O atraso grita no silêncio, fala aos olhos e expressa escolhas. Há muitos anos o Brasil, por avenidas tão largas quanto indiretas, vem optando pelo atraso.
A história dá vida aos nossos equívocos.
Tem sido sistematicamente audível a opção preferencial dos brasileiros por uma
ideologia que fala enternecida sobre os pobres e os produz em proporções
demográficas. Por isso, com aquelas inexpugnáveis certezas que a análise
marxista estabelece, politizamos todo o ambiente cultural. Impuseram-nos
associações mentais entre o privado e a ganância, entre o público e a
solicitude, entre igualdade e justiça. E disso redundou uma inexcedível fé no
Estado. Reverenciamos quem pretende acabar com a pobreza mediante farta
conversa fiada e tal discurso eleva o orador a um padrão moral superior.
Quantas vezes, falando entre pessoas esclarecidas, percebi entranhado nelas o
conceito de que o igualitarismo seria um desejável horizonte para a organização
social!
Durante décadas me incluí entre os raros
autores brasileiros a combater aquelas ideias.
Tempos em que “liberal” e “conservador” eram xingamentos. Tempos em que
ser “de direita” definia um tipo marginal da política. Roberto Campos estava
errado. Meira Penna estava errado. Leonardo Boff e João Pedro Stédile estavam
certos. Sobre isso nascia e crescia o ruído. Mas o atraso vinha de arrasto,
silencioso.
É hora de abrir as janelas! Observem as
economias desenvolvidas e as que saíram do atraso e cresceram mediante opções
pela prosperidade, pelas potencialidades de seu próprio povo. E nós, país onde
a pobreza parece ser objetivo e a riqueza um mal dispensável e desprezível,
ostentamos um Índice de Desenvolvimento Humano que nos coloca em 79º lugar
entre os povos da terra. Nosso índice de liberdade econômica nos guarda a
posição 153 entre 180 países.
Sobre o silêncio do atraso, dá vontade
de gritar o nome de Irineu Evangelista de Souza, nosso Barão de Mauá, o maior
empreendedor de nossa história. Defensor do liberalismo econômico, empregava
operários, combatia a escravidão, construía as próprias ferrovias e hidrovias,
criou indústrias e empreendimentos comerciais em vários países, abriu o próprio
banco e alcançou tamanha fortuna que o balanço de suas empresas se tornou muito
maior do que o orçamento do Império. Fez-se o silêncio sobre o que sobreveio às
pressões que o destruíram.
As últimas décadas adubaram o atraso. As
ideias de liberdade foram sistematicamente sepultadas em favor de um Estado de
porte crescente. Teoricamente, na Constituinte de 1988, o Brasil comprou o
projeto de sair da pobreza mediante a constitucionalização de um Estado de Bem
Estar Social. Sim, fizemos isso! Para sustentá-lo instituíram-se novos
impostos, tomando dinheiro da sociedade, que ficou mais pobre e, na sequência,
crescentemente endividada através do Estado. Como é que não o previmos?
O
atraso é silencioso. A ruptura com a tradição, também. A burrice, contudo, é
estridente. Vivemos dias decisivos. São grandes as possibilidades de
recuperarmos as liberdades que perdemos para o Estado e de buscar os valores
morais que, tombados no caminho, nos tornaram ridiculamente liberais em tudo
que não convém, sob a servidão do politicamente correto.
Finalmente,
creio, o atraso se faz ouvir.
Percival Puggina - membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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