Cirurgião conseguiu debelar infecção fúngica muito agressiva de paciente e reconstruir osso através de tecnologia de atração de células tronco
Um
caso raríssimo de osteomielite fúngica no maxilar, causado por mucormicose,
surgiu no Paraná. O fungo, que muito rapidamente causa necrose no osso do
paciente, aconteceu com um homem de 41 anos, morador de São Lourenço do Oeste
(SC). Ele foi atendido e tratado pelo cirurgião maxilo-facial André Zétola, do
Instituto Zétola, em Curitiba. Em uma grande parte dos casos, a doença atinge o
sistema nervoso central, chega ao cérebro e leva o paciente a óbito muito
rápido. O sucesso do tratamento utilizando células-tronco é algo tão raro que
chamou a atenção da comunidade médica internacional e está sendo o centro de
estudos internacionais.
"Essa
doença é extremamente rara e agressiva, necessitando de um tratamento rápido e
eficaz. Em um primeiro momento conseguimos debelar a infecção fúngica,
preservando a vida do paciente. E num segundo momento, conseguimos reconstruir
todo o osso maxilar dele usando suas próprias células-tronco, o que é uma
abordagem inovadora e bem-sucedida. Casos assim reforçam a importância de um
diagnóstico precoce, além de ação imediata do cirurgião e da habilidade técnica
na condução do tratamento”, explicou Zétola.
O
paciente, Ricardo Fratin, se emociona ao falar da forma imediata com que foi
atendido e que fez toda a diferença para salvar sua vida. “Eu cheguei em
Curitiba numa terça-feira 23h. O doutor já estava me esperando com toda uma
equipe, me encaminhou imediatamente para exame e para internamento. Às 6h da
manhã do outro dia eu estava na mesa de cirurgia operando”, disse o paciente.
A
osteomielite fúngica no maxilar é muito rara e causa a necrose do maxilar,
trazendo perda óssea e, consequentemente, a perda dos dentes. Os dados sobre a
prevalência da doença no mundo não são precisos. Mas estima-se que são no
máximo 10 mil casos por ano no mundo, exceto a Índia, onde a prevalência da
doença é muito maior por questões de saúde pública locais. A estimativa é da Leading
International Fungal Education (LIFE), publicada
pelo National Center for Biotechnology Information. E a taxa de
mortalidade é alta e pode chegar a 46%.
No
Brasil, conforme o Ministério da Saúde, de
janeiro de 2018 a junho de 2021 foram registrados 157 casos de mucormicose no
país. A estatística brasileira não é só de casos
maxilares, mas de todos os tipos de mucormicose em vias nasais e mucosas
orofaciais.
Baixa
imunidade
A
mucormicose, comumente encontrada em ambientes como solo, bolor de pães,
vegetais e frutas em decomposição, raramente afeta pessoas saudáveis. Contudo,
indivíduos com imunidade comprometida, como aqueles com diabetes, HIV ou em
tratamento quimioterápico, são mais suscetíveis. Há também relação da
disseminação do fungo em pacientes imunossuprimidos por questões psicológicas,
como foi o caso do paciente atendido por Zétola, que teve uma depressão profunda
por perdas pessoais.
O
homem, na época com 34 anos, chegou ao Dr. Zétola, no ano de 2017, com dor e
amolecimento nos dentes. Fazia apenas 21 dias que ele tinha feito uma cirurgia
para desvio de septo e sinusite crônica e acredita-se que foi a partir da
cirurgia que se instalou a mucormicose. Além da necrose, são também sintomas
comuns da doença (comumente confundida com sinusite) a febre, dor de cabeça,
letargia, celulite facial, parestesia, secreção nasal e cornetos necróticos.
![]() |
Para salvar a vida do paciente, médicos rasparam todo o osso maxilar, pois o fungo necrosou o osso até próximo da cavidade nasal. Divulgação / Instituto Zétola |
Neste atendimento inicial, Zétola já constatou pelo menos 10 milímetros de perda óssea no dente central e, após cirurgia para retirada do osso necrótico, o material foi enviado à análise para verificar qual tipo de osteomielite acometia o paciente.
Em
poucas semanas, veio o resultado da biópsia, de osteomielite fúngica. A
infecção progrediu rapidamente, destruindo o osso maxilar e o assoalho nasal e
acometendo todos os elementos dentários superiores. Desta forma, o cirurgião maxilo-facial André Zétola e o otorrinolaringologista
Marco Cesar Jorge dos Santos realizaram nova cirurgia de emergência para
remover o tecido infectado, no Hospital IPO. Todo o osso maxilar foi removido
até a altura do assoalho do seio maxilar e o assoalho nasal, para preservar a
vida de Ricardo, pois o fungo chegou muito próximo da cavidade nasal. Sem
sustentação óssea, as bochechas do paciente “entravam” na boca e o nariz ficou
caído.
Logo
após a cirurgia, o paciente foi encaminhado à UTI do Hospital VITA Batel, em
Curitiba, na qual o médico intensivista Rafael Deucher lançou mão da
Anfotericina. Foram dias de internação em tratamento intravenoso. Após
erradicar a infecção, Zétola utilizou um fator de crescimento que atraiu
células-tronco do próprio paciente para promover a regeneração óssea. Em um
período de seis a oito meses, o osso do maxilar se reconstruiu sozinho, o que
permitiu a colocação de implantes dentários.
Mais
raro do que a prevalência da doença no mundo foi o sucesso da técnica com
células-tronco utilizada pelo cirurgião, para devolver ao paciente a
sustentação do rosto e o sorriso, que hoje é extremamente natural e não dá
nenhuma pista do que ocorreu.
Estudo
internacional
A
complexidade e a gravidade deste caso específico tornam-no um marco
significativo no campo da odontologia e da cirurgia maxilofacial, destacando a
expertise e a inovação do Instituto Zétola e sua equipe no tratamento de
condições raras e potencialmente fatais.
A
condição da osteomielite fúngica no maxilar é tão rara que virou um caso de
estudo internacional, publicado na revista científica Journal of
Contemporary Diseases and Advanced Medicine (JCDAM).
A primeira etapa do estudo, mostrando o alastramento do fungo antes da segunda
cirurgia de remoção óssea, foi publicada na edição de Maio-Agosto
de 2022. Já o segundo artigo, mostrando a
regeneração óssea por células-tronco e após a colocação das próteses em Ricardo
deve ser publicada em breve na revista.
![]() |
Revista JCDAM, onde foi publicado o caso raro de osteomielite fúngica do maxilar em Curitiba. |
Nenhum comentário:
Postar um comentário