O ano de 1602 foi um divisor de águas. Foi quando se lançou a Companhia Holandesa das Índias Orientais com a emissão de ações facilmente transferíveis para financiar suas várias aventuras pelo planeta.
Agora, o mundo está vivendo uma novidade similar: os ativos digitais.
Independentemente das discussões sobre se o valor de um token é justo, essa
nova classe de ativos é uma classe de ativos. É totalmente diferente dos que
existem e guardadas as devidas proporções, sua adoção pelo setor financeiro
convencional é tão inevitável quanto as ações corporativas do século 17.
Gestores financeiros com visão de futuro estão se perguntando: “quais opções
tenho para oferecer se meu cliente quiser exposição a criptoativos?”.
Atualmente, o mercado tem várias opções por meio de diferentes caminhos.
O primeiro e mais óbvio é a compra direta de criptomoedas. A maioria dos grandes
gestores de fortunas ainda não começou a oferecer esse serviço para seus
clientes por meio de carteiras de ativos digitais das próprias instituições.
Mas, muitos estão explorando essa possibilidade. Tirando algumas empresas
menores de nicho, a maioria dos gestores ainda estão construindo, em seus
planos financeiros, posições de criptos mantidas externamente1.
Dessa forma, mesmo perdendo participação no mercado de carteiras para outras
empresas de cripto, os gestores de fortunas podem gerar um valor expressivo
fornecendo informações cuidadosas e completas sobre fornecedores, além de
consultoria sobre os ativos.
O próximo passo é o investimento em fundos de ativos digitais. Enquanto as
muitas instituições evitam a propriedade direta de criptomoedas, oferecem
fundos de criptomoedas a certos tipos de investidores. O Morgan Stanley2, o Goldman Sachs3
e o JP Morgan4 anunciaram a
oferta desses fundos. Todos têm gerenciamento ativo e podem não ser um
substituto para os clientes que buscam exposição beta em cripto, mas para
clientes que estão menos confortáveis com a perspectiva de gerenciar uma
carteira. Esses fundos têm o conforto já conhecido de subscrição institucional.
Para os clientes e gestores de fortuna interessados em seguir certas
estratégias de negociação, a Bolsa de Mercadorias de Chicago (o grupo CME)
listou contratos futuros nas duas maiores criptomoedas: para bitcoin e ether –
essa última a criptomoeda nativa da rede blockchain Ethereum. Estratégias de
contratos futuros podem ser complexas e arriscadas, mas para clientes de
altíssimo patrimônio com discernimento e gestores bem-informados, esses
produtos podem abrir um mundo de alavancagem e flexibilidade.
Alguns clientes podem hesitar por conta da complexidade de cada uma dessas
estratégias. Outros podem ter os requisitos para investir em certos fundos ou
contratos futuros. Por sorte, à medida que cresce a aceitação de ativos
digitais em geral e as criptomoedas, em particular, ganham mercado, há
atualmente três produtos familiares disponíveis no mercado – independentemente
da qualificação ou sofisticação.
O mais perene desses produtos para o investidor é ação de empresas do
ecossistema de ativos digitais. Empresas desse grupo vão daquelas totalmente
com foco em cripto, como a Coinbase, maior bolsa de moedas digitais dos Estados
Unidos (EUA), a empresas com exposição ao ecossistema, como a Nvidia.
Outro produto familiar que os gestores podem oferecer a seus clientes são os
fundos de índice (ETF) de ativos digitais. Esses existem e têm uma sobreposição
significativa. Alguns gestores de ETFs disfarçam exposições tradicionais em
tecnologia sob o marketing de criptomoedas. Os gestores podem se certificar do
valor deles com uma avaliação das empresas que compõem o fundo para avaliar se
há uma oportunidade.
E por fim, o produto que os investidores e gestores de fortunas estão
explorando no horizonte: o ETF de bitcoin5.
Há dois desses ETFs na bolsa brasileira, a B3. Da forma como estão surgindo, há
dois tipos. Um deles é um fundo que detém o ativo, como o ETF GLD da Bolsa de
Nova York (NYSE), que tem lastro em ouro físico guardado num cofre, ou como o
ETF USO, que tem como referência contratos futuros de petróleo com datas de
vencimento próximas. A Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) já aprovou
um ETF de contratos futuros de bitcoin e há vários outros pedidos pendentes. Os
gestores podem mostrar valor, mais uma vez, explicando as peculiaridades
estruturais de cada um, como seus perfis únicos de risco se encaixam em
portfólios únicos e como a exposição por meio de um ETF é diferente de ter uma
criptomoeda.
Enquanto várias empresas pediram à SEC a aprovação de ETFs que mantém bitcoin,
por enquanto os reguladores não autorizaram ou ainda não deram respostas a
esses pedidos. Os receios da SEC sobre os mecanismos desses produtos incluindo
(mas certamente não se limitado a) valuation, liquidez/resgate, volatilidade, custódia
e potencial manipulação, não devem ser interpretados como dúvidas de demandas
comerciais e de varejo. O interesse dos investidores e assessores por exposição
a criptomoeda, combinado à popularidade dos ETFs e à demanda perene por
investimentos beta baratos, proverão um vento favorável para os fluxos dos
fundos, se vierem a mercado.
Os gestores de riqueza que são confrontados com demandas por cripto de clientes
se encontram no início de uma trilha. Em campo estão as opções “gêmeas” de
engajamento e recomendação. Exatamente como acontece com qualquer ativo
emergente, da primeira e simples ação holandesa a produtos estruturados
elaborados, os ativos digitais são uma oportunidade única para os gestores de
fortunas capazes de prover conselho previdente. E conhecer os produtos é o
primeiro e certeiro passo.
Simon Zais e Daniel Kerney - consultores da
Capco.
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