Neste mês comemoramos o Dia da Liberdade de Pensamento em
boa parte do mundo e o início da derrubada do regime monárquico na França em
1789. No Brasil ainda percorremos o duro percurso da falta de percepção
histórica. Dias de significados importantes, em sua maioria, tem haver com
consumo ou religião. A inflação bate mais uma vez em nossa porta, concomitante
os atos de racismo e homofobia. As referidas cenas e atos mancham as
páginas da história em pleno século 21. Vergonhosamente essas atitudes tristes
e fora de época invadem os meios de comunicação e reafirmam a nossa cultura
empobrecida.
A violência doméstica contra mulheres e crianças assusta
qualquer pessoa que viva em país civilizado. O consumismo desvairado e irresponsável
nos trouxe em seu encalço a mudança comportamental, climática e ética. A beleza
dos pássaros, rios, mares e montanhas, perderam importância para os
“embebedados” por carros, espumantes, correntes de ouro e belos sapatos.
Paralelo a tudo isso, dois grandes grupos humanos sofrem consequências
drásticas do regime escravista: negros e indígenas. Regime este que vitimou
milhões de seres humanos.
Foram 370 anos de escravidão, estupros e maus tratos. A
perversidade deste regime anti-humano, defendido por muitos, até nos dias
atuais, construiu uma lacuna de desigualdades que esbanja pobres, favelados,
mendigos, analfabetos e desempregados em todo o território nacional. Entre os
quase 100 milhões de negros no Brasil, 68% transitam entre a pobreza e a
miséria. A lamentável conclusão deste dado perverso, do ponto de vista
econômico-social, é que quase não temos portas e nem janelas para as saídas
necessárias para se chegar a uma Nação livre e realmente de todos.
A Lei Áurea, acabando legalmente com a escravidão de negros
em nosso país, infelizmente, ainda nos enclausura em seus resquícios
escravistas. A abolição não foi conclusa e os escravocratas que só mudaram de
roupa e trocaram os cavalos por carros, reinam quase que absolutos em nosso
país; gastando muito dinheiro manchado de sangue negro e indígena. Os risos se
ouvem em todos os cantos, desde o início do século 16. Como também os choros e
os gritos de dor. O dia 13 de maio nos maltrata quando, enquanto negros,
olhamos para trás e vemos a perversidade e a forma bruta e desrespeitosa que
nossos ancestrais foram tratados neste país que tanto amamos, trabalhamos e
fizemos progredir. A nossa religião de matriz africana, única construída em
solo nacional, a Umbanda, virou objeto de perseguição, ataques e desrespeito
por religiões que se dizem de Deus.
Como aturar isso? Como não se contrapor a este
fundamentalismo perverso que não aceita a convivência harmônica com outras
ideias e práticas religiosas? O país é laico e as religiões representam as
várias e inúmeras faces do Brasil. Somos um país negro, mestiço, branco,
amarelo, multicultural e pluriétnico. Este formato histórico nos obriga a
respeitar as diferenças. Qualquer outra atitude é insana, não merecendo atenção
e respeito de outrem.
Marcos Canetta -
mestre e professor na Faculdade Anhanguera de São José, produtor cultural,
líder comunitário e militante do Movimento Negro Organizado de Santa Catarina