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segunda-feira, 1 de abril de 2019

Autismo: O mundo é muito maior que um simples diagnóstico


O depoimento de uma mãe sobre o que mudou na vida da família depois que o filho foi diagnosticado com TEA - Transtorno do Espectro do Autismo 


Quando ele nasceu, como qualquer outra família pedimos à Deus que ele tivesse saúde pro resto da vida.   

Ele foi crescendo, se desenvolvendo, estava cada dia maior e mais pesado! Que alegria! Os marcos de seu desenvolvimento foram todos passados com louvor! Apontava os objetos, olhava quando era chamado, andou poucos dias após o seu aniversário de 1 ano. Tudo corria na mais perfeita ordem.  

Perfeita ordem? Existe isso? Mal sabíamos que o normal não, necessariamente, é o certo para nós, que fora da vida em que vivemos, existem tantos outros “universos particulares” e que cada um segue sua vida dentro das suas limitações.  

Limitações? Existe isso? Mal sabíamos que as limitações para uns são exatamente o que precisam para ser feliz!  

Ser feliz? Existe isso? Mal sabíamos que nas pequenas coisas, nas pequenas atitudes e nos pequenos avanços, podíamos ser mais felizes que muitos ganhadores de oscars.  

Ele foi crescendo, e, a partir de seus 18 meses percebemos que algo estava errado! Ele não falava nada, pouco emitia sons, começamos a perceber que ele batia muito os braços quando estava muito feliz ou ansioso, começou a chorar e gritar mais do que sempre fez. Chamar a mãe ou o pai, só aos gritos de “ouuuuuuuuu”. Bom, percebemos que alguma coisa que não estava correndo bem!  

Conversamos com um conhecido, com outro e sempre as mesmas falas, “ele é muito mimado”, “vocês fazem tudo o que ele quer, falar pra que?”, “coloca na escola, vocês vão ver, vai falar rapidinho.”   

Quando ele completou 20 meses colocamos na escola. “Agora tudo será resolvido!” O tempo foi passando e nada, a escola nos chamou, fez milhares de apontamentos e até diagnósticos deram. 

Respirar fundo e pensar! Era só o que fazíamos para tentarmos manter a calma. Principal hipótese, autismo!   


A partir daí começamos a girar em torno do nosso rabo, desculpem a expressão. Conhecemos vários médicos, vários especialistas e cada um dizia uma coisa. Resultado: estávamos perdidos.  

Perdidos pois já tinham colocado um rótulo no nosso filho, porém não sabíamos como lidar com tudo isso e não encontrávamos pessoas que aliviassem, explicassem ou até entendessem a nossa dor.  

Foi aos 3 anos e meio que veio o laudo definitivo, dado por uma equipe multidisciplinar da universidade de SP. Estava lá, escrito, no papel, na nossa testa e na cara dele, aquele rótulo, AUTISTA.  

Como todas as famílias passamos por um período de luto, só quem recebe esse diagnóstico sabe o que estou falando, mas não durou muito não. Fomos à luta! Vamos fazê-lo desenvolver seu melhor! O nosso primeiro objetivo era que ele falasse.  

Fomos para fonoaudiólogos, psicólogos, neurologistas, todos que vocês possam imaginar, mas ninguém entendia o nosso filho. Ele era diferente, nem pior, nem melhor do que o filho de ninguém, apenas diferente. Ele funcionava de uma maneira atípica e isso fazia com que os olhares das pessoas fossem todos para ele, sempre!  

Não desistimos, corremos atrás sem pensar, vimos a necessidade de ter especialistas em autismo por perto, uma vez que percebemos que a maioria dos profissionais não estava preparada para atender crianças com esse diagnóstico. Fizemos terapia fonoaudiológica, equoterapia, musicalização, esportes diversos... fomos incansáveis.  

Aos 4 anos ele começou a falar e a se comunicar com os amigos e conosco!!! Que alegria, uma etapa vencida, meu filho conseguia falar para o mundo o que ele sentia! Foi um divisor de águas em nossas vidas.  

A partir disso, a socialização dele na escola mudou, ele começou a ter amigos, a brincar com eles, porém o que não mudava era o modo dele encarar o mundo, de viver a vida.  

Começamos a perceber que ele não dava importância para as coisas sofisticadas, para o ter, e sim para as coisas simples da vida, se tornou um menino doce, querido por todos, pouco reclamava, pouco pedia, mas muito falava, meu Deus, como falava.   

Foi em uma dessas conversas intermináveis que ele disse que o presente mais especial que havia ganhado em seu aniversário, era o pijama que ganhou do melhor amigo. Em meio a vídeo games, ipads, brinquedos caríssimos que ele tinha, o melhor presente era aquele que o amigo que ele tanto amava tinha dado.  

Foi aí que cansamos de correr atrás de médicos e equipes que não sabiam como tratá-lo e fomos atrás de equipes especializadas em TEA, em pessoas que confiávamos. Queríamos entender o mundo em que o nosso filho vivia.  

Para a nossa surpresa, a equipe decidiu tirar o diagnóstico de TEA dele! Choramos de alegria, de alívio, de agradecimento. Porém, naquele momento, não nos demos conta que não era o diagnóstico do nosso filho que importava, que não era como chamavam ele e sim o que ele e nós sentíamos e como ele era tratado.  

Crescemos, amadurecemos, sofremos, vivemos cada segundo com um peso de um nome em um papel: AUTISTA.  

Se ele é ou não, ainda temos dúvidas, mas o que mais importa é que aprendemos a não submeter nosso filho a um simples diagnóstico, o diagnóstico é muito importante para direcionar a família, mas não para aprisioná-la.  

Com tudo isso que contei, quero deixar para quem está lendo e que tem um filho com diagnóstico de TEA, de que o mundo é muito maior do que um simples diagnóstico. Que temos sempre que correr atrás do melhor para os nossos filhos, mas que nunca podemos permitir que limitem suas conquistas e seus aprendizados. Temos sempre que correr atrás para que tudo seja feito da melhor maneira para eles.  

Que sejamos todos respeitados e que tenhamos nossos direitos garantidos seja lá qual cor, qual religião, qual orientação sexual ou qual diagnóstico tenhamos. O mundo é de todos e para todos. 

Necessitamos com urgência que os profissionais envolvidos com o transtorno do espectro do autismo, professores, fonoaudiólogos, médicos e psicólogos, sejam capacitados para lidar com pessoas como o meu filho.  






 Renata Haddad - pedagoga, pós-graduada em Neuroeducação com ênfase em Transtorno do Espectro do Autismo e mestranda em Distúrbios do Desenvolvimento – área voltada para a capacitação de professores para educação inclusiva.


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