Casos como o da
inglesa que por questões de saúde foi impossibilitada de continuar amamentando
seu bebê e por isso fez um apelo na internet que conseguiu mobilizar três
amas-de-leite, despertam a atenção para a importância dos perigos da
amamentação cruzada. Contraindicado formalmente pelo
Ministério da Saúde e Organização Mundial da Saúde (OMS), a amamentação
cruzada, como é conhecida a prática de mães
que amamentam filhos de outras que apresentam alguma dificuldade com o
aleitamento, traz diversos riscos ao bebê, podendo transmitir doenças,
infecto-contagiosas, a mais grave, Aids. A pediatra do Instituto Nacional de
Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz)
Marlene Roque Assumpção esclarece as principais dúvidas sobre o método e
aconselha o que a mãe deve fazer caso tenha algum problema para amamentar o
filho.
Quais
são os perigos da amamentação cruzada?
O
perigo é o bebê ser contaminado por uma doença infecto–contagiosa, como a Aids,
que é uma doença crônica grave e ainda sem tratamento absoluto, sem cura. Por
exemplo, se uma mãe tiver hepatite B em atividade, e doar leite a outro bebê,
que não tenha ainda as doses da vacina suficientes (ou seja, não está
totalmente imunizado), ela poderá passar a doença para a criança, através do
leite materno, em caso de sangramento do mamilo por trauma mamilar.
Quando
a amamentação cruzada foi contraindicada?
Com
o advento da Aids, a partir de 1985, a amamentação cruzada começou a ser
contraindicada. Hoje, a contraindicação formal pelo Ministério da Saúde e pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) é para o HIV e o HTLV . Se a mãe tiver um
desses dois vírus não poderá amamentar. Neste caso, o seu filho terá que ser
alimentado conforme indicação do pediatra, conforme a idade que ele esteja.
O
que a mãe deve fazer caso não consiga amamentar?
A
primeira orientação é buscar ajuda junto ao seu médico, pediatra ou a unidade
onde teve o seu filho. Caso não consiga nenhum auxílio, a mulher pode procurar
um Banco de Leite Humano (BLH). No Rio, nós temos 17 bancos e no Brasil, 218.
Então, há uma disponibilidade muito grande para ajudá-la.
Qual
a diferença do leite do banco de leite para o leite de outra pessoa?
A
diferença fundamental do leite do Banco de Leite Humano para o leite doado
diretamente por uma outra mãe é que no BLH o leite é tratado, pasteurizado e,
por isso, isento de qualquer possibilidade de transmissão de doenças. A mãe não
deve amamentar outra criança que não seja o seu filho. Mesmo se esta mãe estiver
com os exames normais ou se teve uma gravidez tranquila, ela pode estar em uma
janela imunológica, e esse bebê correr o risco de contrair alguma doença.
Quais
são os outros benefícios da amamentação, além de evitar doenças?
O
leite materno é uma substância viva, adequada às fases de vida do bebê. A mãe
de um prematuro, por exemplo, terá um leite específico para um bebê naquela
faixa etária. Se o bebê estiver com alguma infecção o leite materno
vai produzir mais defesas para combater àquela infecção. O organismo da mulher
entende que precisa liberar mais anticorpos, mais células, mais defesas, para
proteger esses bebês e combater a infecção a qual está acometido.
As
vantagens do leite materno são inúmeras, tanto para a mãe quanto para o bebê.
Além de unir mãe e filho, evita a introdução precoce, de alimentos alergênicos.
Qual
o conselho que você dá às mães que estão com dificuldade de amamentar?
Para
saber o que está causando essa dificuldade, a mãe deve procurar um profissional
de saúde que possa ajudá-la ou procurar um BLH. A família ou a mãe sozinha
provavelmente não dará conta. Por mais que uma mãe tenha tido experiência boa
em uma amamentação, em outra gravidez, pode não ter na atual. Cada bebê é
diferente. Nem os gêmeos univitelinos são iguais.
Há
um medo nas mães do leite ser fraco. Isso pode acontecer?
Isso
é um mito. Não existe leite fraco, o que existe são momentos em que a mãe pode
estar produzindo menos leite, mas por falta de estímulo adequado. Ainda pode
ocorrer de o bebê estar mamando muito o leite anterior, ou seja, ele mama um
pouco em um peito e logo troca de lado. Não esvaziar a mama, pode não saciar a
criança, que fica sempre chorando e querendo mamar muitas vezes. Isso
deixa a nutriz angustiada e insegura. Desse modo, nunca chegará ao leite final,
que tem maior teor de gordura, fazendo o bebê engordar e dá saciedade,
possibilitando mais tempo entre uma mamada e outra. O leite anterior é ótimo, é
necessário, mas tem um teor de calorias menor.
Com
a preocupação atual com a Zika, a mãe que tiver suspeita de ter o vírus deve
parar de amamentar?
Não
se deve interromper o aleitamento materno e nem a doação de leite porque não há
evidências de que esse vírus seja transmitido pelo leite para o bebê. A mãe
deve continuar amamentando ou doando leite mesmo estando doente. Inclusive, ela
estará passando anticorpos, que são as defesas do bebê. O colostro, que é
aquele leite da primeira semana de vida é um leite diferente, específico, com
teor alto de anticorpos. Todos os anticorpos que a mãe tem no organismo de
todas as doenças que ela foi acometida durante a sua vida, serão passados para
o bebê através do leite. Chamado de primeira vacina do bebê. O primeiro
leite da mãe que está amamentando um bebê prematuro é ainda mais importante, pois
tem todos as defesas para o seu bebê, que é mais frágil.
Em
caso de dúvidas, procure o Banco de Leite Humano do IFF, de segunda a
sexta-feira, das 8h às 15h, ou entre em contato com o SOS Amamentação pelo
telefone 08000-26-8877.