No Brasil, a cada 60 minutos, em média, pelo
menos cinco pessoas morrem vítimas de acidente de trânsito. Os desastres nas
ruas e estradas do País também já deixaram mais de 1,6 milhão de feridos nos
últimos dez anos, ao custo direto de quase R$ 3 bilhões para o Sistema Único de
Saúde (SUS). Os números fazem parte de um levantamento elaborado pelo Conselho
Federal de Medicina (CFM), que nesta semana realiza em Brasília (DF) um evento
nacional para entender esse problema que atinge proporções epidêmicas.
Para o
coordenador da Câmara Técnica de Medicina de Tráfego do CFM, José Fernando
Vinagre, os números mostram que os acidentes de trânsito constituem um grave
problema de saúde pública e que provoca sobrecarga nos serviços de assistência,
em especial nos prontos-socorros e nas alas de internação dos hospitais. “É
preciso reconhecer o importante aprimoramento da legislação ao longo dos anos e
também o aumento na fiscalização, especialmente após a Lei Seca. No entanto,
precisamos avançar nas estratégias para tornar o trânsito brasileiro mais
seguro”, destacou.
Segundo
a análise do CFM, a cada hora, em média, cerca de 20 pessoas dão entrada em um
hospital da rede pública de saúde com ferimento grave decorrente de acidente de
transporte terrestre. Ao avaliar o volume total de vítimas graves do tráfego
nos últimos dez anos (1.636.878), é possível verificar que 60% desses casos
envolveram vítimas com idade entre 15 e 39 anos, sendo menor a frequência nas
faixas etárias que vão de zero a 14 anos (8,2%) e em maiores de 60 anos (8,4%).
Outra constatação: quase 80% das vítimas eram do sexo masculino.
Mais vítimas – Entre 2009 e 2018, houve um crescimento de 33% na
quantidade de internações em todo o País. O pior cenário, proporcionalmente,
foi identificado no estado de Tocantins, que saiu das 60 internações, em 2009,
para 1.348, no ano passado (aumento de 2.147%). Na sequência aparece
Pernambuco, onde o salto foi de 725% na última década. Apenas cinco estados
registraram queda no número de internações por acidente de transporte: Maranhão
(redução de 40%), Rio Grande do Sul (22%), Paraíba (20%), Distrito Federal (16%)
e Rio de Janeiro (2%).
Em números absolutos, 43% do volume total de
internações registradas no SUS no período ficou concentrado em estados do
Sudeste, região que reúne também metade da frota de veículos automotores do País.
Outros 28% dos casos graves ficaram no Nordeste e o restante ficou diluído
entre o Sul (12%), Centro-Oeste (9%) e Norte (7%).
Para a
presidente da CFM, Carlos Vital, a solução para reduzir os acidentes depende de
uma série de fatores de prevenção, reforço na fiscalização e sinalização, além
de questões de infraestrutura e aprimoramento dos itens de segurança dos
veículos. “Neste contexto, os médicos desempenham papel fundamental nas
discussões sobre direção veicular segura. O impacto desses acidentes nos
serviços de saúde é alto. Leitos são ocupados, hospitais e médicos se dividem
no atendimento entre os acidentados e os que procuram assistência médica para
patologias que não poderiam prevenir, diferentemente dos acidentes de trânsito,
que podem ser reduzidos e prevenidos”, destacou.
Sobrecarga
para o SUS – Se por um lado
as tragédias no trânsito trazem dor e sofrimentos aos pacientes e seus
familiares, por outros elas também estendem suas consequências para o bolso dos
brasileiros. Na última década, as internações hospitalares decorrentes de
acidentes de trânsito consumiram cerca de R$ 2,9 bilhões do SUS, em valores
atualizados pela inflação do período.
Antonio Meira Júnior, diretor da Associação
Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) e membro da Câmara Técnica do CFM,
lembra que os custos com os acidentes de trânsito vão além das
hospitalizações. “Estamos falando de um custo médio de aproximadamente R$ 290 milhões
ao ano, que obviamente foi investido para salvar vidas, o que é justificável.
Se conseguíssemos diminuir o número de vítimas do trânsito, no entanto,
teríamos um impacto muito grande também nas contas públicas. São recursos que
poderiam ser direcionados para outras áreas prioritárias da assistência em
saúde no País”, pontua.
Estimativas
conservadoras, segundo ele, calculam em cerca de R$ 50 bilhões ao ano os gastos
com os acidentes, incluindo atendimento médico-hospitalar, seguros de veículos,
danos a infraestruturas, perda ou roubo de cargas, entre outras despesas. “É
preciso lembrar que existem outros custos envolvidos neste contexto, como o do
absenteísmo por doença (falta do trabalhar por atestado ou licença-saúde), com
auxílios doença e tudo o mais que o País tenha investido no indivíduo que veio
a óbito ou que ficou inválido em idade produtiva. Mais grave do que toda essa
matemática, porém, são as sequelas físicas e emocionais – muitas vezes
irreversíveis – que cada um destes acidentes deixa na vida das pessoas”.
Mortalidade
em queda – Segundo o
levantamento do CFM, que considerou ainda dados do Sistema de Informações sobre
Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, só em 2016 (ano mais recente
disponível), foram registrados 37.345 óbitos decorrentes de acidentes de
transportes terrestres. Embora a quantidade seja a menor registrada no período
analisado (2007 a 2016), o número de mortes tem avançado em alguns estados,
sobretudo das regiões Nordeste e Norte do País.
Na região Norte, a mortalidade por acidentes
subiu 30%. Da mesma forma, no Nordeste houve um crescimento de 28% dos casos.
No Centro-Oeste também houve aumento do indicador (7%), enquanto nas regiões
Sul e Sudeste apresentaram menor quantidade de óbitos em 2016, frente à 2007,
com queda de 15% e 18%, respectivamente.
Embora
os estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná liderem o ranking nacional em
números absolutos de mortes no trânsito durante os últimos dez anos, o Piauí
foi a federação que apresentou o maior crescimento proporcional no período:
56%. Em 2007, 670 óbitos haviam sido registrados naquele estado, número que
saltou para 1.047 dez anos depois. Na mesma proporção, de 56%, cresceram os
registros vítimas fatais no Maranhão no período. Ao todo, 16 estados
notificaram aumento desse tipo de agravo.
De
outro lado, o estado mais populoso do País informou queda na quantidade de
óbitos desta natureza. Em 2016 foram 5.740 mortes, 24% a menos que o indicado
em 2007 (7.550). No quadro nacional, também figuraram com redução significativa
de casos fatais no período os estados de Santa Catarina e Roraima, ambos com
queda de 23%; Distrito Federal (22%); e Espírito Santo (20%).