Questões ambientais estão sendo elevadas à prioridade na agenda de debate da retomada do crescimento econômico brasileiro em período pós-pandemia. Abertas manifestações de grandes banqueiros, empresários e economistas, muitos com influência política, estão fazendo coro com ambientalistas e organizações da área sobre a necessidade de preservação das florestas e de outros ecossistemas nacionais, entre eles, o pantanal e o cerrado.
Em âmbito externo, da mesma forma, estamos vendo
crescer uma percepção negativa sobre a imagem do Brasil quanto a desmatamentos
e manejos agropecuários que incluem extrativismos predatórios. Essa preocupação
internacional já está levando investidores a retirarem dinheiro de companhias
brasileiras, a exemplo do que ocorreu em julho, quando uma entidade finlandesa
de asset
management retirou cerca de 40 milhões de euros em investimentos de
uma grande empresa brasileira de carne, considerando suspeitas de que o
frigorífico fomenta o desmatamento ao comprar gado proveniente de terras
protegidas da Amazônia.
“O clima é uma preocupação financeira”, afirmou, no
início de 2020, a Royal Netherlands Institute of Chartered Accountants (NBA),
por meio de uma carta aberta. Além disso, a NBA divulgou recentemente
resultados de uma pesquisa feita com contadores holandeses sobre até que ponto
eles estão envolvidos no combate às mudanças climáticas e com a redução da
emissão de gases de efeito estufa, principalmente de CO2. A organização
holandesa chegou à conclusão de que os contadores devem assumir a responsabilidade
e iniciar uma discussão sobre o clima – recomendação que conta com o apoio do
Conselho Federal de Contabilidade (CFC) para o âmbito nacional.
Ainda, diante dos potenciais efeitos calamitosos
das mudanças climáticas, a carta “Convergência pelo Brasil”, assinada por
ex-ministros da Fazenda e ex-presidentes do Banco Central e divulgada em julho,
também traz a preocupação com a estabilidade financeira. Os riscos climáticos,
não apenas no Brasil, já estão sendo incluídos em análises macroeconômicas de bancos
centrais, enquanto mercados financeiros estão reconhecendo e precificando, de
forma transparente, esses riscos de longo prazo. Nessa carta, também é citada a
reprecificação dos ativos mais expostos às mudanças climáticas, com impactos
esperados na poupança privada e no mercado de capitais.
Inserindo a contabilidade nessa análise, vemos que,
atualmente, as demonstrações contábeis não expressam, de forma explícita, os
riscos climáticos aos quais uma entidade está sujeita, mas há vários relatórios
de sustentabilidade que descrevem ações das empresas para conter seus impactos
no meio ambiente.
O CFC formou dois Grupos Técnicos (GTs) para a
elaboração de uma minuta de Norma Brasileira de Contabilidade (NBC) sobre
Relato Integrado (RI) e sobre asseguração do RI. Essa minuta já passou,
inclusive, por análise de comissão constituída pelo Comitê de Pronunciamentos
Contábeis (CPC) e deverá ser colocada em audiência pública conjunta em breve.
Em relação à reprecificação de ativos mais expostos
às mudanças climáticas, a contabilidade tem instrumentos para refletir isso. Em
geral, os ativos estão sujeitos a alterações de valores quando da evidência de
perda permanente da capacidade de recuperação do investimento, como por
obsolescência, redução do valor justo ou outros, sendo que o fato gerador
desses eventos pode ter qualquer origem, inclusive, a ambiental. Contudo, hoje
ainda não existe a prática de distinguir essas origens.
Em relação às florestas brasileiras, a
contabilidade alcança apenas aquelas formadas para fins de exploração, como as
destinadas à produção de papel e celulose. Já as florestas nativas, a exemplo
da Amazônica, não são contabilizadas porque não existe um controle de todas as
espécies da flora e da fauna ali existentes, por isso não conseguimos identificar
e mensurar os benefícios que podem advir delas.
As florestas nativas são patrimônios públicos. Nas
áreas da Amazônia Legal, por exemplo, as terras que não têm nenhuma destinação,
como a floresta, as reservas indígenas e as áreas de conservação não são
registradas contabilmente no Balanço Geral da União (BGU).
Propostas de recuperação verde e sustentável da
economia brasileira, tendo por base a responsabilidade social e ambiental,
envolvem uma série de ações que poderiam trazer ganhos ao Brasil. Há estudos
que apontam essas evidências.
Discussões e alguns movimentos nesse sentido, no
entanto, ocorrem há algum tempo. Lembro-me do Protocolo de Quioto, que existe
desde 1997 e entrou em vigência há 15 anos. Embora o Brasil tenha se
comprometido quanto a reduções do nível de emissões, não temos visto muitos
resultados. Há compromissos assumidos também para o incentivo à produção de
biocombustíveis, para a emissão de créditos de descarbonização e até já há
proposta para a remuneração de proprietários de terras para manterem as
florestas, em vez de derrubá-las.
Infelizmente, até hoje essas iniciativas não
ganharam visibilidade e impulso suficientes para movimentar governos e mercados
de forma efetiva e provocar não apenas alterações de leis e de normas, mas o real
cumprimento delas. Agora, porém, temos a chance de mudar essa história.
O Conselho Federal de Contabilidade está disposto
não apenas a participar do debate, mas a contribuir para que o país possa
chegar a uma regulação que reconheça os créditos de carbono e, também, que
encontre técnicas de mensuração aceitáveis para identificar e mensurar os
benefícios ambientais gerados pelos recursos sob responsabilidade de uma
entidade, assim como os seus impactos ao meio ambiente.
Profissionais da contabilidade, “The Times They Are
a-Changin'”. É hora de nos mobilizarmos pelo meio ambiente.
Conselho Federal de
Contabilidade
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