Desafios incluem a aceitação pela liderança e pelos colaboradores da importância de se prestar atenção a questões de privacidade durante todas as etapas do negócio
O agronegócio é um dos principais setores do País
e, como tal, vem avançando e se reestruturando por meio da utilização de novas
ferramentas e tecnologia de ponta. O uso de novas tecnologias exige ainda um
maior cuidado a ser tomado em relação à coleta e tratamento de dados pessoais e
à adequação das empresas à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). A norma,
exigiu que as empresas fizessem adaptações para garantir um tratamento de dados
pessoais adequado e transparente e, para o agronegócio isso significa uma
mudança de cultura, pois muitas empresas do setor ainda registram dados de
forma informal sem os devidos cuidados necessários, e muitas vezes sem terem
uma base legal adequada para a realização do tratamento. Para Tania Liberman,
sócia do escritório Cescon Barrieu na área de tecnologia, proteção de
dados e propriedade intelectual, os dados pessoais podem estar presentes tanto
em meios eletrônicos quanto físicos, logo, até mesmo as empresas mais
tradicionais, que não se utilizam ainda de sistemas de tecnologia sofisticados,
precisam manter um programa de privacidade adequado.
De acordo com a especialista, como regras básicas
para as empresas de agronegócio que queiram começar a criar um programa de
adequação há passos que devem ser adotados:
- Realização de entrevistas
com os diversos departamentos da empresa, para a identificação dos dados
pessoais tratados, para qual finalidade esses dados são coletados e usados
e posterior registro desses dados em uma planilha ou sistema específico.
Durante as entrevistas deverão ser identificados, dentre outros itens,
quais os dados pessoais tratados, a forma de obtenção de tais dados, se
são dados sensíveis (e.g. dados relacionados a etnia ou saúde) ou não,
onde e por quanto tempo são armazenados, se são compartilhados com
terceiros, se são transferidos para fora do Brasil e quais as medidas de
segurança usadas para proteger esses dados. Com base nesse “mapeamento”,
um advogado deve ajudar a empresa a identificar qual a base legal que dá
suporte ao tratamento (a LGPD possui diversas bases legais para justificar
o tratamento de dados e nenhum tratamento pode ocorrer sem a existência de
uma base legal adequada).
- Elaboração de um Relatório
de Riscos e Plano de Adequação com as medidas que devem ser tomadas pela
empresa para iniciar o processo de adequação (e.g. treinamentos,
elaboração de políticas, aditivo a contratos, contratação de sistemas,
revisão de processos, etc.).
- Elaboração de políticas e
outros documentos que ajudem a empresa a cumprir com os requisitos legais,
e,g, política de privacidade e termos de uso do site da empresa, política
de privacidade para os colaboradores (onde a empresa especifica como
utiliza os dados dos colaboradores), plano de resposta a incidentes,
diretrizes de atendimento a pedidos de titulares, diretrizes para a
contratação de fornecedores, termos de consentimento para a coleta de
determinados dados; política de recrutamento e seleção e aditivos a
contratos com empregados, clientes e fornecedores para a inclusão de
cláusulas sobre tratamento de dados.
- Contratação de sistemas (se
necessário) que possibilitem que a empresa cumpra com os pedidos de
titulares (e.g. possa identificar e apagar ou corrigir todos os dados
pessoais de um titular que fizer um pedido nesse sentido).
- Nomeação de um Encarregado
de Dados (o “DPO”) que pode ser uma pessoa ou um comitê e que será o
principal responsável por questões relacionadas ao tratamento de dados na
empresa, realizar treinamentos, bem como por se comunicar com a ANPD e com
os titulares.
- Realização de treinamentos
periódicos para que os colaboradores tenham um entendimento adequado da
lei e dos seus conceitos básicos.
“Mais importante do que criar um programa formal de
privacidade apenas para cumprimento da lei, é estimular a cultura da
privacidade dentro da empresa e ter sempre a privacidade em mente quando for
criar novos produtos”, diz. Liberman explica, por exemplo, que uma empresa
tradicional de agro pode, após ter feito o mapeamento e adequado seus processos
existentes à LGPD, desenvolver um novo software que ajude a determinar o melhor
local para plantar com base em dados coletados diretamente de
agricultores. Para ela, esse seria um novo processo não incluído no
mapeamento original feito quando do projeto de adequação. “Quando da
criação desse novo produto, além de aspectos financeiros, comerciais, jurídicos
e outros, a empresa deverá também ter cuidado com questões de privacidade (como
serão coletados os dados, se é dada a devida transparência aos agricultores, se
os agricultores possuem meios adequados para exercerem os direitos previstos em
lei, etc.)”, recomenda.
Segundo a advogada, na prática, a adequação deve
ser feita e o programa de privacidade deve ser sempre mantido atualizado. “Além
disso, os colaboradores devem ser periodicamente treinados para estarem
atualizados sobre o programa e eventuais mudanças. Não adianta a empresa se
adequar e não realizar uma atualização periódica, pois, nesse caso, se um
incidente ocorrer no futuro, a empresa não terá condições de responder da forma
rápida e adequada”, conclui.
Cescon Barrieu
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