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domingo, 20 de setembro de 2020

Você acredita nisso?



Todos temos sonhos. Os mais diversos sonhos. Sonhos próximos, sonhos distantes, sonhos possíveis ou quase impossíveis. Quanto maior o nosso sonho, maior a tentação de acreditar em fadas madrinhas e varinhas de condão.

Quase todas (senão todas) as mulheres sonham em ser bonitas. Querem ser bonitas, pois um atributo que caminha junto com a condição feminina é o da beleza.

No reino animal, em geral, os machos são mais belos, para seduzirem a fêmea, enquanto elas são mais discretas de forma que não chamem a atenção dos predadores. O leão, com sua bela juba; os pássaros com sua riqueza de plumagem, o cavalo, o touro, o pavão, o carneiro, todos esses mais bonitos e elegantes do que a fêmea. Mas entre os seres humanos, a beleza da mulher é cantada em versos e prosas, é esperada, é, muitas vezes, exigida. Mitos são criados em torno da formosura feminina, tragédias são narradas tendo como foco o encanto e perfeição de formas da diva.

Assim, não é de se estranhar que as mulheres gastem tanto tempo e dinheiro se embelezando e que sonhem com uma carreira de modelo ou atriz. Ainda que não sonhem com isso, qual mulher não ficaria extremamente lisonjeada em ser convidada para posar para revistas ou propagandas?

É exatamente isso o que está acontecendo hoje em dia com tantas mulheres de todas as idades. Ana recebeu uma mensagem em seu Instagram de uma agência de modelos. A produtora lhe disse que ela era muito bonita e perguntou se ela já tinha trabalhado de modelo alguma vez na vida. Ora, Ana já estava beirando os sessenta anos, mas estava muito bem e sabia que já existia um mercado para mulheres de sua idade. Sentiu-se exuberante e não pensou duas vezes em passar seu telefone para que pudessem marcar uma visita na agência em breve.

Quando chegou o dia marcado, Ana arrumou seus cabelos, fez as unhas, vestiu roupas compradas no dia anterior e dirigiu-se confiante ao estabelecimento. Recebeu diversos elogios e disseram-lhe que já havia um trabalho para ela nos próximos dias. A mulher ficou encantada. Poderia isso estar realmente acontecendo? Poderia se tornar modelo com a idade que estava para essa profissão? Tão extasiada estava que mal ouviu quando lhe disseram que teria que assinar um contrato com a agência e pagar a modesta quantia de mil e quinhentos reais. Ana se surpreendeu. Não sabia que teria que pagar alguma coisa. Pensou que, pelo contrário, receberia pelo seu trabalho. Sim, respondeu a produtora. Ela seria paga pelos trabalhos, mas antes teria que assinar esse contrato. O valor seria gasto com um portfólio feito especialmente para ela, um Book que poderia depois usar onde e como quisesse. A produtora não queria pressioná-la, mas se Ana não assinasse o contrato logo, perderia a chance desse trabalho que seria em apenas alguns dias. E logo apareceriam vários outros e ela receberia seu dinheiro de volta em apenas algumas sessões de fotos. Ana assinou o contrato e pagou. Voltou para sua casa se sentindo uma jovem adolescente.

Os dias se passaram e a futura modelo não recebeu mais notícias da agência. Ligou diversas vezes, foi até aquele endereço, recebeu mais inúmeras promessas, inúmeros elogios e inúmeras desculpas. Ana nunca mais viu suas economias e nunca tirou uma foto.

Sim, por incrível que pareça, esse é o mais novo golpe para roubarem o seu dinheiro.

Há tantos golpes hoje em dia e ninguém pode dizer que dessa água não beberá.

Em hospitais, pessoas cruéis aproveitam a fragilidade e a vulnerabilidade dos enfermos e seus acompanhantes para pedirem dinheiro para os remédios, alegando que dessa forma, eles conseguirão tudo pela metade do preço.

Em sites de relacionamento, homens fazem declarações de amor e pedidos de casamento tão convincentes que a noiva nem hesita em pagar uma fortuna para receber os bens do amado em sua casa. Bens que nunca chegarão, assim como o noivo.

Sem falar nos inúmeros golpes de celular, pedidos de resgate para sequestros inexistentes e outros, antigos e recentes.

Se não fosse o risco de perder a vida, seria muito melhor ser assaltado nas ruas. Levariam seu dinheiro, celular, cartão de crédito, tudo que pode ser reposto ainda que com sacrifício. Mas quem irá nos devolver os sonhos, a paixão, a inocência? Quantas pessoas não ajudam mais ninguém por medo de estarem sendo enganadas? Quantas pessoas vivem com mais medo do que deveriam porque tudo pode ser uma grande mentira?

Mas assim é a vida. Mesmos os mais espertos correm o risco de serem enganados por outros ainda mais espertos do que eles. Podemos escolher viver no medo, sempre desconfiados, negando amor, ajuda, deixando nossos sonhos morrerem com a nossa humanidade; ou podemos continuar sonhando, acreditando, aprendendo com nossas perdas, caindo e levantando.

Ana perdeu seu dinheiro, sentiu-se estúpida. Tal qual Ícaro, voou muito perto do sol e suas asas derreteram. Que importa?

Algumas vezes seremos enganados, mas algumas vezes veremos nossos sonhos se realizarem, milagres acontecerem, a sorte nos sorrires. Ninguém sabe. 

 



Lucia Moyses - psicóloga, neuropsicóloga e escritora

www.luciamoyses.com.br

 

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