Casa Hunter, associação de pacientes, chama atenção
para a colestase intra-hepática familiar progressiva (PFIC), doença genética
ultrarrara que leva ao acúmulo de bile no fígado podendo causar até mesmo
cirrose hepática1
Quando
tinha apenas 17 anos, a farmacêutica Larissa Cazumbá, hoje com 30 anos, começou
a sentir coceiras intensas, principalmente nas mãos e pés, acompanhadas de
fadiga persistente. Sem melhora, a jovem recorreu a dermatologistas. “Na época,
eu fiz diversos exames que não revelaram anormalidades. As coceiras eram
tamanhas que passei a ter feridas pelo corpo, além de prejudicar meu sono e
vida social. Os tratamentos prescritos não surtiram efeito. O meu diagnóstico
de colestase intra-hepática familiar progressiva do tipo 3 ou PFIC3, que faz
parte de um grupo de doenças que causam alteração do fluxo da bile, veio apenas
aos 29 anos de idade”, relembra Larissa.
Após
anos convivendo com coceiras, foi somente em uma consulta com um hepatologista,
depois de realizar um transplante de fígado devido à cirrose, que Larissa soube
da possibilidade da manifestação da PFIC3. Na ocasião, ela mencionou ao médico
uma situação que sua irmã passou há 12 anos, no mesmo período que ela começou a
sentir coceira. “Durante a gravidez, minha irmã sentiu uma coceira bem intensa.
Os exames dela indicavam alguma irregularidade no fígado, porém os obstetras
não conseguiam diagnosticá-la”, conta. No sétimo mês de gestação, o estado de
saúde de sua irmã se agravou e foi preciso realizar o parto prematuro. “Depois
disso, ela nunca mais sentiu nada. Diante deste meu relato, o especialista logo
suspeitou que poderia se tratar de PFIC3, pelo fato de, entre outras questões,
outros familiares terem manifestado os mesmos sintomas. Fizemos um exame
genético que confirmou a doença”, finaliza.
O
médico gastroenterologista e coordenador do Serviço de Gastroenterologia e
Hepatologista do Hospital Português da Bahia, Paulo Bittencourt,
explica que a falta de diagnóstico preciso ou tardio, semelhante ao relatado
por Larissa, infelizmente, é muito comum, principalmente em adolescentes e
adultos jovens. “A PFIC3 é mais frequente nos primeiros meses de vida e na
infância, mas pode se manifestar tardiamente em jovens e adultos. Os sintomas
são inespecíficos e acabam sendo relacionados a outras doenças, como alergia,
por exemplo. Por isso, precisamos informar as pessoas e os profissionais de
saúde sobre PFIC3 e outras doenças do fígado que se manifestam por coceira ou
prurido para que haja conscientização da doença, diagnóstico precoce e
tratamento adequado”, explica o especialista.
Ele
atenta ainda para o quão impactante são os efeitos da doença: “a pessoa afetada
sofre com prurido dia e noite, não consegue dormir, estudar ou trabalhar. Sua
pele é repleta de escoriações por não parar de se coçar. Essa condição leva
muitas pessoas a tentar realizar um transplante de fígado mesmo antes de
apresentar cirrose, apenas para se livrar deste sofrimento e do estigma social
que ele provoca.”
A PFIC3 ocorre por conta de uma alteração da composição da bile decorrente de mutação genética que altera a função da proteína MDR3, que altera a função da MDR3, importante para manter a fluidez do suco biliar. Como resultado, ocorre inflamação dos canais biliares (colangite), levando à dificuldade de passagem da bile até o intestino (colestase). Alguns dos sintomas são: coceira, icterícia, cansaço fácil ou sinais de falência do fígado como sangramento digestivo por varizes esofágicas e barriga d’água (ascite).1,2 “Atualmente, já existe tratamento que muda ou posterga a necessidade de cirurgia e procedimentos invasivos, como transplante de fígado. A identificação precoce e o cuidado adequado podem garantir qualidade de vida. E isso pode transformar a vida de quem tem PFIC3”, finaliza o especialista.
Referências
[1] Gonzales E, Spraul AD, Baussan C, Buffet C et al. Liver diseases related to MDR3 (ABCB4) gene deficiency. Front Biosci. 2009; 14:4242-56.
[2] Jacquemin E. Role of multidrug resistance 3 deficiency in pediatric and adult liver disease: one gene for three diseases. Semin Liv Dis. 2001; 21:551-62.
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