Por que, mesmo com
uma lei que ampara algumas necessidades das estudantes gestantes, as
instituições de ensino superior têm dificuldades em atender suas necessidades?
Cada vez mais se é discutido na sociedade a questão
da inclusão de diferentes grupos de pessoas, tanto nas escolas quanto nas
universidades. Os pontos são muitos, desde como receber quem tem dificuldade de
aprendizado, ou sobre o fator de diferença socioeconômica, as cotas raciais,
entre outros assuntos. Mas algo que é negligenciado e pouco pensado, em
especifico pelas universidades, é sobre como as estudantes grávidas enfrentam
dilemas e situações que são pouco noticiadas e tratadas sobre o ponto de vista
dos aparelhos legais, em termos de lei.
A importante fala dos direitos e igualdade das
mulheres deve expandir e alcançar muitos outros pontos como o da questão da
mulher gestante dentro da universidade. Existe a maternidade e existe o desejo
de ingressar no mercado de trabalho, no envolvimento do saber e da ciência e de
futuramente exercer uma carreira, não só pela autoestima, mas para colaborar
com os custos familiares, da vida social e de contribuir com a sociedade.
É relevante destacar que existe a lei 6.202, datada
de 1975, que oferece certa proteção às estudantes grávidas, curiosamente
sancionada no regime militar. Na ocasião, o ex-presidente Ernesto Geisel
decretou que a partir do oitavo mês de gestação a estudante ficará assistida
pelos exercícios domiciliares, sem a obrigatoriedade de frequentar as aulas e
sendo abonada das faltas. Mas, desde então, nunca, em nenhum momento, veio do
congresso qualquer reavaliação sobre as questões que envolvem esse nicho da
sociedade.
Para quem conhece essa demanda nas universidades,
essa é uma lei de extremo interesse para as mulheres. Fato que vemos é que as
instituições de ensino superior não estão entendendo direito esse dilema das
estudantes gestantes, como se a maternidade fosse um assunto que nem deveria
acontecer no período acadêmico.
Mesmo com uma lei que de amparo, questões que
deveriam ser simples, como o abono das faltas se tornam complicações nas
universidades. É óbvio que essas estudantes levam atestados médicos, sendo
difícil falsificar uma gravidez. Em um parágrafo único da lei de 1975, no
artigo 2, temos que “Em qualquer caso, é assegurado às estudantes em estado de
gravidez o direito à prestação dos exames finais”, dando o direito, não só de
não ter que pagar pelas faltas, mas também de participar do exame final.
Ficando facultativo a universidade e aos professores fazerem esse acerto
diretamente com as estudantes gestantes.
Os exames finais se tornam outro problema na vida
das mulheres grávidas, devido as universidades executarem essas provas
desconectadas do período das atividades domiciliares e àss vezes, muito depois
que a licença maternidade termina, o que atrapalha o desempenho da estudante.
Então o que está de fato ocorrendo? Hoje um dos
temas mais instigantes que permeia essa pauta é a da justiça. E quando o ser
humano se sente injustiçado, se sente também ferido e acabado. Aristóteles
dizia em seu famoso tratado de ética a Nicômaco: o que é a justiça? Dar a cada
um o que é seu, tratar os iguais igualmente e os desiguais desigualmente. Nesse
sentido é preciso entender o que é justo. Não dá para responder com isonomia,
“mas os outros alunos fazem assim. Tem que fazer a prova”, já que se trata de
um caso específico de uma pessoa que não pode comparecer nas aulas por ser uma
gestante. Da mesma forma que ela faz lições para cobrir as ausências
involuntárias de aula, se deve pensar em uma forma de substituir a forma de
avaliação final, uma apresentação de trabalho, por exemplo. Dessa forma
seriamos justos na ótica aristotélica.
Exigir de uma gestante que falte as aulas por um
tempo, faça exercícios domiciliares e depois de um tempo seja chamada para
fazer uma prova, sem considerar que ela não assistiu às aulas como os outros
assistiram é errado. Essa é uma forma muito triste de atender esse nicho.
Nenhuma mãe é negligente com a faculdade. Talvez a
faculdade hoje está insensível com essas mães universitárias. É preciso que as
instituições acadêmicas comecem a ser mais humanas e tratem o tema com o seu
devido respeito, com a garantia que a lei deu para com a falta e com o mínimo
de razoabilidade em seus regimentos internos. Porque ao se defenderem falam que
o regimento interno diz que não podem fazer as avaliações de forma diferente.
Mas o regimento interno, internamente se resolve e se retifica.
Soluções? Se pode começar com a manutenção do abono
e as faltas serem substituídas por exercícios domiciliares, além de um ponto
facultativo para cada professor na realização do exame final. Nessa situação
circunstancial também é necessário deixar mais claro para as estudantes fazerem
um trabalho que substitua as provas. E se cada faculdade quer fazer a prova,
que cuidem para fazer uma prova especifica próxima do trabalho domiciliar que
foi feito e entregue. E não deixar que o semestre dessas estudantes seja
perdido, causando um desconforto e uma sensação de culpa pelo simples fato de
ser mãe.
Rabino Samy Pinto é formado em
Ciências Econômicas, se especializou em educação em Israel, na Universidade
Bar-llan, mas foi no Brasil que concluiu seu mestrado e doutorado em Letras e
Filosofia, pela Universidade de São Paulo (USP). Foi diretor do Colégio Iavne,
por 22 anos. O Rav. Samy Pinto ainda é diplomado Rabino pelo Rabinato chefe de
Israel, em Jerusalém, e hoje é o responsável pela sinagoga Ohel Yaacov, situada
no Jardins também conhecida como sinagoga da Abolição.
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