mônica, Luana Harada. "O transtorno de
personalidade traz sofrimento para a pessoa e para quem é próximo, com
prejuízos nas diversas esferas da vida", completa.
A seguir, você aprenderá mais sobre os
desafios do Transtorno de Personalidade Borderline, como identificá-lo e o que
fazer para conviver com essa condição no ambiente familiar.
O que é o Transtorno
Borderline - origem e sintomas
O termo "Transtorno de Personalidade
Borderline" foi cunhado em 1938 pelo psicanalista norte-americano Adolf
Stern. À época, a condição descrevia pacientes que se encontravam no limiar
entre a psicose e a neurose. Daí a aplicação da palavra "borderline"
("limite" no inglês).
O Borderline também é comumente classificado
como Transtorno de Personalidade Limítrofe.
A Associação Norte-Americana de Psiquiatria,
define nove sintomas comuns ao distúrbio, descritos no Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V).
1. Esforços desesperados de
evitar o abandono real ou imaginário
Borderlines têm medo intenso do abandono.
Muitas vezes, quando se veem na iminência de ficarem sozinhos, são levados a
empatizar, até mesmo, com quem possuem pouca afinidade. Para Luana Harada, a
sensação de estar prestes a ser abandonado torna essas pessoas ávidas por
alguma ligação significativa. "Os vínculos podem surgir de forma rápida,
intensa e com muita intimidade. Porém, são frágeis", explica a médica.
2.Padrão de relacionamentos
instáveis, com extremos de admiração e ódio
Relacionamentos interpessoais de indivíduos
borderlines são muito instáveis, com altos e baixos frequentes. As relações são
marcadas por extremos de idealização e desvalorização, em uma verdadeira
"montanha-russa" de sentimentos.
3. Dificuldade em relação à
autoimagem
Indivíduos borderlines têm dificuldade em se
enxergar e ver as próprias características, negativas ou positivas. Isso torna
difícil a descrição para os outros, não só da autoimagem corporal, mas no que
diz respeito às características de identidade.
"Por isso, o TPB também é chamado de
transtorno de personalidade emocionalmente instável. A instabilidade está
presente em vários contextos", explica a psiquiatra. Isso inclui mudanças
súbitas em relação a imagem, aspirações profissionais, identidade sexual e
valores.
4.Impulsividade elevada
A impulsividade pode ser percebida de diversas
formas, tanto prazerosas quanto agressivas. A pessoa com transtorno borderline
tende a fazer coisas sem pensar, levada pela gratificação imediata.
Comportamentos impulsivos podem incluir o consumo de drogas, álcool, sexo sem
proteção e compulsão alimentar. Muitas vezes, os borderlines realizam atos
impulsivos com o objetivo de gerar alívio ou relaxamento momentâneo.
5.Comportamento suicida
recorrente, com ameaças e automutilação
Comportamentos autolesivos são comuns em
diagnosticados com o Transtorno Borderline. Em momentos de instabilidade dos
afetos, a dor física é usada como válvula de escape. Além disso, são pessoas
com um risco aumentado de suicídio, manifestando ameaças e realizando
tentativas em momentos de extrema angústia. Entre 8% a 10% dos indivíduos que
possuem o TPB cometem suicídio.
A psiquiatra do Hospital Santa Mônica faz um
alerta: "Não é porque essas pessoas falam de suicídio que elas não
tentarão consumar o ato. Existe esse mito na sociedade. Estamos lidando com a
vida. Se ela se vai, não teremos a chance de fazer diferente. O pensamento
suicida nunca deve ser menosprezado e, quando se torna recorrente, é o
principal motivo que os levam a pedir ajuda".
6. Mudanças de humor
Pessoas com TPB vivem no limite entre o amor e
o ódio, a raiva e a tristeza. "Essa flutuação de humor também é comum a
outros transtornos, como a bipolaridade e a esquizofrenia", explica Luana
Harada. "A diferença está na duração do sintoma, que é mais irregular no
borderline".
7. Sentimento crônico de
vazio
Borderlines têm um vazio interno que não sabem
como sanar. Isso pode desencadear brigas familiares, conflitos conjugais recorrentes
e provocar distúrbios no núcleo familiar.
8. Raiva intensa ou
dificuldade de controlar a raiva
Essa característica está associada à
instabilidade. O indivíduo pode acordar bem e, ao mínimo de frustração, se
tornar extremamente raivoso. Muitas vezes, familiares e amigos não são capazes
de entender qual é o motivo. Indivíduos borderline também podem pedir ajuda,
por sentir culpa e vergonha após os acessos de raiva e agressividade.
