O universo da saúde no Brasil e no mundo passa por
transformações muito peculiares em tempos de pandemia. Com praticamente três
meses de isolamento social e ainda vivendo dias de incertezas e atualizações
constantes dos cuidados e protocolos para se evitar a contaminação pelo
Coronavírus, um outro inimigo vem se destacando entre a população: o medo
paralisante.
Um medo que hoje impede pacientes de doenças
crônicas, em tratamento contínuo antes da pandemia, de darem continuidade ao
acompanhamento médico de rotina. Diabetes, hipertensão, obesidades e
cardiopatias ganham destaque pela necessidade do controle adequado que, em
função do medo extremo do contágio, provocou a paralisação e modificação do dia
a dia de algumas pessoas.
Relatos dos especialistas demonstram que esse
cenário é muito sério, pois sinais de agravamento de certas doenças estão sendo
negligenciados. Um exemplo são os casos dos Acidentes Vasculares Cerebrais
(AVC) que são considerados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como a
segunda maior causa de mortes no mundo. Uma doença extremamente grave, que exige
que a busca pelo diagnóstico e tratamento seja feita com a maior brevidade,
pois cerca de 1,9 milhões de neurônios podem morrer por minuto em caso de um
ataque. E se o socorro não vier a tempo, seguindo os protocolos médicos
específicos, o paciente pode vir a apresentar sequelas e demências
irreversíveis.
Porém, por medo de buscar um estabelecimento de
saúde e correr o risco de se contaminar com o Covid-19, os sintomas estão sendo
ignorados e muitas pessoas chegam a morte por não serem socorridas a tempo. Situação
parecida também vem ocorrendo com os casos de pacientes diagnosticados com
dengue ou com diversos tipos de cardiopatas.
Essa fobia, caracterizada por pensamentos negativos
e uma sensação de terror à exposição extrema ao vírus, faz com que o paciente
alimente uma tendência a se esquivar do que é temido - omitindo muitas vezes
dos familiares e amigos dores, sensações e sintomas graves, e comprometendo de
forma profunda sua saúde. Um medo incômodo que possui bases psicológicas e
fisiológicas, afetando o equilíbrio mental e a sobrevivência do paciente.
Aprender a administrar e controlar esse medo,
tomando os cuidados necessários e seguindo as orientações de prevenção de
contágio do Coronavírus, é um grande desafio para a atualidade. O que não se
pode permitir é que a resposta adaptativa mental necessária, que deve ser
benéfica, aliada à continuidade dos tratamentos de saúde do indivíduo, produza
uma tempestade química de mudanças psíquicas e fisiológicas no organismo - a
ponto de bloquear a capacidade mental do entendimento de que é necessário
continuar a viver. O estresse paralisante deve ser eliminado para não alimentar
o pânico e não transformar o ser em um refém de seus próprios anseios.
É muito importante não interromper os tratamentos
continuados e também não deixar de sinalizar ou buscar ajuda de um médico
quando perceber que algo está errado. É compreensível o sumiço dos hospitais e
dos consultórios, mas as doenças são tão perigosas quanto o Covid-19. É claro e
evidente que os cuidados para não se contaminar devem ser tomados e
intensificados, pois a restrição de circulação permanece. Mas interromper um
tratamento ou retardar um auxílio no aparecimento de um sintoma grave pode ser
fatal. Entenda que emergências não podem ser ignoradas.
Enfim, psicologicamente falando, os problemas de
saúde com risco de vida não podem ser potencializados pelo medo e pelo pânico.
A busca por atendimento médico, em caso de necessidade, passa por uma questão
de amor próprio e responsabilidade consigo mesmo - e não devem sofrer qualquer
impedimento do cuidado, pois, em alguns casos, cada minuto é precioso para o
sucesso do tratamento.
A necessidade da atenção médica regular não
foi abolida pelo vírus. O que precisa ser abolido, ou pelo menos controlado, é
o medo e a angústia que nos impede de seguir a vida. A adaptação a novos
modelos de organização diária foi necessária para que possamos mitigar a curva
de contágio. No entanto, devemos aprender a olhar para todas essas modificações
com um senso de respeito a nós e ao próximo, valorizando ainda mais nossa
vida e promovendo a saúde mental e o equilíbrio físico adequado ao nosso
bem-estar.
Dra. Andréa Ladislau - Doutora em Psicanálise. Palestrante.
Colunista. Academia Fluminense de Letras. Gestora em saúde. Repres. Intern. (USA) da
University Miesperanza
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