Segundo dados do Governo Federal, o crime
concentra quase 80% das denúncias de violências realizadas pelo Disque 100
Segundo dados da Secretaria de Direitos
Humanos, o crime de negligência foi a principal forma de violência contra
crianças e adolescentes até o momento em 2015, concentrando 76,35% de todas as
denúncias realizadas pelo Disque 100, serviço de denúncias anônimas. No total
foram 42.114 ligações realizadas para denunciar crimes contra essa população
até junho de 2015. O montante é 14% menor do que os registros do mesmo período
em 2014, mas essa não é necessariamente uma notícia boa.
Segundo o assistente social Júlio Cezar de Andrade, diretor do Conselho
Regional de Serviço Social de São Paulo (CRESS-SP), uma redução nas denúncias
pode não ter relação com a diminuição da violência, mas com o agravamento de
uma cultura de silenciamento. Para ele, esse número pode ser muito maior, já
que nem todos os casos são efetivamente denunciados porque muitas vezes o autor
ou autora da violência faz parte da família da vítima.
“A
naturalização da violência e o silêncio que, por vezes, permeia as relações
familiares faz com que seja difícil que ocorra uma denúncia nos primeiros
episódios. Sempre há a esperança de que seja um caso isolado, que não vá se repetir.
Vários são os componentes que atuam no fenômeno da violência e todo o cenário
contribui para essa questão do silenciamento.”, explica Andrade.
Por causa disso, ressalta o diretor do
CRESS, é de extrema importância a criação de uma cultura de proteção que
envolva vários atores da sociedade: “É preciso que todos sejam sensibilizados
sobre sua obrigação em proteger as crianças e adolescentes, utilizando as
ferramentas de denúncia disponíveis, como o Disque 100 e não naturalizando a
violência cotidiana”, ressalta o assistente social.
Tipos de violência
O
último balanço divulgado pela Secretaria de Direitos Humanos mostra que as
denúncias de crimes contra crianças e adolescentes correspondem a 63% de todas
as denúncias realizados pelo Disque 100 em 2015. No que se refere aos tipos de
violência, os dados mostram que a negligência somou 76,35% das denúncias,
seguida de violência psicológica (47,76%), física (42,66%), sexual (25%) e
outras (8,47%). Ainda para o assistente social, esses números refletem a realidade
enfrentada pelos brasileiros.
“Vivemos historicamente em uma realidade
de desamparo, em que um Estado ausente mantém a população em aspectos mínimos
de condições de trabalho, saúde, educação, moradia e qualidade de vida. Nessas
condições, a situação de negligência é associada à falta de acessos a direitos
e, portanto, seu enfrentamento deve ser alvo de políticas públicas efetivas”,
reforça Andrade.
Rede de proteção
Constituído pela Lei 8.069/90, o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA) completou 25 anos de existência em julho desse ano. Ainda
assim, o assistente social explica que ele não é seguido como deveria.
“As normas são um passo, mas precisamos de mais centros
especializados em crianças e adolescentes e mais equipamentos públicos estatais
de fortalecimento de vínculos ,como centros profissionalizantes ou culturais,
entre outros, para o atendimento dessa parcela da população. É importante criar
uma rede entre Governo e sociedade, principalmente hoje, quando as contradições
entre capital e trabalho colocam crianças e adolescentes em situação de
violência física, doméstica e sexual, trabalho infantil e exploração sexual”,
finaliza o diretor do CRESS-SP.