Aqueles que desenvolvem adequadamente as chamadas
soft skills (habilidades comportamentais) duplicam seu rendimento nas hard
skills (habilidades técnicas), aponta um estudo desenvolvido pela McKinsey
& Company, renomada consultoria empresarial americana. Em outras palavras,
os desempenhos escolar, acadêmico e profissional são potencializados pelas
habilidades socioemocionais como criatividade, pensamento crítico, empatia,
afeto, tolerância, colaboração, resiliência, positividade, liderança,
comunicação interpessoal, gestão do tempo, resolução de problemas, etc.
Deste modo, não foi coincidência quando na
atmosfera de bits e bytes do Vale do Silício – onde estivemos há poucos meses
em visita oficial a nove empresas que desenvolvem conteúdos e produtos
educacionais – a expressão mais ouvida por nós foi soft skills. O recado é
eloquente em meio a tanta tecnologia: o desenvolvimento cognitivo é importante,
porém o ambiente abundante em habilidades socioemocionais traz produtividade,
felicidade e inovação. De fato, o Silicon Valley é apontado por pesquisas como
a região dos EUA mais feliz para se trabalhar, detém o menor índice de
criminalidade e tem maior diversidade étnica – cerca de 40% dos que lá
trabalham provêm de mais de 60 países.
Até a década de 1980 reinavam absolutos os testes
de QI (quociente de inteligência) para mensurar a aptidão acadêmica dos
estudantes ou o potencial dos funcionários de uma empresa, razão pela qual quem
tinha QI aquém de 80 era alvo de pilhérias e bullying. Foi então que surgiu a
teoria das Inteligências Múltiplas, tendo à frente Howard Gardner, professor e
psicólogo da Universidade de Harvard, que investiu sua ira santa contra os
testes de QI, e uma significativa transformação aconteceu na psicologia da
aprendizagem e, mais tarde, no ambiente corporativo.
Os testes de QI, criados em 1905 pelo pedagogo e
psicólogo francês Alfred Binet, basicamente mensuravam as aptidões
linguísticas, motoras e de raciocínio lógico. Gardner, por sua vez, deu um novo
enfoque a estas três habilidades e propôs mais seis: interpessoal,
intrapessoal, artística, espacial e, mais recentemente, a naturalista e a
existencial. Hoje incorporadas e valorizadas nos mundos acadêmico e
corporativo, conquanto o maior mérito de Gardner foi reconhecer como tipos de
inteligência a interpessoal (empatia, capacidade de se relacionar bem com
outras pessoas, liderança, etc.) e a intrapessoal (virtudes, autoconhecimento,
ética, etc.). Destas decorrem avanços, mas em boa parte não passam de variações
semânticas.
A teoria gardneriana tem por fulcro duas premissas
básicas: as pessoas são dotadas de inteligências diferentes (as nove já
enunciadas) e, apesar de admitida a herança genética, elas podem e devem ser
desenvolvidas – pelos estímulos do ambiente, família, escola e pelo esforço
pessoal. Todos temos potencialidades e limitações. Einstein, por exemplo, foi
reprovado nas disciplinas de humanas, quando buscou o ingresso na Escola
Politécnica de Zurique, porém conseguiu a vaga pelo elevado desempenho em
matemática e física. Picasso, por sua vez, foi um péssimo aluno nas disciplinas
de exatas, porém um gênio nas habilidades artísticas. Assim, Goethe se faz
oportuno quando afirma: “nem todos os caminhos são para todos os caminhantes”.
Gardner esteve em Curitiba em 2009, a convite da
Universidade Positivo, e fui agraciado como um dos 100 educadores convidados.
Afável e empático, o seu primeiro gesto antes de iniciar a palestra foi abrir
as cortinas e saudar o sol ainda titubeante daquela congelante manhã de inverno
curitibano. E, ao final, quando lhe perguntaram qual a habilidade mais admirada
no mundo contemporâneo, deu-nos a impressão de que hesitou como se tivesse que
escolher das nove filhas a mais bela. Porém, não ficamos sem resposta: “é a
combinação do pensamento lógico com a capacidade de lidar com as pessoas”. E
finalizou: “inteligência é a capacidade de resolver problemas”.
Jacir Venturi - foi professor e diretor de escolas
públicas e privadas e é coordenador da Universidade Positivo.
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