Detecção permitiria conhecer fases do Universo primordial que não são acessíveis à investigação por meio de ondas eletromagnéticas. E eventualmente abriria caminho para uma nova física. (ilustração: ondas gravitacionais propagando-se no espaço-tempo/ Nasa/JPL)
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Ondas eletromagnéticas e ondas
gravitacionais são os dois únicos meios de que a humanidade dispõe para o
estudo do Universo em larga escala. Mas, durante milênios, apenas o primeiro
pôde ser utilizado: das observações astronômicas a olho nu realizadas pelos
povos antigos, baseadas na recepção da luz visível, aos supertelescópios
atuais, operando em várias faixas do espectro eletromagnético: de rádio a raio
gama. Efeitos gravitacionais foram inferidos pelo movimento relativo dos
astros.
Porém a primeira medição direta de
ondas gravitacionais ocorreu apenas em 2015, por meio das colaborações LIGO e VIRGO. Como enfatizou a mídia na
época, o feito abriu uma janela totalmente nova para a investigação do Universo
(Para mais informações acesse https://agencia.fapesp.br/22670/).
Até o momento, essa janela foi
explorada com sucesso, com detecções afirmadas, apenas em uma faixa
relativamente estreita de frequências, variando de 10 hertz (10 Hz) a 10
quilohertz (104 Hz).
Os desafios e as oportunidades da
pesquisa de ondas gravitacionais em frequências muito mais altas, de megahertz
(106 Hz) a gigahertz (109 Hz), foram tema de um evento presencial
realizado em Trieste, Itália, em 2019, antes da pandemia. As reflexões intercambiadas
nesse workshop bem como a revisão de toda a literatura sobre o tema foram agora
sistematizadas e publicadas no artigo “Challenges and opportunities of
gravitational-wave searches at MHz to GHz frequencies”,
que contou com a participação de Odylio Denys de Aguiar,
pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
A iniciativa recebeu apoio da FAPESP
por meio de Auxílio Regular à Pesquisa e
de Projeto Temático que
teve Aguiar como pesquisador responsável.
“Para
emitir na faixa considerada, é preciso que matéria muito compacta oscile em
frequências extremamente altas. Seria o caso, por exemplo, de miniburacos
negros, com diâmetros menores do que um quilômetro, e massas inferiores à massa
do Sol ou até mesmo à massa da Terra”, diz Aguiar.
Como
ressalta o artigo agora publicado, “não existem objetos astrofísicos conhecidos
que sejam pequenos e densos o suficiente para emitir em frequências além de 10
quilohertz. Qualquer descoberta de ondas gravitacionais em frequências mais
altas indicaria, portanto, uma nova física além do Modelo Padrão, ligada, por
exemplo, a objetos astrofísicos exóticos ou a eventos cosmológicos no Universo
primitivo”.
Entre os
objetos astrofísicos exóticos, o artigo menciona buracos negros primordiais e
estrelas de bósons. E, na categoria de eventos cosmológicos no Universo
primitivo, inclui transições de fase, flutuações térmicas e cordas cósmicas,
entre outros. São formulações teóricas que eventuais detecções permitirão
confirmar, corrigir ou descartar.
A
astronomia e a cosmologia tiveram notável avanço quando as observações feitas a
partir de ondas eletromagnéticas transcenderam a faixa da luz visível para
acessar outras bandas de frequência. Analogamente, a detecção de ondas
gravitacionais de frequências superiores a 10 quilohertz escancararia a nova
janela aberta para o Universo.
“Em
particular, essa detecção permitiria obter informações sobre o período
compreendido entre o Big Bang e a emissão da radiação cósmica de fundo, hoje
captada na forma de micro-ondas. Nesse período, que se prolongou por quase 400
mil anos, a radiação eletromagnética estava tão fortemente acoplada à matéria
que não podia se propagar livremente. Mas as ondas gravitacionais podiam viajar
sem perturbações e formariam hoje um fundo que poderia eventualmente ser
detectado”, afirma Aguiar.
A grande dificuldade para essa
detecção, segundo o pesquisador, é de natureza tecnológica. “Quanto maior a
frequência da onda, menor sua amplitude. Isto porque, assim como o espectro
eletromagnético, o espectro de ondas gravitacionais também segue, grosso modo,
uma lei de potência em função da frequência com expoente negativo. Em outras
palavras: a natureza é mais generosa em baixas frequências, como fica evidente
nos gráficos do website, que mostra as amplitudes
esperadas de fontes astrofísicas e cosmológicas no Universo e a sensibilidade
dos principais projetos para detecção de ondas gravitacionais com frequências
abaixo de 10 kHz”, explica.
Nenhuma
das várias propostas compiladas no artigo atinge atualmente a sensibilidade
necessária. Na melhor das hipóteses, elas alcançam patamares de sensibilidade
seis ordens de magnitude menores. Mas o artigo lembra que, menos de 50 anos
atrás, Kip Thorne, que foi um dos grandes precursores do estudo de ondas
gravitacionais, havia dito, juntamente com seu orientador John Archibald
Wheeler e seu colega Charles Misner, que interferômetros a laser tinham
sensibilidade tão baixa que eram de pouco interesse experimental. Em 2017,
Thorne ganhou o Prêmio Nobel depois da primeira detecção de ondas
gravitacionais realizada em 2015 pelo interferômetro a laser LIGO.
Segundo
Aguiar, a solução tecnológica para a detecção de ondas gravitacionais de alta
frequência não virá necessariamente de projetos bilionários. Mas de soluções
altamente inovadoras, algumas jamais pensadas.
O artigo “Challenges and
opportunities of gravitational-wave searches at MHz to GHz frequencies” pode
ser lido em https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs41114-021-00032-5#article-info.
José Tadeu
Arantes
Agência
FAPESP
https://agencia.fapesp.br/estudo-apresenta-os-desafios-e-as-oportunidades-para-pesquisa-de-ondas-gravitacionais-de-alta-frequencia/37670/
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