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Popularmente conhecida como deadlock ou a angústia
do Dia da Marmota
Este
artigo reproduz um diagnóstico de um médico. Munido de várias informações o médico
emite o parecer sobre a doença do paciente. Meu paciente é um continente de 8,5
milhões de quilômetros quadrados; 210 milhões de habitantes; com larga
miscigenação biológica e dissimulada segregação racial e social; com uma burocrasília
alienada das necessidades nacionais. Paciente amigo e fraterno no convívio
diário, indisciplinado e procrastinador das exigências republicanas e cidadãs.
O
prontuário do paciente mostra muitas escolhas históricas e seus encadeamentos
nefastos, muitas trocas e intercâmbios excludentes das elites, inúmeras
sutilezas culturais e comportamentais pouco producentes. Com esse quadro, o
paciente foi acometido de um profundo deadlock, e da comorbidade do Dia da
Marmota, doença conhecida como Brasilíase.
A
palavra deadlock, entendida em pedaços, chega a ser autoexplicativa: dead –
morto, lock - trava, fechadura. Indica o momento em que um processo, para
continuar a funcionar, precisa de outro processo para avançar, mas este, por
sua vez, depende do anterior. Inércia histórica.
No
Dia da Marmota, no filme Feitiço
do Tempo, a repetição é eterna. Muitas marielles assassinadas,
sergios moros virando suco, balas perdidas, número de assassinatos de país em
guerra, anões do orçamento/mensalões/lavas jatos, sergios cabrais, prefeitos
falando “não roubei tanto quanto o outro aí”.
Os
sintomas são claros: as instituições se agridem e fazem debates vazios; os
sofrimentos se repetem, a revolta é permanente; ódios, gritos e agressões no
trânsito, na Internet, nas relações pessoais.
Todos
estão exaustos de viver no eterno Dia da Marmota. O paciente não aguenta mais.
Essa angústia é clara. O paciente está aturdido, tonto, sem rumo. Só ouve
quando alguém grita frases bombásticas sem sentido. A racionalidade do paciente
está dopada.
Mas o
paciente fará uma tomografia logo. Haverá eleição municipal. Após essa
tomografia saberemos se o paciente quer um tratamento sério ou se quer placebo
sem nenhum esforço. Saberemos se ele escolherá novas lideranças que tenham
bagagem técnica, ética e política para gerir o tratamento.
O
candidato que deixar claro que o tratamento será longo e exigirá muito esforço
de todos será eleito? Ou os clássicos enroladores serão eleitos? O paciente
escolherá competência e comprometimento e muito esforço próprio ou propostas mágicas
e falsas? Ele realmente quer se curar da Brasilíase ou escolherá mais alguns
anos de candidatos falastrões, prometedores de nada? Bons de papo e com zero de
resultado.
Paciente
que quer se curar tem que participar ativamente do tratamento, que exigirá
muito esforço, tempo e sacrifícios para sair da letargia. Os remédios não serão
doces e saborosos. Nosso deadlock histórico está preso à nossa procrastinação
em assumir os próprios erros e fraquezas. Brasilíase tem cura? Precisamos
esperar a tomografia.
Luiz Jurandir Simões de Araújo - professor de Atuária na FEA/USP e na
Unifesp; e Diretor Administrativo FapUnifesp (Fundação de Apoio à Unifesp)
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