9.Paranoia temporária
relacionada ao estresse
Alguns indivíduos em momentos de angústia
extrema podem vivenciar sintomas psicóticos. Eles são breves e podem se
manifestar na forma de alucinações auditivas ou vivências delirantes. Algumas
vezes, esses surtos podem estar relacionados a distúrbios do sono (chamados de
alucinações hipnagógicas) e ao momento de despertar ou dormir.
Como diagnosticar o
Transtorno Borderline
Quase 80 anos se passaram desde que o termo
Borderline foi criado e o diagnóstico correto do transtorno continua sendo um
desafio para médicos e especialistas em saúde mental. Estudo realizado pela
Universidade de Brown, nos Estados Unidos, revela que 40% dos pacientes
identificados com o Transtorno de Personalidade Limítrofe haviam sido mal
diagnosticados ou sub diagnosticados anteriormente.
"O diagnóstico não é tarefa
simples", explica Luana Harada. "Existem outras condições com
sintomas semelhantes de ansiedade, psicose e intensidade de humor, como a
esquizofrenia, a bipolaridade e a depressão". A avaliação única e pontual
pode confundir os sintomas do TPB com distúrbios mentais similares. O
diagnóstico deve ser realizado, portanto, com uma análise do padrão de
comportamento ao longo do tempo, levando em consideração o contexto geral em
que os sintomas se apresentam.
É preciso entender a dinâmica de relação do
indivíduo com o meio em que ele vive. Juntando todas as peças é possível
realizar o diagnóstico correto.
Relação entre o Borderline e
o uso de drogas
É comum ver a comorbidade do transtorno de
personalidade limítrofe e a dependência química. Por serem mais impulsivos,
esses indivíduos têm a tendência de buscar o prazer imediato que a droga
proporciona.
O uso de drogas pode, de fato, agravar alguns
aspectos de personalidade borderline. Entretanto, o mais comum é que a
dependência química seja consequência de um conjunto de traços da personalidade
limítrofe. A personalidade do indivíduo o leva ao uso de drogas e não o
contrário. É essencial a conscientização nesse sentido, para que haja
engajamento e tratamento corretos.
Como tratar o TPB
O primeiro desafio parte do autoconhecimento
do indivíduo diagnosticado com o Transtorno de Personalidade Limítrofe. Ele
percebe que precisa de ajuda e enxerga uma necessidade de mudança?
Se sim, a possibilidade de evolução é mais
favorável. O desafio é manter a estabilidade do tratamento essencial para
recuperação. O tratamento pode ocorrer por diversas vertentes: psicoterapia,
medicação e hábito de vida saudável.
Entendendo a Psicoterapia
Apesar da importância de medicamentos, a
psicoterapia é a maior aliada no tratamento ao TPB. A partir dela, o borderline
tentará achar instrumentos no dia a dia para mudar ou moldar aspectos do
temperamento que causem angústia.
Existem duas modalidades com maior número de
resultados: a Terapia Psicodinâmica e a Terapia Comportamental Dialética. Ambas
demandam engajamento do indivíduo, com benefícios a médio e longo prazo. A
participação de familiares e amigos também é essencial no processo de
tratamento.
Medicamentos indicados para
o TPB
Em um segundo patamar, também pode se cogitar
o uso de medicamentos. Principalmente para lidar com a agressividade e
impulsividade. Remédios também são utilizados para tratamento da depressão,
comumente associada ao borderline.
Alimentação e hábitos de
vida saudável no tratamento ao Borderline
Além do tratamento psicoterápico e
farmacológico, borderlines podem buscar alívio dos sintomas por meio de hábitos
de vida saudável, como boa alimentação e prática de atividades físicas. Hobbies
também são importantes, atividades que não são terapias, mas são terapêuticas.
Se você tem algum amigo ou familiar com
Transtorno Borderline, ou foi diagnosticado com o TPB, a especialista do
Hospital Santa Mônica dá um conselho: "Aproveite os momentos bons, a
tranquilidade pode durar pouco. Muito equilíbrio. É importante estabelecer
limites. Não aceite o papel de vítima e nem de culpado demais. Incentive seu
familiar, amigo ou companheiro a procurar ajuda especializada e, se sentir que
precisa, procure ajuda também. Quem cuida e convive com pessoas com borderline
também pode adoecer”.