O custo fiscal sempre é objeto de discussão,
críticas e polêmicas, especialmente em momentos de crises econômica e fiscal,
seja pela demanda por mais recursos públicos em face das demandas orçamentárias
sempre crescentes, seja pela complexidade do sistema tributário no qual operam
indústrias, empresas comerciais e prestadores de serviços (na maior parte das vezes,
sufocados pela burocracia estatal e pelas crescentes despesas com impostos,
taxas e contribuições em geral).
Nesse sentido, os diferentes governos sempre se
utilizam da concessão de benefícios fiscais pontuais com o escopo de criar
alguma folga para determinadas categorias de empresas ou mesmo para estimular o
desenvolvimento econômico de determinadas regiões ou de alguns negócios.
Particularmente no Brasil contemporâneo, tais concessões têm sido comuns e vão
se repetindo e se acumulando em diferentes momentos, sob as mais diferentes
formas e modulagens jurídicas, desde a concessão de isenções, passando pela
simples redução de alíquotas de impostos, até modalidades mais sofisticadas,
como os chamados créditos presumidos, utilizados para reduzir o montante a
ser pago a título de algum tributo, ou mesmo algumas formas de diferimentos de
impostos (o que significa a incidência dos mesmos em razão da prática de algum
fato com relevância econômica sem o imediato pagamento, o qual ocorrerá em
prazo mais dilatado à frente como forma de financiar a atividade praticada pela
empresa).
Há também modelagens jurídicas que não se enquadram
como benefícios fiscais propriamente ditos (segundo os teóricos do direito
tributário), mas que se constituem na maior parte das vezes como similares
integrantes do arcabouço estruturado – ou não-estruturado – pelo Estado, com
vistas a facilitar a atuação de agentes econômicos. Um bom exemplo
são as moratórias com ampliação do prazo de pagamento de débitos tributários em
atraso, posto que não recolhidos no momento definido na legislação – e aqui
está a diferença em relação ao diferimento, verdadeira modalidade de
benefício fiscal, posto que havia a obrigação prévia de pagamento, o que
somente não ocorreu em razão de omissão indevida e ilegal do contribuinte –,
muitos dos quais inclusive já objeto de autuação fiscal. Tal situação ganhou a
denominação genérica de Refis e vem sendo utilizada de modo
abusivo pelos Fiscos Federal, Estadual e Municipal.
Os problemas que se apresentam a partir desse
panorama são de duas ordens, a saber: a primeira é
que não há uma estruturação racional dos diferentes programas de benefícios
fiscais que defina critérios próprios e conjunturais para o seu gozo por parte
dos contribuintes, de modo a que determinadas metas pudessem ser alcançadas,
tais como aumentos percentuais de produção e produtividade, aumentos definidos
ou ao menos definíveis de empregos, ampliação de parques produtivos e tempo de
seu funcionamento, mensuração do total de receita abdicado pelo Estado à luz do
volume de recursos agregado ao produto interno bruto decorrente da(s) medida(s)
concessivas, etc. A segunda é relacionada à
desestruturação do sistema tributário federal, estadual ou municipal como um
todo, pois à medida em que vão se multiplicando os benefícios fiscais sob as
mais diferentes modalidades, a já existente complexidade do Sistema Tributário
Brasileiro aumenta ainda mais com a multiplicação de normas casuais e quase individualizadas
para cada situação, região ou contribuinte, cujo resultado é o aumento do caos
fiscal e tributário para os diferentes agentes econômicos envolvidos. É como se
os contribuintes beneficiados com a concessão dos diferentes incentivos fiscais
se tornassem vítimas da própria concessão a eles atribuída, de modo tal que o
conjunto dos benefícios fiscais se transforma não em solução, mas sim em parte
do problema inerente ao Sistema Tributário Brasileiro.
Uma metáfora pode ajudar a explicar a situação. À
medida em que o sistema é posto à prova e vão sendo constatados gargalos
decorrentes do alto custo fiscal para manter ou ampliar um negócio, vão sendo
criados atalhos que subvertem a lógica anterior, distorcem o funcionamento e
atuação de empresas, geram discussões longas (inclusive de natureza judicial)
sobre o direito de outros contribuintes a deles utilizarem-se - e aquilo que
deveria ser a solução ou um instrumento de ajuda, transforma-se em fonte de
mais complexidade e dificuldade de operação para todos os atores envolvidos:
agentes econômicos beneficiados, Fisco e operadores fiscais - aí incluídos
contadores, advogados, juízes, etc.
Isso considerado, uma eventual reforma tributária a
ser pensada, estruturada e discutida no Congresso Nacional deve atentar para a
premência de sistematização, tanto da concessão, quanto da imputação de
requisitos para o aproveitamento dos diferentes benefícios fiscais, sem perder
de vista o impacto econômico no país como um todo.
Flávio de Azambuja Berti - doutor em Direito Público e procurador-geral
do Ministério Público de Contas do Paraná. É professor titular de Direito
Tributário da Universidade Positivo e coordenador da Pós-Graduação em Direito
Tributário da Universidade Positivo.
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