Agosto. Dia 26. Uma data relevante para mim. Aniversário da minha mãe, nascimento do meu romance distópico “A Rainha Perdida” (Ed. Opala). Mas é também Dia Internacional da Igualdade Feminina e Dia Internacional dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Diferente dos aniversários, por que precisamos de
um dia que lembre tantos direitos?
Há mais de 2000 anos, o mundo era um lugar
horrível. O bicho “homem”, do sexo masculino, agia de forma irracional, sem
medidas, respeito pelo próximo ou ética. Mulheres, crianças, pobres, empregados
eram vistos como objetos, seres inferiores. Todos “escravos” deste “ser
horrendo”.
Mas o mundo evoluiu. Mulheres mostraram força.
Algumas se destacaram. Então, durante a Revolução Francesa, em 26 de agosto de
1789, é anunciada a Declaração Universal do Homem e do Cidadão. O Dia
Internacional da Igualdade Feminina nasce em 26 de agosto de 1920, quando os
EUA permitem o voto feminino.
O artigo 1º da declaração diz que os homens são
livres e iguais em direitos. Mas ainda existiam muitos “bichos homens” que
fingiam que o texto não se referia a “seres humanos”. Ainda era preciso lutar.
No Brasil, por exemplo, apesar de algumas mulheres terem conseguido votar e
eleger, no Rio Grande do Norte, em 1928, a 1ª prefeita brasileira, a mulher só
teve o voto reconhecido em 1932, com um adendo: mulheres casadas precisavam ter
a “permissão” dos maridos. A obrigatoriedade do voto feminino se deu, apenas,
em 1965. Na Arábia Saudita, este direito só foi liberado há 9 anos.
Bom, voltemos à declaração que deveria ser de
qualquer ser humano. Aprovada pela ONU, em 1948, a Declaração Universal dos
Direitos Humanos deixou isso bem claro. Todo ser humano é igual e livre, sem
distinção de espécie, raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política
etc. Caso você nunca tenha lido a Declaração da ONU, sugiro que o faça.
Mas, no Brasil, ainda precisava mais. Em 1990, precisou
do ECA. Sobre as mulheres, antes e depois de 1948, novas lutas garantiram ao
público feminino o direito de estudar; trabalhar fora; não ser tratada como
“propaganda enganosa” no casamento; não sofrer violência doméstica. Sem contar
outras leis contra o racismo e homofobia.
Olhando para o mundo atual, tive a ideia de uma
sociedade distópica onde a liberdade tivesse sido tirada não só fisicamente,
mas também moralmente, pois foi excluída até do dicionário. Há no livro uma
frase marcante: “Você não pode desejar o que não conhece”. E nisto se baseia o
governo autoritário de Aghaia. Mas é um governo que, metaforicamente, poderia
ser nossa sociedade. Todos seguem a Grande Lei e o povo acha que está correto
trabalhar 14 horas por dia, idosos serem levados pela Guarda da Assistência
porque estão doentes demais para continuar trabalhando, que basta a cada
família receber a dose de comida e educação que a Capital determina. É triste
pensar que Aghaia pode ser qualquer parte do mundo, pode estar aqui, no Brasil,
ou em qualquer país que manipula as leis à vontade dos governantes.
Lá nas aulas de Biologia, aprendi sobre a
hierarquia da classificação dos animais: reino, filo, classe, ordem, família,
gênero e espécie. Tinha uma sequência que era muito fácil de identificar. O
Reino Animal. Classe dos mamíferos. Ordem dos primatas (macacos e seres
humanos). Família dos Hominídeos. Gênero homo. Espécie Humano (ou Homo
Sapiens). Eis nós. Ser humano, “homem sábio”. Não lembro de serem citados a cor
de pele, classe social ou gênero feminino ou masculino. Aprendi que somos eu e
você (homem ou mulher; criança, adolescente, adulto ou idoso), todos seres
humanos. Todos sábios, iguais.
Não tiro o mérito dos tratados e leis que
conseguiram a igualdade das mulheres, crianças, raças. Mas isso tudo não vai
adiantar nada se não mudarmos a semente cerebral do “bicho ser humano”. Se
persistirem as discriminações e preconceitos, virá um novo século, e ainda
estaremos lutando contra o que é humanamente hediondo.
Acredito que está na hora de mudarmos nosso foco de
luta. Porque, hoje, o “bicho ser humano” continua sendo racionalmente um ser
irracional. As diferenças nos tornam únicos, especiais e capazes de mudar o
mundo e se conectar com o próximo. A igualdade pela qual precisamos lutar hoje é
que tenhamos seres com a mesma educação, bom senso, ética, respeito e empatia.
Isto nos iguala a seres humanos. Qualquer coisa diferente é bicho irracional.
Ana Cristina Melo - uma escritora carioca, com 20
livros publicados, e acaba de lançar A Rainha Perdida pela Editora
Opala. É também publisher do Grupo Editorial Bambolê.
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