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quarta-feira, 7 de março de 2018

Com quais cores o Rio de Janeiro está sendo pintado?



 O dia 16 de fevereiro de 2018 ficará marcado na história do Rio de Janeiro (RJ). Só não se sabe com qual cor! Naquela data, o atual Presidente da República Federativa do Brasil, Michel Temer, decretou intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro, com base no art. 34, III, da Constituição Federal (pôr termo a grave comprometimento da ordem pública), após reunião de urgência realizada com autoridades do Estado, inclusive com o Governador, Luiz Fernando Pezão. Segundo informações veiculadas na mídia nacional, Pezão havia dito que a medida pleiteada em reunião com Temer seria, na verdade, a ampliação da Garantia da Lei e da Ordem (GLO), já instaurada no Estado. No entanto, o governo o havia convencido de que a intervenção se fazia necessária. Entre idas e vindas políticas, a autonomia estatal foi afastada temporariamente, conforme determina a “Constituição Cidadã”.

A intervenção federal, com base no já citado dispositivo constitucional, foi pensada para afastar a autonomia política e administrativa dos entes da federação nacional, em situação considerada crítica, assim entendida como aquela na qual a unidade federativa declara sua incapacidade momentânea de gerir a coisa pública. Esse afastamento pode ser solicitado pelos Poderes Legislativo ou Executivo, estatal ou distrital (no caso do Distrito Federal), ou ainda requisitado pelo Supremo Tribunal Federal, especialmente para prover a execução de lei federal ou de decisão judicial. Além disso, a intervenção, para ser efetivada, precisa da aprovação do Congresso Nacional (controle político), salvo nos casos dos incisos VI e VII do art. 34 da CF. Percebe-se que a população local não é provocada a se manifestar. Nem daria tempo, dizem alguns, pois se trata de situação crítica e emergencial. De fato! Mas crítica e emergencial por quais motivos? Em outras palavras, o que determinou que a situação se tornasse crítica, exigindo, portanto, um ato federal interventivo?

A cidadania, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, II, da CF), baseia-se, atualmente, na possibilidade de o cidadão, pertencente a uma comunidade política, participar multiculturalmente de várias entidades estatais, nas suas mais variadas esferas, inserida obviamente em uma conjuntura social que a própria Constituição garante. Há novas dimensões de cidadania que a sociedade não mais ignora. Pelo menos não deveria! Nessa esfera de atuação cidadã insere-se a autonomia estatal, subordinada, como se percebe do texto constitucional e das decisões políticas nacionais, ao Estado brasileiro, cujo poder maior pertence ao próprio povo, e não ao Presidente. Pensar em decisões da magnitude de uma intervenção federal como realizada no estado do RJ, que de fato foi alcançada conforme procedimento estabelecido em nossa Constituição, requer um olhar mais cuidadoso e apurado, principalmente no que diz respeito à participação popular no processo decisório estatal, antes que se chegue às situações críticas que a CF estabelece.

 O Rio de Janeiro vem de um longo período de insegurança pública, econômica e social, decorrente de uma série de fatores, dentre eles a falta de representatividade dos interesses sociais locais, notadamente na esfera dos direitos fundamentais. Aliás, vale lembrar que, durante a intervenção federal, esses direitos, consagrados em nossa Constituição, além dos decorrentes de princípios e do regime democrático e dos tratados internacionais adotados pelo Brasil (art. 5º, §2º, CF), deverão ser rigorosamente respeitados, de modo que a população fluminense não só precisa ser ouvida durante esse período (o Decreto estabeleceu a intervenção até 31 de dezembro de 2018), como em todos os momentos e decisões que envolvam a vida do estado, para que somente assim a história do Rio de Janeiro seja marcada com cores que condizem com seu status de “Cidade Maravilhosa”, ou seja, como pretendia Tucídides, historiador grego (465-395 a.C.), a justiça somente será alcançada quando os não injustiçados se tornem tão mais indignados quanto aqueles que de fato o são.






Pedro Vítor Melo Costa - professor de Direito Constitucional e Direitos Fundamentais da Universidade Presbiteriana Mackenzie 


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